Uma empresa de telecomunicações conseguiu no Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) do Estado de São Paulo afastar cobrança de ICMS sobre serviços de segurança e gerenciamento de rede. A decisão, da 4ª Câmara Julgadora, é contrária à atual jurisprudência do órgão administrativo.
Os contribuintes defendem o pagamento de ISS. Argumentam que, pela Lei Geral de Telecomunicações (nº 9.472, de 1997), serviços de valor adicionado – que não são a principal atividade da empresa – não podem ser classificados como de telecomunicação, sobre os quais incide o imposto estadual. Em São Paulo, a alíquota do ICMS-Comunicação é de 25%.
Outros Estados, como o Rio de Janeiro e Minas Gerais, e o Distrito Federal também cobram o ICMS sobre esses serviços, o que tem levado contribuintes a discutir a questão na esfera administrativa. A tese tem um grande impacto econômico, já que a alíquota de ISS varia entre 3% a 5%, a depender do município.
A decisão do TIT beneficia a British Telecom (BT), adquirida recentemente pela Sencinet, que conseguiu anular auto de infração lavrado pela Fazenda do Estado de São Paulo. Pode representar, segundo o advogado Raphael Caropreso, do escritório Veirano Advogados, que assessora a empresa, uma possível mudança de entendimento do tribunal.
Entre as empresas de telecomunicação, é comum, acrescenta, a prestação de outros serviços, como de segurança e gerenciamento de rede. Ambos são alguns dos que movimentam cada vez mais o mercado, por causa da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e a crescente preocupação das empresas com ataques cibernéticos.
Contudo, como não fazem parte da atividade principal dessas empresas, estariam sujeitos ao ISS, de acordo com o advogado. “A própria redação da lei [geral de telecomunicações] diz que, ainda que tenham correlação, são serviços distintos e que não se confundem”, diz.
O caso foi analisado recentemente pelos juízes da 4ª Câmara Julgadora do TIT (nº 4.129.674-6). Prevaleceu o entendimento do relator, juiz Walter Carvalho Mulato de Britto. Ele acolheu os argumentos da empresa e destacou a impossibilidade de enquadrar outros serviços – principalmente gerenciamento de rede – como de comunicação.
“Com base no laudo técnico, suportado ainda pela doutrina e decisões dos tribunais superiores, entendo que, juridicamente, não há como enquadrar os serviços prestados pela recorrente como sendo de comunicação, pois a LGT [Lei Geral de Telecomunicações] conceitua e define os serviços de valor adicionado como sendo aqueles que facilitam o acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações”, diz o julgador.
Para ele, a fiscalização não conseguiu demonstrar que os serviços cobrados são relacionados à geração, transmissão e receptação de sons, dados, imagens e informações de qualquer natureza, “estes tão somente passíveis de tributação pelo ICMS”.
E acrescenta: “Isso não quer dizer que o Fisco não possua competência para conferir os critérios de apuração dos gastos (custos e despesas) mais margem de lucro para fins de precificação de cada serviço, evitando que a maior parte dos gastos sejam alocados aos serviços sujeitos à incidência do ISSQN.
” O voto dele foi acompanhado pelo juiz Paulo Schmidt Pimentel, presidente da Câmara Julgadora, o que resultou no provimento do recurso, por maioria de votos. Ainda cabe recurso para a Câmara Superior do TIT.
Se confirmada, segundo advogados, a decisão administrativa deve encurtar o caminho dos contribuintes, que só têm conseguido reverter esse posicionamento no Judiciário. No TIT, dizem, há mais um entendimento favorável às empresas (nº 4.037.054-9).
Existem diversas decisões recentes no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) – processos nº 1016493-22.2013.8.26.0053 e nº 1044037-77.2016.8.26.0053 – e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) a favor da tese. No STJ, ao analisar um recurso repetitivo (Tema 427), os ministros definiram o que seriam serviços de comunicação para a incidência do ICMS e que essas atividades meio não podem ser confundidas com a atividade-fim.
A nova decisão do TIT, de acordo com Carlos Eduardo Navarro, tributarista do escritório Galvão Villani Navarro Advogados, segue esses precedentes judiciais. Ele afirma que, embora a Câmara Superior tenha sido favorável à Fazenda, na Justiça o entendimento é consolidado contra a incidência de ICMS-Comunicação sobre serviços de valor adicionado. Há, inclusive, acrescenta, duas súmulas do STJ contra incidência do ICMS sobre determinadas atividades – nº 334 (provedores de acesso à internet) e nº 350 (habilitação de celular).
Em nota enviada ao Valor, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo informa que a decisão ainda não se tornou definitiva e “cabe à Câmara Superior do TIT proferir decisão uniformizando a jurisprudência do tribunal nas situações em que existem decisões divergentes nas Câmaras Julgadoras quanto a uma mesma matéria”.
Ainda acrescenta que “há precedentes da Câmara Superior no sentido de que os serviços essenciais e indissociáveis da prestação de serviço de comunicação devem integrar a base de cálculo do ICMS-Comunicação”. Por isso, diz, não seria possível afirmar que houve mudança de entendimento do TIT.
Valor Econômico – Por Adriana Aguiar, 22/09/2021