Discussão envolve a prestação de serviços por pessoas jurídicas.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é constitucional a previsão da Lei nº 11.196, de 2005, que concede incentivos fiscais à prestação de serviços intelectuais por pessoas jurídicas. Com o entendimento, artistas, atletas, médicos, publicitários e outros profissionais liberais que abrem empresas para receber pagamentos – por cessão de direito de imagem e palestras, por exemplo – conseguiram um precedente relevante.
Já havia maioria de votos no Supremo desde junho, mas o julgamento no plenário virtual só terminou na última sexta-feira, com o voto do ministro Dias Toffoli – somando oito votos a favor e dois contra. O ministro Luís Roberto Barroso declarou suspeição e não votará.
Muitos nomes conhecidos já enfrentaram ou ainda lidam com processos sobre o tema. Entre eles, por exemplo, os jogadores de futebol Neymar Jr. e Alexandre Pato, o ex-técnico da seleção brasileira Felipão, o tenista Gustavo Kuerten e o apresentador de televisão Carlos Massa (Ratinho).
Nas autuações, a Receita Federal alega que os valores recebidos pelas empresas abertas por esses profissionais seriam rendimentos salariais “disfarçados”. A fiscalização alega vantagem econômica ilegal pela tributação menor, de 15% do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) sobre o lucro presumido. Nas autuações fiscais, cobra 27,5% de Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), além de contribuições previdenciárias, sobre tudo o que entra no caixa das empresas.
O artigo 129 da Lei nº 11.196, de 2005, autoriza a abertura de empresas por pessoa física para a prestação de serviços intelectuais, culturais, artísticos ou científicos. O dispositivo só ressalva que, se constatado desvio de finalidade da atividade empresarial ou confusão patrimonial entre os bens do profissional e da empresa, é permitida a desconsideração da pessoa jurídica. Nesse caso, os bens pessoais dos sócios podem ser penhorados para quitar débitos.
Segundo a relatora da ação, ministra Cármen Lúcia, o artigo 129 é constitucional, especialmente quando se pensa que a Constituição trata a liberdade de iniciativa como fundamento. A ministra citou decisão de 2018 em que o Supremo autorizou a terceirização com a mesma perspectiva de liberdade de organização da atividade econômica empresarial.
“A regra jurídica válida do modelo de estabelecimento de vínculo jurídico estabelecido entre prestador e tomador de serviços deve pautar-se pela mínima interferência na liberdade econômica constitucionalmente assegurada e revestir-se e grau de certeza para assegurar o equilíbrio nas relações econômicas e empresariais”, afirma no voto.
O ministro Dias Toffoli seguiu a relatora, encerrando o julgamento na sexta-feira. Foi o mesmo entendimento adotado pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Celso de Melo e Luiz Fux. Ficaram vencidos Marco Aurélio Mello e Rosa Weber.
Para o advogado Tiago Conde, sócio da área tributária do Sacha Calmon Misabel Derzi, o artigo 129 ser considerado constitucional é relevante para manutenção da economia, principalmente no cenário atual. Segundo o advogado, não há prejuízo ao Fisco já que eventual conduta de maquiagem de contrato poderá ser objeto de questionamento judicial.
Valor Econômico – Por Beatriz Olivon, 14 de dezembro de 2020