A presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu os efeitos de uma liminar concedida pela justiça paulista à Intercement Brasil. A liminar facilitava o adiamento do pagamento de ICMS durante a pandemia de covid-19 ao afastar multas, permitir o ingresso em parcelamento e a obtenção de certidão de regularidade. A empresa vai recorrer.
A decisão é específica para o caso concreto, mas pode ser um precedente para os Estados contestarem liminares semelhantes. Além disso, esta é a primeira manifestação da Corte Suprema da qual se tem notícias sobre liminares do tipo.
O ministro Dias Toffoli suspendeu os efeitos da decisão paulista até o julgamento final (trânsito em julgado) do mandado de segurança. “Não cabe ao Poder Judiciário decidir quem deve ou não pagar impostos, ou mesmo quais políticas públicas devem ser adotadas, substituindo-se aos gestores responsáveis pela condução dos destinos do Estado, neste momento”, afirma Toffoli na decisão.
No pedido de suspensão de segurança (SS nº 5363), o Estado de São Paulo contesta decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que impôs ao governo deixar de aplicar penalidades tributárias como recusa à renovação de certidão de regularidade e inscrição em dívida ativa. O TJ-SP também havia assegurado a possibilidade de inclusão dos valores em parcelamentos e suspensão da exigibilidade de eventuais multas.
Na ação, o Estado alega que a decisão permite, em detrimento da receita pública, que a empresa deixe de responder pelo ônus de eventual atraso no pagamento de tributos, podendo obter certidões sem o efeito de positiva, constituindo um estímulo à inadimplência.
“De uma penada, foi completamente subvertida a ordem administrativa, no tocante ao regime fiscal vigente no Estado de São Paulo, em relação à empresa impetrante, medida essa que pode ser potencialmente estendida a milhares de outras empresas existentes naquele estado”, afirmou Toffoli na decisão. A execução da decisão pode acarretar grave lesão à ordem público-administrativa e econômica no âmbito do Estado de São Paulo, segundo Toffoli.
“Exatamente em função da gravidade da situação, exige-se a tomada de medidas coordenadas e voltadas ao bem comum, não se podendo privilegiar determinado segmento da atividade econômica em detrimento de outro, ou mesmo do próprio Estado, a quem incumbe, precipuamente, combater os nefastos efeitos decorrentes dessa pandemia”, afirma.
No processo, o ministro Dias Toffoli ainda afirma que a decisão obtida pela empresa no TJ-SP apresenta grave risco de efeito multiplicador, o que já seria fundamento suficiente da grave repercussão da decisão sobre a ordem e a economia públicas.
Para o ministro, a decisão judicial não poderia substituir o critério de conveniência e oportunidade que rege os atos da administração pública, especialmente em tempos de calamidade. Ainda segundo o presidente do STF, a decisão não poderia ser tomada de forma isolada, sem análise de suas consequências para o orçamento estatal.
O advogado que representa a empresa no processo, Luiz Gustavo Bichara, sócio do Bichara Advogados, pretende recorrer. Para ele, é curioso que o Estado vá ao STF cassar essa decisão quando ele mesmo, por causa da pandemia, foi à Corte buscar proteção para não efetuar seus pagamentos com a União. “É uma enorme incoerência”, diz.
Fonte: Valor Econômico – 22 de abril de 2020