Processo Digital nº: 1019723-86.2024.8.26.0053
Classe – Assunto Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública – IPVA – Imposto
Sobre Propriedade de Veículos Automotores
Requerente: Marcia Marisa da Silveira Carvalheira
Requerido: Fazenda Pública do Estado de São Paulo
Juiz(a) de Direito: Dr(a). RAPHAEL MARTINS DE OLIVEIRA
Vistos
Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C
DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA DE EVIDÊNCIA proposta por MARCIA
MARISA DA SILVEIRA CAVALHEIRA contra a FAZENDA DO ESTADO DE SÃOPAULO.Dispenso o relatório, na forma do art. 38, caput, Lei nº 9.099/95 c.c art. 27da Lei nº
12.153/09.
Passo a decidir
Não presentes questões preliminares, entendo que se trata de hipótese de julgamento
antecipado desta lide, na forma do art. 355, I, do Código de Processo Civil (“CPC”).
O pleito autoral é parcialmente procedente. Tenho que a presente contenda se dá acerca da transferência dos débitos do veículo
debatido nestes autos, bem como acerca da caracterização da responsabilização tributária da
Autora por débitos após tal transferência.
Pois bem, a Autora demonstrou que foi realizada a tradição do automóvel para terceira
pessoa, novo proprietário (cf. fls. 31). Tal transferência foi operacionalizada no dia 02.06.2022.
Nesta toada, a jurisprudência deste e. Tribunal vem considerando que ante a
demonstração da transferência da propriedade automotiva, o antigo proprietário deixa de ser
responsável pelos débitos tributários oriundos do veículo. Vê-se:
TRIBUTÁRIO IPVA Alienação Responsabilidade tributária
Impossibilidade: Alienado o veículo automotor, cessa a responsabilidade
pelos fatos geradores posteriores, porque o Código Tributário Nacional em seu
art. 128 só permite à lei a atribuição de responsabilidade tributária a terceira
pessoa quando vinculada ao fato gerador.
(TJSP; Remessa Necessária Cível 1002586-92.2017.8.26.0132; Relator
(a): Teresa Ramos Marques; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Público;
Foro de Catanduva – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/02/2020; Data de
Registro: 28/02/2020).
MANDADO DE SEGURANÇA Débito de IPVA, com protesto de CDA
Alienação do veículo com regular transferência Conhecimento do órgão de
trânsito da transferência Inexistência de responsabilidade tributária
solidária do alienante com o adquirente Sentença denegatória da ordem,
reformada Prejudicado Incidente de Uniformização de Jurisprudência
Recurso de apelação do impetrante, provido.
(TJSP; Apelação Cível 1017693-93.2015.8.26.0053; Relator (a): J. M. Ribeiro
de Paula; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 12ª Vara de Fazenda Pública; Data do
Julgamento: 07/12/2016; Data de Registro: 07/12/2016).
No mesmo sentido é o enunciado sumular de n. 585 do STJ: “[a] responsabilidade
solidária do ex-proprietário, prevista no art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro CTB, não
abrange o IPVA incidente sobre o veículo automotor, no que se refere ao período posterior à sua
alienação.”
Adicionalmente, não se desconhece a Lei Estadual que atribui a responsabilidade
também ao alienante, contudo, tal legislação foi declarada inconstitucional pelo c. Órgão Especial
desta Corte, posição que vem sendo mantida na jurisprudência:
APELAÇÃO RETORNO AO ÓRGÃO JULGADOR PARA EVENTUAL
ADEQUAÇÃO, NOS TERMOS DO ARTIGO 1.030, II, DO CPC TEMA 1118
DO STJ IPVA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO ALIENANTE QUE
SOMENTE É POSSÍVEL QUANDO PREVISTA EM LEI ESPECÍFICA NO
CASO, O ART. 6º DA LEI ESTADUAL N. 13.296/2008 (QUE PREVIA ESSA
RESPONSABILIDADE), FOI DECLARADA INCONSTITUCIONAL PELO C.
ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA APLICAÇÃO DO
ARTIGO 927, INCISO V, DO CPC JULGADO PRIMITIVO MANTIDO.
(TJSP; Apelação Cível 1026424-78.2015.8.26.0053; Relator (a): Ricardo
Feitosa; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 10ª Vara de Fazenda Pública; Data do
Julgamento: 06/11/2023; Data de Registro: 08/11/2023). Logo, tenho que todos os débitos a partir de 02.06.2022 não podem ser imputados à
Autora.
Assim, incontroversa a tradição do veículo, a Autora não pode mais figurar como
proprietária do bem, e, consequentemente, não pode ser considerada sujeita passiva dos tributos e
multas incidentes a partir da entrega do automóvel ao terceiro.
Seguindo à análise do dano moral, este é, na definição de RENÉ SAVATIER e conforme a
obra de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA: “(…) Savatier oferece uma definição de dano moral
como “qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária”, e abrange todo
atendado à reputação da vítima, à sua autoridade legítima, ao seu pudor, à sua segurança e
tranquilidade, ao seu amor-próprio estético, à integridade de sua inteligência, a suas afeições etc.”
(PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, 11ª ed., 2016, pp. 74-75).
No caso em tela, é evidente a ocorrência do abalo extrapatrimonial.
A inscrição de débitos indevidos no CADIN (cf. fls. 36/39) é passível de gerar abalo
moral contra o contribuinte lesado, visto que há lesão à sua dignidade. Esta é a posição deste e.
Tribunal:
APELAÇÃO CÍVEL – Ação Declaratória c/c Indenização por danos morais. 1)
Alegação de falta de interesse de agir – Inocorrência – Exclusão do nome no
CADIN que ocorreu somente após a decisão judicial. 2) Danos morais –
Inscrição indevida no CADIN, decorrentes de erro da Fazenda Pública – Presunção da ocorrência de dano moral (dano moral in re ipsa) – Precedente
do STJ – Indenização por danos morais fixadas em R$ 5.000,00 (cinco mil
reais), observando-se os princípio da proporcionalidade e da razoabilidade – Sentença mantida – Recursos improvidos.
(TJSP; Apelação / Remessa Necessária 1001643-72.2016.8.26.0597; Relator
(a): Eutálio Porto; Órgão Julgador: 12ª Câmara Extraordinária de Direito
Público; Foro de Sertãozinho – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento:
28/06/2017; Data de Registro: 28/06/2017).
Para a quantificação do dano, utilizo-me do método bifásico, elaborado pelo c. Superior
Tribunal de Justiça, consistente, em um primeiro momento, na análise dos valores a título de
compensação fixados em casos semelhantes para, em um segundo momento, fixar o quantum do
caso concreto, atento às suas particularidades.
Observo que as indenizações por casos idênticos nesta e. Corte Bandeirante giram emvolta de R$5.000,00 a R$10.000,00. Atentando-me ao valor indevidamente cadastrado, tenho por
adequado o valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), a título de compensação por danos morais.
Por fim, entendo que não houve a caracterização de litigância de má-fé por parte da
Requerida, visto que entendo ter havido mera defesa regular de suas teses.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, com base no art. 487, I, do CPC, julgo PARCIALMENTE
PROCEDENTES os pleitos Autorais, para os exatos fins de:
- i) DECLARAR a inexigibilidade das CDA’s nº 1347737285 e 1376734077 (fls. 38 e
39), devendo a Fazenda Pública realizar os futuros lançamentos tributários apenas em nome dos
atuais proprietários do veículo Fiat Strada Adventure, ano 2014/2015, cor vermelha, placa
FJP4334, RENAVAM 01033785480, Chassi 9BD57837SF792936;
- ii) CONDENAR a Requerida ao pagamento de compensação por danos morais, na
monta de R$5.000,00 (cinco mil reais), devendo haver a incidência de juros de mora e correção
monetária a partir deste arbitramento, pela taxa SELIC, com a edição da EC n. 113/2021, a partir
de 09/12/2021.
Ademais, presentes os requisitos legais, CONCEDO a tutela antecipada de evidência
requerida na exordial, de modo a determinar a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo que
suspenda a exigibilidade do crédito tributário decorrentes das CDA’s 1347737285 e 1376734077,
servindo a presente sentença como ofício.
Comunique-se o DETRAN-SP e a Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo para
inserir a restrição de ausência de transferência no referente aos débitos aqui discutidos sobre o
veículo Fiat Strada Adventure, ano 2014/2015, cor vermelha, placa FJP4334, RENAVAM01033785480, Chassi 9BD57837SF7929369.
Custas e honorários indevidos, na forma do artigo 55 da Lei n. 9.099/95.
Em caso de recurso inominado (prazo de 10 dias), à parte não isenta por lei, nembeneficiária da justiça gratuita, deverão ser recolhidas custas (1% sobre o valor da causa mais 4%sobre o valor da condenação), verificando-se condenação ilíquida, parcial ou ausência de
condenação, a parcela de 4% deverá ser calculada com base no valor da causa, observado o
mínimo de 5 UFESPs para cada parcela. O peticionamento deverá ser categorizado corretamente
como “recurso inominado”.
Transitando em julgado, arquivem-se os autos, com as cautelas de praxe.
São Paulo, data da assinatura.
P.I.
RAPHAEL MARTINS DE OLIVEIRA
JUIZ SUBSTITUTO
São Paulo, 10 de setembro de 2024.