O Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar ontem a possibilidade de a União ter que dividir com a Eletrobras a conta do empréstimo compulsório sobre o consumo de energia elétrica, hoje estimada em R$ 13,9 bilhões. Por ora, apenas o relator, ministro Mauro Campbell Marques, votou. Ele foi contrário ao pedido da empresa.
O julgamento foi suspenso por pedido de vista. A expectativa de advogados da Eletrobras e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), em caso de a União ser considerada responsável solidária, é a de que tenha que desembolsar metade dos juros e correção monetária do empréstimo compulsório, extinto em 1993, devido a consumidores – algo em torno de R$ 7 bilhões.
A questão começou a ser analisada por meio de dois recursos repetitivos (REsp 1576254 e REsp 1583323). No julgamento, o advogado da Eletrobras, Felipe Sarmento, afirmou que, nos casos em julgamento, as sentenças condenam solidariamente a União e a Eletrobras à restituição da diferença de correção monetária e juros. “Como agora, em fase de execução, voltar e dizer que a União não é devedora?”, questionou.
Ainda segundo o advogado, o dinheiro do empréstimo compulsório entrou na Eletrobras, mas foi investido conforme orientação do ministro de Minas e Energia da época e, agora, os bens pertencem à União. “A grande beneficiária do empréstimo compulsório é a União”, disse.
Já o procurador da Fazenda Nacional, Paulo Mendes, afirmou que o tema poderia gerar precedentes preocupantes para os entes federados. “O que se pretende é que o ente federado seja condenado duplamente, porque a União já é acionista controladora da Eletrobras e vai arcar com seus prejuízos eventuais. Há um evidente bis in idem (dupla sanção), porque a União vai sofrer duplo prejuízo”, disse.
Ainda segundo o procurador, se a União for responsabilizada, todas as demais empresas públicas poderão cobrar valores em situações semelhantes. A União tentou resolver o assunto administrativamente, mas foi impedida por pareceres – entre eles um do Tesouro Nacional -, que indicam não existir qualquer base para a Eletrobras direcionar essa cobrança à União, segundo Mendes.
Em seu voto, o relator negou o pedido da empresa. Ele entendeu que, no caso, a União teria responsabilidade subsidiária. “Inexiste o direto de regresso da Eletrobras contra a União. Ela só é garantidora”, afirmou. Na responsabilidade solidária ambos dividem a responsabilidade por eventual dívida. Na subsidiária, o outro somente arca com a demanda se o primeiro faltar.
Embora o relator tenha usado no julgamento, inicialmente, a expressão “responsabilidade solidária subsidiária”, o voto deixa claro que se refere a responsabilidade subsidiária, segundo a advogada Cristiane Romano, sócia do escritório Machado Meyer. “O ministro cita que a União, ente criador, só é legitimamente devedora em caso de insuficiência de pagamento pela Eletrobras”, afirmou.
Em fevereiro, o relator havia decidido que os repetitivos terão sua aplicação restrita a casos em que a decisão que formou título executivo não delimitou expressamente qual o percentual que cabe à Eletrobras e à União na devolução do empréstimo compulsório.
No Formulário de Referência de 2018 da companhia, a empresa demonstra a importância dos reflexos do empréstimo compulsório. E apesar de citar os R$ 13,9 bilhões, acabou provisionado um valor maior – R$ 16,6 bilhões – para cobrir perdas decorrentes de decisões desfavoráveis. Ainda no documento, a companhia indica que também há processos sobre empréstimos compulsórios no Supremo Tribunal Federal (STF).
Por Beatriz Olivon | De Brasília
Fonte : Valor-14/06/2018