Uma decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) considerou que o apresentador Carlos Massa, o Ratinho, não agiu irregularmente ao constituir uma empresa para explorar sua imagem. O caso supera R$ 58 milhões.
Ele era acusado de ter criado a Massa & Massa Ltda., sem vínculo empregatício com o empresário e sócio, para pagar menos tributos. A empresa explorava o direito de imagem do apresentador com terceiros em comerciais, patrocínios e merchandising. Para o fisco, os pagamentos efetuados pela empresa ao empresário deveriam ser tributados pela pessoa física. Caso contrário, estaria configurada uma omissão de rendimentos recebidos.
Para a Receita, a irregularidade existe porque há diferença entre as alíquotas do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Empresas no regime de lucro presumido, que faturam abaixo de R$ 78 milhões, devem recolher na faixa de 18% a 20% de IRPJ e CSLL. No caso da pessoa física, a alíquota máxima é de 27,5%.
Em seu voto, a relatora, desembargadora Mônica Nobre, da 4ª Turma do TRF3, aplicou o artigo 129 da Lei nº 11.196/2005, que define que “para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão-somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas”.
Procurada pelo JOTA, a advogada do caso, Mary Elbe Queiroz, do Queiroz Advogados Associados, disse que esta “foi a primeira decisão do tribunal que analisou o mérito. Agora, está muito claro que as pessoas físicas de artistas, jornalistas e atletas podem constituir pessoas jurídicas para desenvolverem as suas atividades”. Ela afirma ainda que pessoas jurídicas recolhem tributos que pessoas físicas não recolhem, como por exemplo o Imposto Sobre Serviços (ISS).
Ratinho perdeu em 1ª instância, após a 11ª Vara de Execuções Fiscais Federal de São Paulo entender que os rendimentos deveriam ser tributados pela pessoa física. O apresentador recorreu ao TRF alegando que o Supremo Tribunal Federal (STF) havia definido no julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) 66 que o artigo 129 da Lei nº 11.196/2005 é constitucional, permitindo que pessoas físicas atuem profissionalmente via pessoa jurídica, mesmo para atividade artística, cultural e personalíssima, como é o caso em questão.
A relatora no TRF3 acolheu o argumento, por entender que o dispositivo tem caráter interpretativo, podendo ser aplicado em casos retroativos, de acordo com o artigo 106, inciso 1º, do Código Tributário Nacional (CTN).
Entendimento do Carf
Em 2006, o caso envolvendo Ratinho foi julgado pela Quarta Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, antigo Carf, que entendeu que o apresentador presta seus serviços de forma pessoal. Assim, seus rendimentos devem ser tributados na pessoa física. Trata-se do processo nº 980.008215/2004-78.
O conselho já analisou outros casos sobre o tema. Em 2016, o tenista Gustavo Kuerten perdeu processo que discutia a mesma matéria. A decisão foi da 2ª Turma da Câmara Superior, que entendeu que a exploração da imagem de um atleta não pode ser feita por uma empresa. O caso foi decidido pelo voto de qualidade, aplicado quando há empate no julgamento, e o voto do presidente da turma – que representa o Fisco – é utilizado para resolver a questão. Desde abril de 2020, na maioria dos casos em que há empate, o processo é decidido de forma favorável aos contribuintes.
“É difícil afirmar que existe uma posição definida e pacificada no Carf, seja pelos diferentes períodos colhidos nas autuações ou, principalmente, pelas peculiaridades de cada caso em relação aos contratos e as estruturas das pessoas jurídicas. Mas é seguro concluir que com a observância do artigo 87-A da Lei Pelé [Lei 9.615/98], tratada nos julgados mais recentes, a tendência é de vitória para a pretensão dos contribuintes”, afirma Caio Cesar Nader Quintella, ex-conselheiro da Câmara Superior de Recursos Fiscais.
O dispositivo diz que “o direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo”.
Em 2017, por exemplo, o Carf julgou um caso em que o jogador de futebol Neymar foi acusado de ter criado empresas que exploravam o direito de imagem do atleta para pagar menos tributos. A 2ª Turma da 4ª Câmara da 2ª Seção do conselho considerou que a exploração de direito de imagem por empresas é regular.
Fonte: JOTA/MARIANA RIBAS