A Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo afastou a cobrança de ICMS sobre produtos médicos que não estavam previstos no Convênio 01/1999, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que listava itens isentos à época da autuação. Os juízes decidiram que os coils, espirais de platina usadas em cirurgias para impedir a ruptura de aneurismas, são isentos do tributo, mesmo a lista de isenções só citando expressamente os clipes, que têm a mesma função. O placar ficou em 9 a 6 para prover o recurso do contribuinte.
A decisão abre precedente para que outros produtos não citados expressamente em convênios sejam considerados isentos. O tribunal já havia tomado decisão semelhante em 2020, mas o caso tratava do mesmo produto médico feito com matérias-primas diferentes. Dessa vez, a discussão envolve produtos diferentes com o mesmo uso. O TIT é um tribunal que julga processos administrativos envolvendo tributos estaduais em São Paulo.
No caso julgado em 2020, a Câmara Superior do TIT afastou o ICMS sobre stents (processo 4.090.891-4), usados em cirurgias cardíacas. Na época, a discussão foi sobre o material que compunha o equipamento, feito de aço inoxidável e cromo cobalto. A fiscalização autuou o contribuinte porque a matéria-prima era diferente da descrita no Convênio 1/1999. No entanto, por 8 a 5, os juízes do TIT afastaram a cobrança.
Já no caso dos coils (processo 4.092.718-0), julgado no dia 7 de julho, a CMS Produtos Médicos Ltda. foi autuada em 2012, ainda sob o Convênio 1/1999, por não recolher o ICMS sobre os itens. Mais tarde, o Convênio 149/2013 incluiria os coils na lista de isenção. As espirais de platina são consideradas uma evolução no tratamento em relação aos clipes.
A empresa recorreu contra a autuação sob o argumento de que os coils são equivalentes aos clipes. No entanto, perdeu na 1ª e na 2ª instâncias. Na Câmara Superior, o relator do caso, juiz Marco Teixeira, também negou provimento ao recurso do contribuinte. O julgador embasou seu voto no artigo 111 do Código Tributário Nacional (CTN), que estabelece que a interpretação de normas relacionadas à isenção tributária deve ser literal.
“Tais produtos [coils] não estavam especificamente incluídos no rol de isentos à época das operações e não é permitido, nesse caso, estender o alcance da norma. Um clipe de aneurisma não é um coil. São produtos completamente diferentes, sendo o clipe aplicado externamente, através de abertura do crânio, ao passo que o coil é introduzido por um cateter via arterial e preenche o interior do aneurisma”, argumentou.
No entanto, o juiz Edison Aurélio Corazza, que havia pedido vista do processo, abriu divergência. O julgador citou precedentes do STF (AI-AgR 360461) e STJ (AgInt no REsp 1.759.989) para defender que, quando a interpretação literal se mostra insuficiente para manifestar o verdadeiro sentido da norma tributária, o aplicador pode fazer uma interpretação.
“Toda a minha interpretação, quem faz o meu voto, é o STF e STJ, que dizem que não posso ler o artigo 111 [do CTN] no sentido de levar a interpretações que são contrárias à própria finalidade da norma. A finalidade da norma está clara, pois, no ano seguinte à autuação, esses produtos [coils] foram incluídos no convênio [149/2013]”, afirmou Corazza.
O julgador observou ainda que a legislação não consegue acompanhar a tecnologia e que o custo de aplicar o ICMS aos produtos médicos “se dá no usuário final, que é quem está na UTI precisando de uma cirurgia”. A maioria dos juízes acompanhou a divergência, formando um placar de 9X6 para afastar a cobrança de ICMS sobre as espirais de platina.
Para o advogado Caio César Morato, do Rayes e Fagundes Advogados Associados, que representou a CMS Produtos Médicos Ltda. no caso dos coils, a decisão da Câmara Superior do TIT sinaliza uma tendência. “Acho que a decisão é importante não só para esse produto específico, mas mostra uma tendência de reconhecimento da isenção de uma maneira menos rígida. O TIT já vinha, há algum tempo, reconhecendo a possibilidade de uma interpretação mais conforme a evolução dos produtos, como no caso dos stents”, avalia.
Fonte: JOTA/MARIANA BRANCO