Os ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) formaram placar de 6 X 6 no julgamento que poderá mudar a jurisprudência do tribunal no sentido de obrigar o devedor a pagar encargos de mora surgidos após o depósito judicial que garantiu parcial ou integralmente o valor da execução. Trata-se do REsp 1820963/SP, que busca revisar o Tema Repetitivo 677 do STJ.
Depois do empate, a relatora, ministra Nancy Andrighi, pediu vista regimental para complementar o seu voto a respeito dos requisitos e causas de admissibilidade do chamado overruling, que trata da alteração de um entendimento jurisprudencial já pacificado.
A discussão envolve os casos em que um devedor, pessoa jurídica ou física, é condenado à obrigação de pagar. Depois dessa condenação, é iniciada a fase de execução, voltada a cobrar os valores devidos. Nessa fase de execução, porém, se o devedor discorda do valor definido na decisão, ele pode discutir esse valor, chegando, inclusive, aos tribunais superiores. Para isso, ele deve garantir o montante da execução, geralmente por meio do depósito judicial, mas o credor só recebe efetivamente o dinheiro quando a discussão judicial é encerrada.
Pela jurisprudência atual, firmada em 2014, no Tema Repetitivo 677, “na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada”.
Ou seja, hoje, a jurisprudência entende que, ao realizar o depósito judicial, o devedor já cumpriu a sua obrigação mesmo que fique por anos discutindo no Judiciário o valor devido. Assim, o credor tem direito apenas a juros e correção monetária pagos pela instituição financeira que guardou o depósito, mas não aos encargos de mora e outras obrigações do contrato calculados até o momento em que de fato recebe o valor.
A Corte Especial está discutindo justamente se vai revisar esse entendimento. A relatora votou no sentido de dar provimento ao recurso e, com isso, alterar a jurisprudência, para obrigar o devedor a pagar os encargos de mora e outras obrigações decorrentes do contrato. Nancy Andrighi afirmou que, na prática, ao realizar o depósito, o devedor não paga o credor, mas realiza uma penhora. O credor recebe o valor apenas quando a discussão no Judiciário é encerrada.
“Se fossemos considerar o depósito como pagamento e liberar a parte, do que adiantaria fazer contrato com consectários [consequências], juros, correção e multa? O contrato nunca seria concretizado. Bastaria o devedor realizar o depósito e seria liberado de todas as outras cláusulas contratuais”, afirmou a relatora.
A relatora foi acompanhada pelos ministros João Otávio de Noronha, Laurita Vaz, Maria Thereza de Assis Moura, Herman Benjamin e Benedito Gonçalves.
Divergência
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino abriu a divergência, ao afirmar que não enxerga motivos para alterar a jurisprudência. O magistrado foi acompanhado pelos ministros Jorge Mussi, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell, Raul Araújo e Francisco Falcão.
Faltam julgar os ministros Og Fernandes, que estava ausente na sessão desta quarta-feira (30/3), e o presidente Humberto Martins. A ministra Isabel Gallotti não participou da sessão em que foram realizadas as sustentações orais e, portanto, não votará neste caso.
Depois de o placar ficar empatado, os ministros discutiram se não seria necessário um quórum especial para alterar a jurisprudência firmada em sede de recurso repetitivo. Esse quórum, no entanto, não é exigido pelo regimento interno do STJ.
Diante das divergências a respeito dos critérios de admissibilidade do recurso, a relatora pediu vista regimental.
A expectativa dos magistrados é que, quando o caso voltar à pauta, além de a relatora ter complementado seu voto, esteja presente também o ministro Og Fernandes.
Fonte: JOTA/CRISTIANE BONFANTI