Texto do imposto mínimo de 15% está pronto, mas Planalto pede mais discussão
3 de outubro de 2024
Executivo quer mais debate com o setor privado. Previsão chegou a ser incluída na MP 1.261, mas foi retirada de última hora
Fachada do Ministério da Fazenda. Crédito: Marcos Oliveira Agência Senado
O governo tem pronto um texto de medida provisória promovendo o imposto de renda mínimo de 15% para as empresas, em linha com o Pilar 2 da OCDE. O texto com a proposta, cujo impacto arrecadatório é entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões, chegou a ser incluído na MP 1.261, editada na noite dessa quarta-feira (3/10), mas na última hora foi retirado pelo Planalto.
A alegação foi a de que era necessário discutir melhor o tema com o setor privado, especialmente com as empresas multinacionais que gozam de incentivos fiscais e que podem ser afetadas negativamente pela decisão. Assim, a despeito do estágio avançado da medida, alguns ajustes adicionais na proposta podem ser feitos até que a MP venha a ser efetivada.
Também está pronto o texto prorrogando por dois anos as regras da chamada TBU (Tributação em Bases Universais). Essa medida pode gerar perdas fiscais para o governo da ordem de R$ 4 bilhões e pode ser compensada seja com o imposto mínimo do Pilar 2 ou com outra medida, como o prazo maior para os bancos abaterem do IRPJ/CSLL o estoque de perdas com créditos em inadimplência, que foi feito na MP de ontem (e no qual a TBU também chegou a entrar e saiu de última hora).
Embora o foco da MP 1.261 seja regulatório, ao evitar uma redução excessiva de capital pelos bancos para efeitos da regra de Basileia, a medida tem impacto arrecadatório estimado em R$ 16 bilhões, segundo nota publicada pelo Ministério da Fazenda. Uma das expectativas é que esse recurso, que na verdade é decorrente de uma redução de perda de receitas no ano que vem, seja usado para compensar eventuais perdas com a recalibragem de regras tributárias do mercado financeiro, que está sendo finalizada na equipe econômica e cuja intenção é ser enviada até o fim do ano.
Com arrecadação de R$ 16 bi, Receita defende que MP 1.261 tem objetivo ‘prudencial’
Apesar da previsão de impacto positivo aos cofres públicos de R$ 16 bilhões em 2025 atrelada à MP 1.261/24, divulgada na última quarta-feira (2/10), a Receita Federal defendeu que a medida não tem objetivo arrecadatório, já que a longo prazo o efeito da norma será neutro. Ainda, segundo a Receita, a MP foi alinhavada com o Banco Central e com o setor financeiro, que sai ganhando com a alteração. O JOTA confirmou com fontes ligadas aos bancos que a medida foi combinada e negociada com o setor.
A MP prevê o alongamento, aos bancos, do período de dedução, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do estoque de perdas decorrentes de créditos em inadimplência. O período, de acordo com a Lei 14.467/22, era de três anos, e com a MP passa para sete anos, podendo chegar a até dez anos.
O valor de R$ 16 bilhões, que não está previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), vem da diferença entre o que deixaria de ser recolhido de IRPJ e CSLL com um prazo menor em relação ao que deixará de ser arrecadado com a MP. Grosso modo, antes as instituições financeiras teriam menos tempo para abater os valores do IRPJ e da CSLL, o que significaria um montante maior de deduções. Agora, haverá uma diluição ao longo dos anos. No final das contas, entretanto, o valor a ser abatido será o mesmo, por isso a Receita insiste no argumento de que o impacto é neutro.
Em coletiva de imprensa realizada nesta quinta-feira (3/10), integrantes da Receita afirmaram que a alteração é positiva principalmente porque evita a formação de um ativo diferido no balanço que pode trazer consequências negativas para os bancos. “Esses ativos que são registrados no balanço dos bancos, decorrentes dessa diferença de tratamento contábil e tributário, recebem um tratamento rigoroso nas regras prudenciais de Basileia”, afirmou o subsecretário de reformas microeconômicas e regulação financeira da Secretaria de Reformas Econômicas (SRE), Vinícius Brandi.
A Lei 14.467, segundo a Receita, promoveu o alinhamento entre regras contábeis e fiscais em relação ao tratamento de créditos relacionados a operações inadimplidas ou realizadas com pessoas jurídicas em recuperação judicial ou processo falimentar. Isso porque, antes da norma, as instituições financeiras poderiam reconhecer rapidamente em seus balanços essas perdas. A dedução dos valores da base do IRPJ e CSLL, porém, só poderia ser feita alguns anos depois.
“Havia um descasamento, principalmente antes de 2022, e para fins contábeis, até por determinação do Banco Central, o reconhecimento dessas perdas era feito de forma mais antecipada. Acontecia o não pagamento de um empréstimo, de forma simplificada, e o banco rapidamente, até por uma questão de prudência, reconhecia essa perda. Entretanto, para fins fiscais tínhamos uma lei que trazia mais exigências para o reconhecimento dessa perda para fins tributários”, explicou nesta quinta a subsecretária de tributação e contencioso da Receita Federal, Cláudia Pimentel.
As novas regras de dedução previstas na norma de 2022 valem a partir de 1º de janeiro de 2025. O artigo 6º da lei, alterado pela MP 1.261/24, prevê o tratamento ao estoque de créditos formado até dezembro de 2024.
Ainda, há uma relação entre o tema e o prejuízo fiscal e base negativa de CSLL apurados pelos bancos. “Quando [o banco] reconhece uma despesa em um espaço mais curto, a depender do balanço e da apuração tributária do banco, se ele já está com prejuízo [fiscal], aquele prejuízo só aumenta. E se ele passa a ter um prejuízo fiscal, você tem a trava de 30% [para abatimento na base de cálculo do IRPJ e CSLL]”, afirmou Pimentel.
O advogado Leandro Cabral e Silva, do Velloza Advogados Associados, explica que o prazo menor poderia ser maléfico principalmente a bancos grandes ou instituições que já têm valores registrados de prejuízo fiscal. Isso porque o registro de um ativo diferido no balanço tende a aumentar esse prejuízo, gerando um possível problema de ordem regulatória.
Ainda segundo Cabral, o fato esbarra em regras do Banco Central que definem que os bancos podem apurar prejuízo fiscal por três anos. Caso contrário, eles podem ser intimados a justificar a sucessão de prejuízos, e, em último caso, podem ser obrigados a “baixar” o ativo diferido registrado. Ou seja, em última instância os bancos poderiam “perder” esse valor, deixando de abatê-lo da base do IRPJ e da CSLL.
Fábio Graner
Analista de Economia
Bárbara Mengardo
Editora de Tributos