Decisão judicial permite suspensão por 180 dias, a contar de março.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) permitiu ao governo estadual suspender os pagamentos de precatórios por 180 dias — contados desde março, quando as contas públicas começaram a ser afetadas pela crise do coronavírus. A medida atende parte do pedido feito pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE), que buscava a suspensão por todo o ano de 2020.
A decisão foi proferida pelo desembargador Wanderley Federighi, coordenador da Diretoria de Execução de Precatórios (Depre), o órgão que organiza a fila e emite as ordens de pagamento dos títulos. O magistrado afirma que não se conhecem ainda os efeitos da crise, “sequer a curto prazo”, e que modificações no plano de pagamento dos precatórios serão viáveis “conforme se sucederem os fatos daqui em diante”.
“A ninguém interessa atitudes alheias às circunstâncias que se apresentaram, mas prudência é necessária para que, conforme a situação se desenvolve, seja possível tomar as mais efetivas decisões, preservando da melhor maneira as finanças públicas e dos credores”, diz o desembargador na decisão.
O magistrado determinou ainda que o Estado mantenha os repasses sob a alíquota de 1,5% da receita líquida mensal quando os pagamentos forem retomados. A previsão para este ano, segundo consta no plano de pagamento original, é a de liberar entre R$ 2,5 e R$ 4 bilhões aos precatórios.
Esses valores, no entanto, não são integralmente retirados do caixa. O governo pode usar valores de depósitos judiciais para realizar os pagamentos. Em 2019, por exemplo, o Estado de São Paulo pagou R$ 3,6 bilhões em precatórios — apenas R$ 800 milhões com recursos próprios.
A decisão do desembargador Wanderley Federighi é do dia 7. No dia seguinte, a PGE e a Secretaria de Fazenda e Planejamento do Estado enviaram, em conjunto, um ofício ao TJ-SP afirmando que “o quadro econômico é dramático”.
Não há notícia de uma nova decisão. Consta no ofício que as projeções da Assessoria de Política Tributária e Econômica indicaram, inicialmente, uma queda de R$ 9,8 bilhões na arrecadação de ICMS, principal fonte de receitas do Estado. Com “a alta velocidade dos efeitos desta crise”, no entanto, “projeções mais recentes apontam cenários piores”. A perda de ICMS passou a ser estimada, então, em R$ 11,9 bilhões.
Existem no país dois regimes de pagamento de precatórios. Um deles é o ordinário, que serve aos entes da federação que não têm dívidas de precatórios em atraso. As requisições de pagamento recebidas até 30 de junho são incluídas no orçamento do ano seguinte e pagas no curso do exercício.
O outro é chamado de especial e está voltado aos que têm dívidas de precatórios de anos anteriores. O Estado de São Paulo está inserido nesta modalidade. Esse regime é regido pela Emenda Constitucional nº 99, de 2017, e permite o parcelamento das dívidas até 31 de dezembro de 2024. Nesta data, todos deverão estar com os pagamentos em dia e migrar para o regime ordinário.
Medidas de suspensão dos pagamentos dos títulos são criticadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A entidade tem atuado em gabinetes de deputados e senadores para tentar barrar projetos que tratem sobre esse tema. Um dos argumentos é de que os Estados utilizam muito pouco dos seus caixas. A maior parte da dívida, segundo advogados, vem sendo paga com os valores dos depósitos judiciais.
O advogado Marco Antonio Innocenti, membro da Comissão Especial de Precatórios do Conselho Federal da OAB, diz que há decisões do TJ-SP também a favor de municípios — Santo André, São Bernardo, São Caetano e Cotia. O seu posicionamento, no entanto, é de que o tribunal não é competente e que os pagamentos são regidos pela Constituição Federal. Ele cita decisão do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), neste sentido.
Em nota, a PGE afirma que a suspensão dos repasses destinados ao pagamento de precatórios é medida peculiar devido à queda da receita e pandemia da covid-19. E acrescenta: “Isso não significa paralisação dos pagamentos, pois o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ainda dispõe de mais de R$ 2 bilhões de recursos que, transferidos àquela Corte, foram provisoriamente redestinados para o pagamento da ordem cronológica, com prioridade a idosos, doentes e deficientes”.
Fonte: Valor Econômico – 27 de abril de 2020.