RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. PROVA PERICIAL. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. SOCIEDADE EM ATIVIDADE. ALTERAÇÃO DE PREMISSA FÁTICA. SÚMULA 7/STJ. GRUPO ECONÔMICO DE FATO. EXISTÊNCIA RECONHECIDA PELOS JUÍZOS DE PRIMEIRO E SEGUNDO GRAUS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. CONSOLIDAÇÃO SUBSTANCIAL OBRIGATÓRIA. CONFUSÃO PATRIMONIAL E DE GESTÃO. INTERDEPENDÊNCIA FINANCEIRA. DISFUNÇÃO SOCIETÁRIA. LITISCONSÓRCIO ATIVO. OBRIGATORIEDADE. SOCIEDADE QUE SE RECUSA A INTEGRAR O PROCESSO. ESPECIFICIDADES FÁTICAS QUE AUTORIZAM O INDEFERIMENTO DO PEDIDO RECUPERACIONAL. AUTONOMIA PATRIMONIAL. COMPORTAMENTO ABUSIVO. MANIPULAÇÃO DAS NORMAS DE REGÊNCIA. DESCABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO.
- Ação ajuizada em 20/6/2018. Recurso especial interposto em 30/6/2020. Autos conclusos ao Relator originário em 23/11/2021.
- O propósito recursal consiste em verificar: (i) se ficou configurada negativa de prestação jurisdicional e (ii) se é possível a inclusão de sociedade empresarial no polo ativo de ação de recuperação judicial em razão do reconhecimento da existência de grupo econômico de fato.
- Examinada a integralidade das questões devolvidas ao tribunal de origem e devidamente fundamentado o acórdão recorrido, sem vícios que o maculem, não há falar em negativa de prestação jurisdicional.
- Não há cerceamento de defesa nas hipóteses em que o julgador resolve a questão controvertida, de forma fundamentada, sem a produção da prova requerida pela parte, em virtude de considerar suficientes os elementos que integram os autos. Precedentes.
- A ausência de manifestação, pelo Tribunal de origem, acerca de questão alegada nas razões do recurso especial inviabiliza o enfrentamento da matéria pelo STJ.
- Assentado pelos juízos de primeiro e segundo graus, após detido exame dos elementos probatórios constantes dos autos, que a sociedade ECOSERV LTDA estava em atividade, não é possível a alteração de tal conclusão por esta Corte Superior, em razão do entendimento consagrado na Súmula 7/STJ.
- O reconhecimento da formação de grupo econômico de fato pelos julgadores de origem decorreu da constatação da existência de confusão patrimonial, laboral e societária entre as sociedades recorrentes e a ECOSERV LTDA. 8. A consolidação substancial de ativos e passivos de sociedades integrantes de um grupo empresarial pressupõe que haja confusão patrimonial e de gestão e dependência entre elas.
- Em decorrência da consolidação substancial, os ativos e os passivos de todos os devedores serão tratados como se pertencessem a um único devedor, havendo a apresentação de um plano de recuperação unitário pelas sociedades.
- Segundo entendimento doutrinário, a consolidação substancial poderá ser obrigatória sempre que for constatada disfunção societária, apurada a partir de quando for verificada confusão patrimonial entre sociedades integrantes do grupo de fato ou de direito.
- O acórdão recorrido assentou que a não participação da ECOSERV LTDA no processo de recuperação judicial do GRUPO DOLLY equivaleria a “autorizar uma escolha seletiva, pelo Grupo recuperando, das empresas a compor o polo ativo da recuperação em curso com o objetivo espúrio de se desvincular dos expressivos débitos tributários e trabalhistas acumulados pela empresa ‘Ecoserv'”.
- A Lei 11.101/05, em seu art. 69-J, somente anteviu a possibilidade de o Juiz autorizar a consolidação substancial na hipótese de as sociedades já figurarem no polo ativo da ação, em consolidação processual, silenciando a respeito de hipóteses em que se verificar a adoção de comportamento abusivo das recuperandas, como no caso dos autos.
- A imprescindibilidade de ativos e passivos de diferentes devedores, pertencentes a um mesmo grupo, terem de ser tratados de forma unificada para a adequada equalização dos interesses dos trabalhadores, da Fazenda Pública e dos demais credores impõe que seja alcançada uma solução guiada pelas peculiaridades do próprio processo recuperacional.
- O processo de recuperação judicial, que visa a preservação da atividade econômica, se desenvolve com o objetivo de que os interesses de todos os envolvidos sejam satisfeitos mediante concessões recíprocas. “Os credores são interessados, que, embora participando do processo a atuando diretamente na aprovação do plano, não figuram como parte adversa, já que não há nem mesmo litígio propriamente dito” (REsp 1.324.399/SP, DJe 10/3/2015).
- O entendimento do STJ aponta no sentido de que, em situações excepcionais, o Juiz está autorizado a determinar a inclusão de litisconsorte necessário no polo ativo da ação, sob pena de extinção do processo.
- No particular, (i) a situação fática delimitada pelos juízos de primeiro e segundo graus, que entenderam pela impossibilidade de se considerar o passivo e o ativo das recuperandas de forma isolada para o sucesso do procedimento recuperacional, (ii) a necessidade de preservação dos interesses da coletividade de trabalhadores, das Fazendas Públicas e dos demais credores, (iii) a ausência de previsão legal específica na LFRE acerca da questão controvertida, (iv) as vicissitudes processuais da ação de recuperação judicial e (v) o entendimento do STJ acerca do litisconsórcio ativo necessário constituem circunstâncias aptas a ensejar a determinação de inclusão da empresa ECOSERV LTDA no polo ativo da ação.
- Recurso especial parcialmente conhecido e não provido.
(REsp n. 2.001.535/SP, relator Ministro Humberto Martins, relatora para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27/8/2024, DJe de 3/9/2024.)