RESTITUIÇÃO. PENA DE PERDIMENTO. CANCELAMENTO DA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO (DI). O direito à restituição dos tributos pelo sujeito passivo independe de cancelamento, de ofício ou a pedido, da Declaração de Importação. A aplicação da pena de perdimento a uma mercadoria faz surgir o direito à restituição, pelo contribuinte, dos tributos recolhidos por ocasião do registro da Declaração de Importação no SISCOMEX. Não é autorizado o cancelamento da Declaração de Importação quando se tratar de mercadoria objeto de pena de perdimento. DOU 24/12/2021.
Dispositivos Legais: Decreto-lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, art. 1º, §4º, inciso III; Lei nº 5.172 de 25 de outubro de 1966, art. 165, inciso I; Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, art. 71, inciso III; IN SRF nº 680, de 2 de outubro de 2006, art. 63, §3º, inciso II; IN RFB nº 1.717, de 17 de julho de 2017, arts. 28 e 29.
Relatório
A Divisão de Tributação da 8ª Região Fiscal formula consulta a respeito da legislação tributária e aduaneira que versa sobre pena de perdimento e restituição de tributos recolhidos no curso do despacho de importação. Informa ainda que essa consulta originou-se a partir de questionamento encaminhado pela Delegacia da Receita Federal em São José do Rio Preto, SP.
2. Aduz que o inciso III do art. 71 do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009 (Regulamento Aduaneiro), estabelece a não incidência do imposto de importação sobre mercadoria estrangeira que tenha sido objeto de pena de perdimento.
3. Argumenta, no entanto, que o recolhimento dos tributos no curso do despacho aduaneiro ocorre de forma automática no SISCOMEX, a partir do registro da Declaração de Importação (DI). E que, posteriormente, caso seja constatada irregularidade na importação que implique penalidade de perdimento, conforme o disposto na legislação vigente, a situação passa a ser caso de não incidência de tributos, no entender da consulente, à luz do inciso III do art. 71 do Regulamento Aduaneiro supracitado.
4. Destaca ainda que, no seu entender, a restituição desses tributos, conforme o disposto nos arts. 28 e 29 da IN RFB nº 1.717, de 17 de julho de 2017, só podem ser restituídos a partir do cancelamento da DI no sistema. Por outro lado, o inciso II do §3º do art. 63 da IN SRF nº 680, de 2 de outubro de 2006, determina taxativamente a impossibilidade de cancelamento da DI em caso de aplicação de pena de perdimento sobre uma mercadoria.
5. A consulente cita ainda o Ato Declaratório PGFN nº 8, de 2018, autorizando a dispensa de apresentação de contestação e de interposição de recursos, bem como a desistência dos já interpostos, nas ações judiciais fundadas no entendimento de que não incidem os tributos na importação quando aplicada a pena de perdimento à mercadoria estrangeira.
6. Diante destes argumentos, a interessada formula os seguintes questionamentos:
1 Qual a interpretação que deve ser dada ao inciso II, do §3º, do art. 63 da IN SRF nº 680, de 2006, uma vez que o Ato Declaratório PGFN nº 8, de 2018, dispensa de contestação e de interposição de recursos nas ações judiciais fundadas no entendimento de que não incidem o imposto de importação quando aplicada a pena de perdimento à mercadoria estrangeira?
2 É vedada a restituição dos tributos pagos por ocasião do registro da Declaração de Importação quando a respectiva mercadoria for objeto de pena de perdimento, ainda que o inciso III, do art. 71 do Decreto nº 6.759, de 2009, estipule que tal fato é caso de não incidência tributária?
3 Não sendo vedada a restituição dos tributos pagos por ocasião do registro da Declaração de Importação quando a respectiva mercadoria for objeto de pena de perdimento, qual o procedimento que deve ser seguido para proceder à restituição, uma vez que o inciso II do §3º do art. 63 da IN SRF nº 680, de 2006, veda o cancelamento da Di relativa à mercadoria que tenha sido objeto da pena de perdimento
7. Como proposta de solução às questões postuladas, a consulente declara o seguinte entendimento, transcrito a seguir:
Por todo o exposto acima, concluiu esta Disit que:
a) a interpretação que se deve dar ao inciso II, do § 3º, do artigo 63, da IN SRF nº 680/2006, é no sentido da impossibilidade de cancelamento da DI, enquanto pender o processo de perdimento e não tiver sido aplicada essa penalidade;
b) uma vez que tenha sido iniciado o despacho de importação, com o registro da DI, e a mercadoria seja, posteriormente, objeto da pena de perdimento, caberá a restituição dos tributos recolhidos, uma vez que fica caracterizada a não incidência tributária; e
c) em tais casos, para que seja possível proceder a restituição dos tributos recolhidos pelo contribuinte na importação, o chefe da unidade da RFB, mediante ato justificado, nos termos do §6º, do art. 63, da IN SRF nº 680, de 2006, deverá cancelar, de ofício, as DI cujas mercadorias estrangeiras foram objeto da pena de perdimento, no curso do despacho de importação.
Fundamentos
8. A respeito do objeto da consulta interna, analisam-se a seguir os argumentos apresentados pela consulente, para, em seguida, responder aos questionamentos propostos.
9. Conforme apontado pela interessada, o inciso III do §4º do art. 1º do Decreto-lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, cujo teor foi reproduzido no inciso III do art. 71 do Regulamento Aduaneiro, estabelece, de forma bem clara, que o imposto de importação não incide sobre mercadorias estrangeiras que tenham sido objeto de pena de perdimento, exceto nas hipóteses nas quais elas tenham sido consumidas, revendidas ou não sejam localizadas.
10. Caso essa hipótese (pena de perdimento) ocorra, o contribuinte tem direito à restituição do tributo previamente recolhido por ocasião do registro da DI no Siscomex, com base no que dispõe o art. 165, inciso I, do Código Tributário Nacional – CTN (publicado pela Lei nº 5.172 de 25 de outubro de 1966), que trata das hipóteses de restituição em caso de pagamento espontâneo, posteriormente considerado indevido ou a maior.
11. Entretanto, equivoca-se a consulente ao fazer a interpretação dos arts. 28 e 29 da IN RFB nº 1.717, de 2017. Os dispositivos mencionados em momento algum fazem vinculação obrigatória entre o direito creditório do contribuinte e o cancelamento da respectiva DI. Tratam apenas da possibilidade de restituição decorrente de cancelamento ou de retificação de uma declaração de importação.
12. Transcreve-se abaixo os dispositivos supramencionados, in verbis:
Art. 28. Os valores recolhidos a título de tributo administrado pela RFB, por ocasião do registro da DI, poderão ser restituídos ao importador, caso se tornem indevidos em virtude de cancelamento ou retificação de DI.
Art. 29. A restituição dos valores a que se refere o art. 28 será requerida por meio do formulário Pedido de Restituição de Direito Creditório Decorrente de Cancelamento ou de Retificação de Declaração de Importação, constante do Anexo II desta Instrução Normativa.
13. Note-se que a hipótese prescrita no caput do art. 28 demonstra um sentido de possibilidade, um consectário lógico, caso aconteça uma determinada situação hipotética. Não determinou o legislador infra legal que somente será devida a restituição caso se promova o cancelamento ou retificação da DI. Apenas assegurou a restituição, caso se tornem indevidos os tributos, em virtude de tal cancelamento ou retificação.
14. A seu turno, dispõe a IN SRF nº 680, de 2006, acerca das hipóteses de cancelamento de DI:
Art. 63. O cancelamento de DI poderá ser autorizado pelo chefe do setor responsável pelo despacho aduaneiro com base em requerimento fundamentado do importador, por meio de função própria, no Siscomex, quando:
(…)
§ 3º Não será autorizado o cancelamento de declaração, quando:
I – houver indícios de infração aduaneira, enquanto não for concluída a respectiva apuração;
II – se tratar de mercadoria objeto de pena de perdimento.
15. Percebe-se que as hipóteses nas quais é permitido o cancelamento da DI, desde que autorizado pelo chefe da unidade, estão elencadas pelo art. 63 da IN SRF nº 680, de 2006. Nesses casos, tendo havido pagamento dos tributos devidos na operação, estes poderão ser restituídos ao contribuinte, mediante requerimento próprio, em consonância com o disposto nos arts. 28 e 29 da IN RFB nº 1.717, de 2017.
16. No tocante à mercadoria que tenha sido objeto de pena de perdimento, no §3º, inciso II do mesmo artigo consta uma clara proibição ao cancelamento da DI para este caso. Assim, seria impossível harmonizar e integrar o disposto no art. 63 da IN RFB nº 680, de 2006, com o art. 28 da IN RFB nº 1.717, de 2017, se fosse considerado o entendimento formulado pela consulente, que somente seria autorizada a restituição de tributos em função do cancelamento da DI, mesmo aquelas, cujas mercadorias tivessem sido objeto de pena de perdimento.
17. Para harmonizar a interpretação das normas, é preciso compreender o sentido trazido pelo disposto no art. 28 da IN RFB nº 1.717, de 2017, bem como saber que o direito creditório do contribuinte advém de mandamento legal, a saber, do art. 1º, §4º, inciso III do Decreto-lei nº 37, de 1966, combinado com o art. 165, inciso I, do Código Tributário Nacional.
18. É nesse sentido que se deve interpretar o Ato Declaratório PGFN nº 8, de 18 de junho de 2018. Tendo a lei estabelecido claramente que a ocorrência da penalidade de perdimento provoca a não incidência dos tributos aduaneiros sobre a operação de importação, indiscutível é, pois, que o contribuinte que efetuou o recolhimento antecipado dos valores por ocasião do registro da DI no Siscomex tem direito subjetivo à repetição do indébito, por se tratar de pagamento indevido, ou recolhido a maior, conforme o disposto no art. 165, inciso I do CTN.
19. Dessa forma, quanto ao primeiro questionamento formulado pela consulente, pode-se dizer que a interpretação a ser dada ao inciso II do §3º do art. 63 da IN SRF nº 680, de 2006, é pela impossibilidade de cancelamento da DI, quando à mercadoria for aplicada a pena de perdimento, visto que essa norma em nada interfere no direito creditório do contribuinte, nem colide com o entendimento expresso através do Ato Declaratório PGFN nº 8, de 2018.
20. Quanto ao segundo questionamento formulado pela interessada, com base no disposto no art. 1º, §4º, inciso III do Decreto-lei nº 37, de 1966, combinado com o art. 165, I do CTN, não é vedada a restituição dos tributos pagos por ocasião do registro da DI de mercadoria que tenha sido objeto de pena de perdimento. Ao contrário, é um direito do contribuinte reaver o indébito, conforme reconhece o Ato Declaratório PGFN nº 8, de 2018.
21. Em relação ao terceiro questionamento não se admite a consulta, já que nele a consulente não apresenta dúvida de interpretação da legislação, contrariando a finalidade a que se presta o processo de consulta interna, nos termos do art. 6º, parágrafo 1º, inciso III da Ordem de Serviço Cosit nº 1, de 24 de setembro de 2019.
22. Ao questionar sobre o procedimento que deve ser seguido para proceder à restituição, a consulente tão somente pretende discutir a respeito de questões procedimentais, e não sobre matéria que caiba conhecer e analisar em processo de consulta sobre interpretação da legislação.
23. Sobre este ponto, cabe apenas esclarecer que o procedimento de restituição aqui tratado não difere em nada do procedimento comumente aplicável no âmbito da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, obedecidas as normas legais e infra legais que regem o assunto, já mencionadas: Decreto-lei nº 37, de 1966, Decreto nº 6.759, de 2009, IN SRF nº 680, de 2006 e, em especial, IN RFB nº 1.717, de 2017, que estabelece normas sobre restituição, compensação, ressarcimento e reembolso.
Conclusão
24. Diante do exposto, conclui-se que:
O direito à restituição dos tributos pelo sujeito passivo independe de cancelamento de ofício ou a pedido da DI.
A aplicação da pena de perdimento a uma mercadoria faz surgir direito a restituição, pelo contribuinte, dos tributos recolhidos por ocasião do registro da DI no SISCOMEX.
Não é autorizado o cancelamento da declaração quando se tratar de mercadoria objeto de pena de perdimento.
É inadmissível a consulta na parte que não atende aos requisitos normativos exigidos, trazendo questionamentos sem a correta identificação do(s) dispositivo(s) da legislação sobre cuja aplicação haja dúvida.