Sumário: Introdução – 1. O uso de ativos na transação tributária – 2. O prejuízo fiscal e seu enquadramento jurídico e contábil – Conclusão.
Introdução – Vivemos no ano de 2020, inegavelmente, tempos desafiadores em virtude dos reflexos passados, presentes e futuros da pandemia da Covid-19, que vem abalando o mundo e ceifando um assustador número de vidas. O abalo gerado pela extinção do bem mais valioso (a vida) é somado aos efeitos econômicos decorrentes da paralisação e/ou redução das atividades econômicas de um modo geral. Dúvidas e inquietações surgem no horizonte, iremos retomar a vida e os negócios de onde paramos? A necessidade de arrecadação será maior ou menor do que antes? Por outro lado, a capacidade de pagamento de tributos será a mesma? Como gerir a relação entre fisco e contribuinte? Selecionamos a última pergunta como ponto de partida para nossas considerações. A altíssima litigiosidade dessa relação (fisco x contribuinte) no Brasil constitui um ponto fora da curva quando comparado a outros países. Por exemplo, o estoque de créditos tributários inscritos na Dívida Ativa, em litígio no contencioso administrativo tributário e no Poder Judiciário é estimado em aproximadamente 4 trilhões de reais. Essa litigiosidade acaba transferindo para os Tribunais Superiores o papel de definir os rumos das atividades econômicas e da arrecadação fazendária, por meio da resolução dos inúmeros casos repetitivos pendentes de julgamento. Por outro lado, em que pese a necessidade de reformulação institucional e normativa, é possível, do ponto de vista imediato, trabalhar com os instrumentos existentes. Um exemplo positivo pode ser extraído da medida adotada pela Procuradoria da Fazenda Nacional para reformular o microssistema de cobrança do crédito tributário, mediante instrumentos que permitam o permanente controle de legalidade dos créditos inscritos na dívida ativa (exemplo: PRDI – Pedido de Revisão da Dívida Inscrita) e, consequentemente, a cobrança judicial de créditos indevidos. Destacamos, igualmente, a Lei n° 13.988/2020 (conversão da Medida Provisória n° 899/2019), que regulamentou a transação tributária no âmbito da União prevista no art. 171 do CTN. Trata-se de uma ferramenta institucional com potencial de resolver diversos conflitos tributários e, ao mesmo tempo, garantir um importante incremento de arrecadação, sobretudo após o abalo gerado pela pandemia para a Fazenda e solução mais rápida e menos onerosa para os contribuintes. O sucesso do instrumento legislativo, contudo, exige uma mudança de paradigmas. Neste sentido, não podemos entender a transação como mais um parcelamento delegado criado por atos infralegais (“novo Refis”). A mudança exigirá uma postura proativa tanto do contribuinte quanto da administração tributária como um todo, inclusive os órgãos encarregados pela cobrança. É justamente em tal contexto que iremos analisar a viabilidade jurídica de quitação de passivos fiscais, por meio de instrumento de transação tributária, mediante a utilização do prejuízo fiscal.
Mary Elbe Queiroz é Pós-Doutora pela Universidade de Lisboa. Doutora em Direito Tributário (PUC/SP). Mestre em Direito Público (UFPE).
Antonio Carlos F. de Souza Júnior é Doutor em Direito Tributário (USP). Mestre em Direito (UNICAP). Pós-graduação em Direito Tributário pelo IBET/SP.