DIREITO PROCESSUAL CIVIL, TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. OFENSA AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE COMANDO NORMATIVO NOS ARTS. 111 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL E 13 DA LEI COMPLEMENTAR N. 128/2008 PARA INFIRMAR A MOTIVAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 284/STF. AJUIZAMENTO DE AÇÃO POPULAR PARA INVALIDAR DECISÃO DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS (CARF). ARTS. 1º E 2º DA LEI N. 4.717/1965, E 29, 42 E 45 DO DECRETO N. 70.235/1972. POSSIBILIDADE CONDICIONADA À DEMONSTRAÇÃO DE MANIFESTA ILEGALIDADE OU À INDICAÇÃO DE DESVIO OU ABUSO DE PODER. MERA DIVERGÊNCIA INTERPRETATIVA SOBRE O ALCANCE DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA NÃO DÁ AZO À ACTIO POPULARIS. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.
I – De acordo com o decidido pelo Plenário desta Corte, na sessão realizada em 9.3.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.
II – Ausente ofensa aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022, II, do estatuto processual, uma vez que a Corte de origem apreciou todas as questões relevantes apresentadas com fundamentos suficientes.
III – Revela-se incabível conhecer da suscitada contrariedade aos arts. 111 do Código Tributário Nacional, e 13 da Lei Complementar n. 128/2008, porquanto não possuem comando normativo capaz de infirmar os fundamentos do acórdão recorrido, incidindo, por analogia, a orientação contida na Súmula n. 284/STF.
IV – Concebida como mecanismo concretizador da soberania pelos arts.
5º, LXXIII, da Constituição da República, e 1º e 2º da Lei n. 4.717/1965, a ação popular constitui instrumento viabilizador do controle de condutas ilegítimas do Poder Público, não se prestando, de outra parte, à mera tutela patrimonial dos cofres estatais, à contraposição pura e simples do escorreito exercício da atividade administrativa, tampouco à defesa de interesses exclusivos do cidadão figurante no polo ativo, porquanto direito fundamental cujo exercício, embora empreendido a título individual, tem por objetivo a tutela de bens jurídicos transindividuais.
V – A fiscalização dos afazeres do Estado pela sociedade civil via ação popular convive harmonicamente com institutos igualmente consagradores do ideal de democracia participativa estampado no art. 1º, parágrafo único, da Constituição da República, a exemplo dos colegiados paritários compostos por membros do corpo social, os quais viabilizam a tutela popular da manifestação da vontade estatal e cujas conclusões hão de ser levadas em conta no exercício do controle jurisdicional, sob pena de tornar supérflua a atuação direta da sociedade civil na formação das decisões do Poder Público.
VI – Nos moldes dos arts. 25, II, 42, II e III, 43 e 45 do Decreto n. 70.235/1972, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, constitui órgão paritário de controle extrajudicial e democrático da ação estatal de instituir e cobrar tributos, razão pela qual suas decisões, ressalvadas circunstâncias de manifesta ilegalidade, de desvio ou abuso de poder, ou, ainda, quando contrárias a sedimentados precedentes jurisdicionais, não se sujeitam a invalidação judicial por mera divergência de juízo hermenêutico quanto ao alcance da legislação tributária, mormente nos casos de escrutínio de entendimento favorável aos contribuintes em contexto de disposições legislativas de conteúdo polissêmico e objeto de interpretações díspares.
VII – Hipótese na qual o Autor Popular, qualificado como Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, postula, de maneira reiterada e sem apontamento de quaisquer vícios, pela invalidação de acórdãos do CARF tão somente por discordar da tese levada em conta para a formação do convencimento do colegiado, traduzindo, por conseguinte, mero inconformismo relativamente à exegese sufragada pelas instâncias administrativas superiores ao qual juridicamente vinculado, circunstância, in casu, insuficiente à invalidação do ato impugnado.
VIII – Recurso Especial da Fundação Armando Alvares Penteado parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. Prejudicados os Recursos Especiais da Fazenda Nacional e do Autor Popular.
(REsp n. 1.608.161/RS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 6/8/2024, DJe de 9/8/2024.)