PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO ULTERIOR. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS. LEIS 7.787/89 E 8.212/91. COMPENSAÇÃO. ARTIGO 89, § 3º, DA LEI 8.212/91. LIMITAÇÕES INSTITUÍDAS PELAS LEIS 9.032/95 E 9.129/95. POSSIBILIDADE. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ARTIGOS 167, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CTN, E SÚMULA 188/STJ. APLICAÇÃO. SENTENÇA CONDENATÓRIA DO DIREITO À COMPENSAÇÃO DE INDÉBITO. REPETIÇÃO POR VIA DE PRECATÓRIO. POSSIBILIDADE.
- A inclusão de litisconsorte ativo facultativo, após a distribuição da ação judicial, configura desrespeito à garantia constitucional do Juiz Natural (artigo 5º, incisos XXXVII e LIII, da Constituição Federal de 1988), praxe que é coibida pela norma inserta no artigo 253, do CPC, segundo o qual as causas de qualquer natureza distribuir-se-ão por dependência quando, tendo sido extinto o processo, sem julgamento de mérito, for reiterado o pedido, ainda que em litisconsórcio com outros autores ou que sejam parcialmente alterados os réus da demanda (artigo 253, inciso II, do CPC, com a redação dada pela Lei 11.280/2006) (Precedentes do STJ: AgRg no MS 615/DF, Rel. Ministro Bueno de Souza, Corte Especial, julgado em 13.06.1991, DJ 16.03.1992; REsp 24.743/RJ, Rel. Ministro Edson Vidigal, Quinta Turma, julgado em 20.08.1998, DJ 14.09.1998; e REsp 931.535/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 25.10.2007, DJ 05.11.2007).
- A violação do princípio do juiz natural em virtude do ulterior ingresso de litisconsortes ativos facultativos, não atrai a incidência do artigo 113, § 2º, do CPC. Isto porque decorre da inobservância das regras de determinação de competência, e não em razão da incompetência do juízo, consoante se de depreende do seguinte excerto do voto-condutor do acórdão recorrido:
“Com efeito, o juízo não é absolutamente incompetente, tanto que, no caso de nova apresentação da ação (havendo uma nova distribuição e, não, uma redistribuição), a lide poderia vir a ser julgada pelo mesmo juízo, mas desta vez com a estrita observância do princípio do juiz natural, pelo emprego das devidas e inafastáveis regras de distribuição de feitos.”
- O litisconsórcio superveniente inadmitido impõe, quanto aos litisconsortes, a extinção do processo, porquanto o desmembramento e redistribuição dos autos implicaria em violação aos princípios da razoabilidade e da celeridade processuais, comprometendo o desenvolvimento regular da função jurisdicional e prejudicando o exercício da ação ou da defesa, e contrariando o escopo do parágrafo único, do artigo 46, do Codex Processual.
- As Leis 9.032, de 28 de abril de 1995, e 9.129, de 20 de novembro de 1995, promoveram alterações na Lei 8.212/91 (Lei de Organização da Seguridade Social – LOAS), cujo artigo 89, § 3º, passou, sucessivamente, a dispor:
“Art. 89. Somente poderá ser restituída ou compensada contribuição para a Seguridade Social arrecadada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) na hipótese de pagamento ou recolhimento indevido. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95) (…)
- 3º Em qualquer caso, a compensação não poderá ser superior a 25% (vinte e cinco por cento) do valor a ser recolhido em cada competência. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 28.4.95) (…)” “Art. 89. Somente poderá ser restituída ou compensada contribuição para a Seguridade Social arrecadada pelo Instituto Nacional do Seguro Social-INSS na hipótese de pagamento ou recolhimento indevido. (Redação dada pela Lei nº 9.129, de 20.11.1995) (…)
- 3º Em qualquer caso, a compensação não poderá ser superior a trinta por cento do valor a ser recolhido em cada competência.
(Redação dada pela Lei nº 9.129, de 20.11.1995) (…)” 5. A jurisprudência da Primeira Seção assentava que: declarada a inconstitucionalidade da contribuição previdenciária a cargo da empresa sobre os pagamentos a administradores, autônomos e empregados avulsos, os valores a esse título recolhidos anteriormente à edição das Leis 9.032/95 e 9.129/95, ao serem compensados, não estavam sujeitos às limitações percentuais por elas impostas, em face das regras de direito intertemporal (tempus regit actum) e do princípio constitucional do direito adquirido (Precedentes: EREsp 168.770/RS, Rel. Ministro Garcia Vieira, Primeira Seção, julgado em 29.02.2000, DJ 03.04.2000; EREsp 164.739/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, julgado em 08.11.2000, DJ 12.02.2001; EREsp 211.749/SC, Rel. Ministro Francisco Peçanha Martins, Primeira Seção, julgado em 08.11.2000, DJ 19.03.2001; EREsp 194.275/PR, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Primeira Seção, julgado em 18.12.2000, DJ 04.06.2001; EREsp 227.060/SC, Rel. Ministro Francisco Peçanha Martins, Rel. p/ Acórdão Ministro Milton Luiz Pereira, Primeira Seção, julgado em 27.02.2002, DJ 12.08.2002;
e EREsp 187.296/PR, Rel. Ministro Franciulli Netto, Primeira Seção, julgado em 23.10.2002, DJ 12.05.2003).
- A Primeira Seção, em 12.03.2003, no julgamento dos EREsp 189.052/SP, sedimentou o entendimento de que o direito à compensação de indébito tributário decorrente da declaração de inconstitucionalidade da exação, não se submete às limitações erigidas pelas Leis 9.032/95 e 9.129/95, porquanto imperativa, nesse caso, a restituição integral dos valores recolhidos indevidamente, sob pena de ofensa ao primado da supremacia da Constituição (publicado no DJ de 03.11.2003).
- Na oportunidade, restou assente que:
“Diante de uma situação de normalidade, ou seja, tendo em vista exação válida perante o ordenamento jurídico, a lei aplicável, em matéria de compensação tributária, será aquela vigente na data do encontro de créditos e débitos, pois neste momento é que surge efetivamente o direito à compensação, de acordo com os cânones traçados pelo Direito Privado a tal instituto, que devem ser respeitados pela lei tributária, ex vi do art. 110 do Código Tributário Nacional.
Diversa será, no entanto, a situação quando houver declaração de inconstitucionalidade do tributo, tendo em vista que tal declaração expunge do mundo jurídico a norma, que será considerada inexistente ab initio. Sua nulidade contamina, ab ovo, a exação por ela criada, que será considerada, a partir da declaração de inconstitucionalidade, devido aos seus efeitos erga omnes, como se nunca tivesse existido. O direito à restituição do indébito que emana deste ato de pagar tributo inexistente dar-se-á, na espécie, por meio de compensação tributária, não podendo, em hipótese alguma, ser limitado, sob pena de ofensa ao primado da supremacia da Constituição. E isso porque, o limite à compensação, seja de 25% ou 30%, torna parte do pagamento válido, concedendo, assim, eficácia parcial a lei nula de pleno direito.”
- A Cláusula de Plenário (artigo 97 de CF/1988) resta violada em face da jurisprudência do STJ que excepciona a aplicação das limitações à compensação introduzidas pelas Leis 9.032/95 e 9.129/95 em se tratando de pagamentos indevidos atinentes a contribuições sociais previdenciárias ulteriormente declaradas inconstitucionais em sede de controle concentrado, ratio essendi da presente afetação à Seção.
- Deveras, perfilho a tese de que, enquanto não declaradas inconstitucionais as Leis 9.032/95 e 9.129/95, em sede de controle difuso ou concentrado, sua observância é inafastável pelo Poder Judiciário, uma vez que a norma jurídica, enquanto não regularmente expurgada do ordenamento, nele permanece válida, razão pela qual a compensação do indébito tributário, ainda que decorrente da declaração de inconstitucionalidade da exação, submete-se às limitações erigidas pelos diplomas legais que regem a compensação tributária.
- A restituição mediante repetição não se subsume às limitações, diferentemente da compensação tributária, instituto jurídico informado pelo princípio da indisponibilidade dos bens públicos, que carece de lei autorizativa que, legitimamente, pode condicioná-la, sendo certo que é facultado ao contribuinte submeter-se às regras impostas pelo legislador ordinário para fazer jus à compensação ou, então, pleitear a repetição do indébito tributário, que não observa qualquer condicionamento, salvo o recebimento por precatório.
- A declaração de inconstitucionalidade da norma que veicula a regra-matriz de incidência tributária, fundamento de validade da norma individual e concreta constitutiva do crédito tributário (lançamento tributário ou ato de formalização do próprio contribuinte), não retira a natureza tributária da importância recolhida a título de tributo e que é objeto da devolução pleiteada, consoante doutrina clássica:
“A importância recolhida a título de tributo pode ser indevida, tanto por exceder ao montante da dívida real, quanto por inexistir dever jurídico de índole tributária. Surge, então, a controvertida figura do tributo indevido, que muitos entendem não ser verdadeiramente tributo, correspondendo antes a mera prestação de fato. Não pensamos assim. As quantias exigidas pelo Estado, no exercício de sua função impositiva, ou espontaneamente pagas pelo administrado, na convicção de solver um débito fiscal, têm a fisionomia própria das entidades tributárias, encaixando-se bem na definição do art. 3º, do Código Tributário Nacional. A contingência de virem a ser devolvidas pelo Poder Público não as descaracteriza como tributo e para isso é que existem os sucessivos controles de legalidade que a Administração exerce e dos quais também participa o sujeito passivo, tomando a iniciativa ao supor descabido o que lhe foi cobrado, ou postulando a devolução daquilo que pagara indebitamente. Não sendo suficiente o procedimento administrativo que para esse fim se instale, terá o interessado acesso ao Poder Judiciário, onde poderá deduzir, com os recursos inerentes ao processo judicial, todos os argumentos e provas que dêem substância aos seus direitos” (Paulo de Barros Carvalho, in Curso de Direito Tributário, Ed. Saraiva, 16ª ed., 2004, págs. 455/456) 12. O efeito ex tunc do controle concentrado de constitucionalidade, bem como a presunção de validade constitucional da norma jurídica que ensejou a tributação reveste de regularidade o pagamento efetuado no período em que ainda não expurgada do ordenamento jurídico.
- A inconstitucionalidade da norma jurídica que veicula a regra matriz de incidência tributária, uma vez declarada, implica o “fato jurídico ensejador da configuração do débito do fisco” qual o pagamento indevido do tributo, sendo certo que o contribuinte pode optar: (i) pela compensação tributária, sujeitando-se, contudo, às condições estabelecidas na lei autorizativa, ou (ii) pela repetição do indébito (sem quaisquer restrições, somente as de ordem processual).
- A compensação tributária, posto diversa da figura de direito privado que extingue compulsoriamente a obrigação, é condicionada ao discricionarismo do Tesouro Público: ?… o sujeito passivo só poderá contrapor seu crédito ao crédito tributário, como direito subjetivo seu, nas condições e sob as garantias que a lei fixar.
Fora disso, quando a lei o permite, se aceitar as condições específicas que a autoridade investida de poder discricionário, nos limites legais, para fixá-las, estipular, julgando da conveniência e da oportunidade de aceitar ou recusar o encontro dos débitos?
(Aliomar Baleeiro, in Direito Tributário Brasileiro, 11ª ed., Ed.
Forense, Rio de Janeiro, 2000, pág. 898).
- O artigo 170, do CTN, legitima o ente legiferante a autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do contribuinte, estabelecendo, para tanto, condições e garantias para seu exercício, donde se dessume a higidez da estipulação legal de limites para sua realização.
- A compensação tributária, por seu turno, configura renúncia fiscal, cuja concessão, afastada dos lindes traçados pelo legislador, compromete o equilíbrio orçamentário do Estado, bem como o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário, custeado, entre outros, pelas contribuições sociais em tela.
- A Súmula Vinculante nº 10, do Supremo Tribunal Federal, assentou o entendimento de que: “Viola a cláusula de reserva de plenário (cf, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”.
- A compensação tributária e os limites percentuais erigidos nas Leis 9.032/95 e 9.129/95 mantém-se, desta sorte, hígida, sendo certo que a figura tributária extintiva deve obedecer o marco temporal da “data do encontro dos créditos e débitos”, e não do “ajuizamento da ação”, termo utilizado apenas nas hipóteses em que ausente o prequestionamento da legislação pertinente, ante o requisito específico do recurso especial.
- A natureza tributária das contribuições previdenciárias, bem como do indébito, mercê de decorrente da declaração de inconstitucionalidade da exação, impõe a incidência do parágrafo único, do artigo 167, do CTN, e da Súmula 188/STJ, segundo a qual “os juros moratórios, na repetição do indébito tributário, são devidos a partir do trânsito em julgado da sentença”.
- A obtenção de decisão judicial favorável trânsita em julgado, proferida em ação condenatória, confere ao contribuinte a possibilidade de executar o título judicial, acaso pretenda o recebimento do crédito por via do precatório, ou proceder à compensação tributária.
- A opção entre o recebimento do crédito por precatório cabe ao contribuinte, haja vista que constituem, ambas as modalidades, formas de execução do julgado colocadas à disposição da parte quando procedente a ação (Precedentes do STJ: REsp 814.142/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 07.08.2008, DJe 22.08.2008; REsp 891.758/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 24.06.2008, DJe 13.08.2008; AgRg no AgRg no REsp 946.965/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 13.05.2008, DJe 28.05.2008; AgRg no Ag 929.194/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 13.05.2008, DJe 16.06.2008, REsp 937.632/SC, Rel. Ministro Carlos Fernando Mathias (Juiz Convocado do TRF 1ª Região), Segunda Turma, julgado em 15.04.2008, DJe 02.05.2008; REsp 868.162/SP, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 06.03.2008, DJe 10.04.2008; e REsp 798.166/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11.09.2007, DJ 22.10.2007).
- Recurso especial da Viação Nossa Senhora de Lourdes S/A e Transportes Paranapuan Ltda. desprovido, mantendo-se a exclusão dos litisconsortes cujo ingresso restou pleiteado após a distribuição da ação.
- Recurso especial de J. Farah Móveis e Decorações Ltda. e Outras desprovido, ante a inaplicabilidade do artigo 113, § 2º, do CPC, à espécie, e tendo em vista a higidez das limitações à compensação tributária erigidas pela Leis 9.032/95 e 9.129/95.
- Recurso especial da Sociedade Educacional São Pedro de Alcântara parcialmente provido, apenas para reconhecer o direito de opção do recebimento do crédito, quer pela compensação (caso a empresa se coadune com as exigências/limitações legais), quer pela repetição do indébito tributário.
(REsp n. 796.064/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/11/2008.)