É a primeira que a Corte analisa o tema, que gera divergências nos Tribunais Regionais Federais.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou o julgamento em que decidirá se as operadoras de telefonia podem se beneficiar de isenções fiscais que estariam previstas em tratados internacionais. Esse caso está em análise na 1ª Turma e envolve a incidência de Cide e Imposto de Renda Retido da Fonte (IRRF) sobre as remessas que são enviadas pelas empresas brasileiras a companhias no exterior em razão dos serviços relacionados à Discagem Direta Internacional (DDI).
Por enquanto, há apenas o voto do relator, o ministro Gurgel de Faria, favorável à cobrança dos tributos. Logo após o seu voto, a ministra Regina Helena Costa pediu vista e não há nova data para que a discussão seja retomada.
O julgamento é importante para o setor porque a decisão, quando proferida, será a primeira da Corte sobre o tema. Há divergência sobre o assunto nos Tribunais Regionais Federais (TRFs). O da 1ª Região, em Brasília, por exemplo, tem decisões contrárias às empresas, enquanto que o da 2ª, no Rio de Janeiro, e da 3ª, em São Paulo, têm posicionamento favorável.
Os ministros da 1ª Turma analisam recurso da Telefônica contra decisão do TRF da 1ª Região (REsp 1772678). Os desembargadores entenderam que a isenção prevista no tratado aplica-se apenas aos impostos que incidem sobre os serviços e não aos tributos que são aplicados à remuneração de tais serviços.
A discussão se dá em torno do regulamento internacional de telecomunicações, estabelecido pelo Tratado de Melbourne – que é parte do Tratado de Genebra, do qual o Brasil é signatário. Dentre as previsões do texto, há cláusula que estabelece a exoneração tributária na contraprestação de serviços internacionais do setor.
O caso em análise envolve o pagamento às operadoras situadas no exterior em razão dos serviços por elas prestados para que os clientes de empresas brasileiras consigam realizar as chamadas internacionais. A operação é conhecida como “tráfego sainte”.
Representante da Telefônica no caso, o advogado André Torres dos Santos afirmou aos ministros, em defesa oral, que a justificativa da segunda instância “esvazia a força normativa do tratado internacional”. “O objetivo do tratado é exonerar a tributação operacional tanto de entrada quanto de saída de todos os tributos e não apenas de determinadas espécies”, disse ele, acrescentando que outros países signatários assim o fazem e que a norma foi incorporada à legislação brasileira por decretos legislativo e presidencial.
Já a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) defendeu que tal regulamento não faz parte do ordenamento jurídico nacional. Um dos argumentos é o de que quando o Congresso analisou e ratificou os tratados internacionais, o texto referente às telecomunicações não tinha ainda validade.
“O Tratado de Nairóbi diz que só é possível incorporar anexos em vigor e na década de 90, quando isso aconteceu, o regulamento de Melbourne ainda não estava em vigor”, disse o procurador Ricson Moreira Coelho da Silva, na defesa oral, enfatizando que tal texto “não foi objeto de análise no Congresso” e que “sequer houve publicação no Diário Oficial”.
A Fazenda acrescentou ainda que não cabe à União dispor sobre o tema porque a competência para tributar os serviços prestados pelo setor é dos Estados, como entende ser o caso – aos moldes do que decidiu o TRF-1.
Relator do recurso, o ministro Gurgel de Faria, deu razão à União. Não em relação à validade do regulamento no Brasil. O ministro entende que a incorporação da norma ao ordenamento jurídico nacional se deu como determina a Constituição Federal. O voto de Gurgel de Faria pela incidência do IRRF e da Cide sobre os pagamentos enviados ao exterior se ateve à interpretação da cláusula que consta no regulamento internacional de telecomunicações.
Para o magistrado, a isenção de que trata o texto é específica à tributação que incide sobre os serviços que são prestados pelas companhias e esse não é o caso do IRRF, cobrado sobre a renda, nem da Cide, que nesse caso envolve domínio econômico. “Não há aqui a questão do fato gerador específico do serviço internacional de telecomunicação”, afirmou ao votar a matéria.
A ministra Regina Helena Costa pediu vista logo após o voto do relator com a justificativa de que essa é a primeira vez que a Corte analisa o tema e como verificou que há divergência entre os tribunais regionais gostaria de examinar melhor a matéria.
Valor Econômico – Por Joice Bacelo – 22 de novembro de 2019