As varejistas saíram na frente no julgamento em que a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai decidir se é válida a revogação antecipada da alíquota zero de PIS e Cofins sobre a receita bruta com a venda de produtos de informática e tecnologia, como smartphones e notebooks. Depois do voto do relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, a favor dos contribuintes, a sessão foi suspensa por pedido de vista.
O benefício foi criado pela chamada Lei do Bem (nº 11.196, de 2005), para estimular a venda desses produtos. Renovado, deveria valer até 2018, mas foi revogado três anos antes. Representou, anualmente, renúncia de R$ 6,7 bilhões, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
No STJ, o tema é julgado por meio de três recursos (REsp 18498 19, REsp 1845082 e REsp 1725452). Dois deles de empresas e um da Fazenda Nacional contra decisões de segunda instância. Nos Tribunais Regionais Federais (TRFs), prevalecem decisões favoráveis à União, de acordo com a defesa oral da procuradora Amanda Geracy.
Para os advogados das partes que participaram do julgamento, o contribuinte foi surpreendido com a revogação do benefício. “Não há dúvida que houve violação ao princípio da segurança jurídica”, disse a advogada Jussandra Hickmann Andraschko, sócia do Hickmann Advogados, que representa a Sir Computadores. Ela destacou, em sustentação oral, os requisitos exigidos para a fabricação desses produtos e a desoneração do PIS e da Cofins.
“O contribuinte acordou no ano de 2015 com a vigência do benefício até 31 de dezembro de 2018. Ele se preparou e foi surpreendido em 2015 com a revogação”, afirmou Ariane Guimarães, sócia do escritório Mattos Filho, que defende a Carlos Saraiva Importação e Comércio. “Aqui, apesar de o termo empregado na lei ser alíquota zero, estamos diante de uma isenção em essência.”
No julgamento, porém, a Fazenda Nacional defendeu que a questão seria constitucional. Discute-se a possibilidade de uma lei revogar benefício de alíquota zero instituído por outra lei. “Há conflito de normas e o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que conflito de normas é matéria constitucional”, disse a procuradora Amanda Geracy.
Ela acrescentou que o grande mote da Lei do Bem foi fomentar pesquisa e desenvolvimento de produtos de informática no Brasil com uma série de benefícios fiscais para a indústria, que resvalavam no varejo. O benefício ao industrial não foi revogado e persiste até 2029.
Na renovação do benefício em 2014, segundo a procuradora, a equipe econômica trabalhava com expectativa de superávit. Em razão da crise econômica, porém, o cenário foi de déficit. “Antes de cortar despesas públicas se buscou revisar os benefícios fiscais”, disse ela, lembrando que o orçamento foi enviado pela primeira vez ao Congresso com déficit e assim foi aprovado.
No entendimento da representante do amicus curiae Instituto para Desenvolvimento do Varejo, Gláucia Lauletta, sócia do escritório Mattos Filho, “o rombo fiscal não justifica o uso pelo governo de meios ilegais”. De acordo com ela, o varejo investiu em estoque, empregos formais e treinamento por causa da isenção.
Relator do caso, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho acatou a argumentação das empresas. “Isso pode ser feito? Prorroga uma coisa e sete meses depois cancela essa coisa?”, questionou. Para ele, a revogação causou enorme surpresa e prejuízo. ”Não se deve matar o boi para acabar com os carrapatos. Precisamos manter o sistema de incentivos.”
O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Gurgel de Faria. Ele lembrou que em 2019 chegou a levantar a possibilidade de o tema ser julgado como repetitivo, mas desistiu por considerá-lo constitucional. O relator o informou, porém, que para o STF a questão é infraconstitucional.
FONTE: Valor Econômico – Por Beatriz Olivon, 02/12/2020.