ARE 1504666
Relator(a): Min. EDSON FACHIN
Julgamento: 27/08/2024
Publicação: 29/08/2024
Decisão
DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, assim ementado (eDOC 3, p. 5): “CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DESEGURANÇA. LIMITAÇÃO À ISENÇÃO DE IPI. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO PORPORTADOR DE DEFICIÊNCIA. MEDIDA PROVISÓRIA 1.034/2021. CABIMENTO DO”WRIT”. BENEFÍCIO FISCAL. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL.INAPLICABILIDADE. SEGURANÇA DENEGADA. APELAÇÃO DESPROVIDA.AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. (…)” No recurso extraordinário, interposto com base no art. 102, III, a, do permissivo constitucional, aponta-se a violação ao art. 150, III, c, da Constituição Federal, para requerer, quanto ao mérito (eDOC 4, p. 21): “c) Em sede de mérito, que haja a reconhecimento, por parte dessa Suprema Corte, quanto à violação ao interstício nonagesimal a partir da entrada em vigor da Medida Provisória nº 1.034/21, esta que impossibilitou que todos os contribuintes portadores de deficiência (PCD) pudessem ter adquirido os seus esperados automóveis com isenção de IPI, ante o limite imposto de R$ 70.000,00 (setenta mil reais) e sua vigência inconstitucional, enquadrando-se, nesse contexto, o Sr.ª Érika Maria Vieira Cavalcanti, ora recorrente; d) Nos moldes da alínea anterior, que haja o provimento desse pleito recursal para reconhecer, igualmente, a renovação do hiato nonagesimal quando da conversão da MP na Lei Federal nº 14.183/21 – em homenagem ao Tema de Repercussão Geral nº 278 do STF –, uma vez que o novel diploma normativo alterou substancialmente o texto positivado na MP combatida; f) A confirmação de que a recorrente, enquanto no período suscitado, possuía direito adquirido à compra do automotor sem a incidência da legislação aventada, posto que a lei de regência deve ser aquela oriunda do protocolo junto ao Órgão Administrativo competente, brindando-se a Súmula nº 544 do Supremo Tribunal Federal; g) Por fim, a confirmação de todos os pedidos acima delineados, ocasionando no deferimento integral deste Recurso Extraordinário, com vistas a reconhecer que, de fato, houve mácula ao interstício nonagesimal, revertendo-se a decisão prolatada pelo TRF-5, garantindo-se à recorrente o direito de comprar o seu veículo automotor com total isenção tributária;” É o relatório. Decido. A irresignação merece prosperar. De plano, verifica-se que o acórdão recorrido está em dissonância com a atual jurisprudência desta Corte, no sentido de que a revogação ou alteração de benefícios fiscais, quando acarretam majoração indireta de tributos, devem observar os respectivos princípios de anterioridade tributária. Nesse sentido, destaco os seguintes julgados: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO TRIBUTÁRIO. IPI. ISENÇÃO. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR POR PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. LIMITAÇÕES. MEDIDA PROVISÓRIA 1.034/2021. ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. BENEFÍCIO FISCAL. ALTERAÇÃO OU REVOGAÇÃO. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. SUJEIÇÃO AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA. PRECEDENTES. ARTIGO 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO. VIOLAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MANIFESTO INTUITO PROTELATÓRIO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO, COM IMPOSIÇÃO DE MULTA DE 5% (CINCO POR CENTO) DO VALOR ATUALIZADO DA CAUSA, NOS TERMOS DO ARTIGO 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, CASO SEJA UNÂNIME A VOTAÇÃO.” (RE 1.402.188-AgR, de relatoria do Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 1.12.2022) “AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. ICMS. CRÉDITO. BENEFÍCIO FISCAL. ALTERAÇÃO OU REVOGAÇÃO. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. SUJEIÇÃO AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 85, § 11, DO CPC/2015. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A redução ou supressão de benefícios ou incentivos fiscais que acarretem majoração indireta de tributos devem observar o princípio da anterioridade tributária, nos moldes das regras aplicáveis à instituição ou majoração dos respectivos tributos (RE 564.225-AgR-EDv-ED, Plenário, Redator do acórdão Min. Dias Toffoli, DJe de 16/12/2020). 2. Agravo interno desprovido. 3. Por se tratar de mandado de segurança, não há majoração de honorários advocatícios (Súmula 512 do STF).” (ARE 951.982-AgR, de relatoria do Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 17.10.2022) “Agravo regimental em recurso extraordinário. Tributário. IPI. Benefício fiscal de isenção. Lei nº 8.989/95. Alterações promovidas pela MP nº 1.034/21. Restrição. Majoração indireta de tributos. Ocorrência. Observância do princípio da anterioridade nonagesimal. Necessidade. 1. A restrição do benefício fiscal de isenção de IPI na aquisição de veículos por portadores de necessidades especiais deve observar a anterioridade nonagesimal de que trata o art. 150, inciso III, alínea c, da Constituição Federal. Precedentes. 2. Agravo regimental ao qual se nega provimento. 3. Sem majoração da verba honorária, tendo em vista tratar-se de mandado de segurança, nos termos da Súmula nº 512/STF.” (RE 1.384.694-AgR, de relatoria do Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe 25.10.2022) “AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REVOGAÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL POR DECRETO ESTADUAL. MAJORAÇÃO INDIRETA DE CARGA TRIBUTÁRIA. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE GERAL E NONAGESIMAL. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM ENTENDIMENTO FIRMADO PELO PLENÁRIO DO SUPREMO NO JULGAMENTO DA ADI 2.325 MC. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. ÓTICA CONSOLIDADA NO TEMA N. 856 DA REPERCUSSÃO GERAL. 1. O acórdão recorrido está em conformidade com o julgamento da ADI 2.325 MC, ministro Marco Aurélio, oportunidade em que o Plenário do Supremo assentou o dever de obediência aos princípios da anterioridade geral e da noventena nas hipóteses em que a revogação de benefício fiscal acarrete aumento indireto de tributo. 2. Não há falar em ofensa à cláusula de reserva de Plenário, uma vez que o Tribunal local apenas decidiu – com arrimo na jurisprudência desta Corte – pela observância do decreto estadual impugnado aos princípios da anterioridade geral e nonagesimal (entendimento consolidado no ARE 914.045, ministro Edson Fachin, Tema n. 856/RG). 3. Agravo interno desprovido.” (ARE 1.339.119-AgR, de relatoria do Min. Nunes Marques, Segunda Turma, DJe 22.9.2022) “IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS DECRETOS Nº 39.596 E Nº 39.697, DE 1999, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL REVOGAÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DEVER DE OBSERVÂNCIA PRECEDENTES. Promovido aumento indireto do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços ICMS por meio da revogação de benefício fiscal, surge o dever de observância ao princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, constante das alíneas b e c do inciso III do artigo 150, da Carta. Precedente Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.325/DF, de minha relatoria, julgada em 23 de setembro de 2004. MULTA AGRAVO ARTIGO 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Surgindo do exame do agravo o caráter manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do artigo 557 do Código de Processo Civil.” (RE 564.225-AgR, de relatoria do Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe 18.11.2017) Ante o exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para aplicar a anterioridade nonagesimal ao presente caso, nos termos do art. 21, §1º, do RISTF. Sem honorários, por se tratar de mandado de segurança (Súmula 512/STF e art. 25 da Lei 12.016/2009). Custas judiciais ex lege. Publique-se. Brasília, 27 de agosto de 2024. Ministro EDSON FACHIN Relator