Com decisão da 1ª Turma contrária à cobrança, questão poderá ser levada à 1ª Seção.
A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria de votos, que não há incidência de Imposto de Renda (IRPJ) e de CSLL sobre os créditos obtidos por meio do Regime Especial de Reintegração de valores Tributários (Reintegra)antes da entrada em vigor da Lei nº 13.043, de 2014, que reinstituiu o benefício. O entendimento é diferente do adotado pela 2ª Turma – que também julga questões de direito público – e, por esse motivo, caberá à 1ª Seção uniformizar o tema.
O julgamento ocorreu ontem e foi a primeira vez que a 1ª Turma decidiu sobre o assunto (REsp 1571354). A 2ª Turma, no entanto, já julgou ao menos dois processos(AREsp 1334667 e REsp 1462313) e em ambos as decisões foram favoráveis à Fazenda Nacional, ou seja, permitindo a tributação.
Como agora existe divergência, tanto a Fazenda Nacional como os contribuintesterão a possibilidade de recorrer das decisões das turmas à 1ª Seção.
O Reintegra foi criado em 2011, por meio da Lei nº 12.546, com o objetivo deressarcir os custos tributários das exportadoras. Há discussão em relação àtributação porque não havia, na norma, previsão sobre o assunto. Isso só ocorreucom a lei de 2014. Consta no artigo 21, de forma expressa, que os créditos nãodevem ser incluídos nas bases de cálculo do PIS e da Cofins e do IRPJ e da CSLL.
O julgamento sobre esse tema na 1ª Turma começou em maio e, de lá para cá, foi interrompido três vezes por pedidos de vista. Até ontem haviam votado o relator,Gurgel de Faria, e os ministros Napoleão Nunes Maia Filho e Regina Helena Costa. O placar estava em dois a um para os contribuintes.
Gurgel de Faria se posicionou pela tributação. Para ele, o Reintegra é uma subvenção de custeio e, por esse motivo, deve ser tributado. Somente por meio de lei, afirmou em seu voto, seria possível afastar a incidência de IRPJ e CSLL – a exemplo do que aconteceu após 2014.
Já Napoleão Nunes Maia Filho e Regina Helena Costa entenderam que esses créditos devem ser considerados como mero ressarcimento e não como um areceita nova, que possa configurar acréscimo patrimonial. Por esse motivo, então,não haveria a tributação.
Esse foi o entendimento que prevaleceu na 1ª Turma. O julgamento, ontem, foi retomado com o voto-vista do ministro Benedito Gonçalves, que acompanhou a divergência. “Não representa lucro”, afirmou em seu voto. Já o ministro Sérgio Kukina, que também não havia votado ainda, seguiu o entendimento do relator e ambos ficaram vencidos. O placar final foi de três a dois contra a tributação.
A lei que instituiu o Reintegra, a nº 12.546, previa a concessão do benefício até 31 de dezembro de 2012. Essa norma permitia a apuração de um crédito mediante a aplicação de percentual de 3% sobre a receita de exportação. Esses valores poderiam ser utilizados pelas empresas para o pagamento de débitos tributários ou o ressarcimento em espécie. Em 2012, antes de vencer o prazo, foi editada a Medida Provisória (MP) nº 601 para estender o benefício até dezembro de 2013.
Foi a Lei nº 13.043, de 2014, no entanto, que tornou o programa válido por período indeterminado e, pela primeira vez, tratou sobre a exclusão dos valores do cálculo do IRPJ e a CSLL. Ficou estabelecido, além disso, que o percentual aplicado sobre a receita passaria a ser definido pelo Ministério da Fazenda – hoje Ministério da Economia.
O caso analisado pela 1ª Turma envolve a Docile Alimentos, do Rio Grande do Sul.Em sustentação oral no mês de maio, quando o julgamento teve início, o advogado da empresa, Fernando Rios, havia resumido que o processo tratava de definir sequem recebe os créditos do Reintegra aufere ou não renda. Segundo ele, na fabricação dos produtos alimentícios, por exemplo – como no caso dos autos – o resíduo tributário é de 4,25% e o Reintegra devolve atualmente 0,1% às exportadoras.
Consta no processo que a empresa recebeu R$ 415 mil em 2012 e R$ 351 mil em 2013. Esses valores compuseram a base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL e, consequentemente, aumentaram o valor recolhido em tributos nesses dois anos.
Especialista na área, João Amadeus dos Santos, do escritório Martorelli Advogados,diz que a decisão da 1ª Turma “vem para trazer segurança jurídica em relação à própria essência do regime especial”. “O Reintegra, desde a sua origem, trata de devolução de custos tributários incorridos”, afirma.
Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional informa que “a definição da 1ª Turma é oposta às manifestações da 2ª Turma” e que “há perspectiva de ingressar com embargos de divergência” – que serão analisados pela própria turma. A PGFN não deu informações sobre o impacto financeiro da tese para os cofres da União.
FONTE: Valor Econômico – Por Joice Bacelo — De Brasília – 20 de setembro de 2019