Sumário: 1. Introdução. 2. A atividade argumentativa. 3. A teoria da argumentação. 4. Funcionalidades da teoria da argumentação. 5. Argumentação jurídica e atividade hermenêutica. 6. Conclusões. Quando se pensa na decisão judicial, é imperioso lembrar o dever constitucional que o juiz tem de fundamentá-la, sob pena de nulidade, nos termos do art. 93, IX, da Constituição da República. Mas, de que adianta fundamentá-la, se o juiz, com base na chamada “livre convicção motivada”, na sua experiência e, sobretudo, do alto de sua prudência e autoridade, pode dizer qualquer coisa para justificar suas conclusões? Em outras palavras, se o juiz pode julgar de acordo com sua vontade, de forma solipsista, ou pior, em nome de interesses inconfessáveis, e essa decisão vai valer, de que adianta falar em exigência constitucional de fundamentação das decisões? Por essa razão básica, que poderia ser ilustrada aqui com inúmeros exemplos, é que muitos pensadores brasileiros do direito colocaram o tema da decisão judicial em foco, expondo-a como campo de trabalho, com a finalidade de compreender, de um lado, como ela é construída e, de outro, descrever os vários modelos sobre como ela deveria ser construída. Alguns autores chegam a propor caminhos. No Brasil, como referência no tema, cito Paulo de Barros Carvalho, Tercio Sampaio Ferraz Júnior e Lenio Streck. Entendo que a decisão judicial envolve duas atividades separadas e bem definidas: a interpretação e a argumentação. Através delas, ocorre o que, com inspiração em Paulo de Barros Carvalho, chamo de construção da decisão judicial. Alinhado com os três citados professores, concluo que a realidade é linguagem, que a verdade depende do sistema de referência e que o direito será pouco entendido, a não ser que se alcance essa compreensão. A atividade hermenêutica ou interpretativa, nesse passo, é relacionada com a compreensão da linguagem com que trabalha o juiz: os textos das narrativas das partes, expressos nas petições e nas diversas formas de produção de provas, bem como os textos das normas jurídicas, expressos, principalmente, através das leis, da jurisprudência, dos precedentes e das súmulas. É a partir da maneira como o juiz compreende essa linguagem, totalmente condicionada e marcada pelo seu horizonte interpretativo, definido por suas pré-compreensões (limitações, crenças e, sobretudo, seus valores), é que lhe será possível chegar à sua própria narrativa do caso concreto e, consequentemente, ao fato jurídico a ele correspondente, à norma jurídica de decisão e, por fim, à decisão judicial. A atividade interpretativa, portanto, fornece os fundamentos para a decisão judicial. E a atividade argumentativa? Em que ela consiste? Qual sua importância para a construção da decisão judicial? Em que a atividade argumentativa se diferencia da atividade interpretativa? É o que tentarei mostrar nas páginas seguintes.
Bianor Arruda Bezerra Neto é Doutor em Direito pela PUC. Juiz Federal na 5ª Região.