O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve decisão que garantiu imunidade de ISS à Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), que reúne 12 mil médicos associados. Ela foi considerada entidade sem fins lucrativos ligada à educação, por desenvolver estudos na área de ciência. Da decisão não cabe mais recurso.
A Constituição de 1988 assegura, no artigo 150, inciso VI, alínea c, a imunidade de impostos a “instituições de educação” sem fins lucrativos. Porém, a Receita Federal entende como educacionais apenas as entidades registradas e supervisionadas pelo Ministério da Educação. Ou seja, escolas, colégios, faculdades e universidades sem fins lucrativos.
No processo, contudo, o advogado da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Paulo Roberto Andrade, do Fialho Salles Advogados, sustentou, a partir de uma interpretação sistemática da Constituição, que ciência é educação, e, portanto, a entidade teria direito à imunidade.
A ação foi ajuizada contra a Prefeitura de São Paulo em 2007. Em primeira instância, a entidade teve o pedido negado. Recorreu, então, ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que reformou a decisão. Em 2016, a 14ª Câmara de Direito Público foi unânime ao decidir pela imunidade de ISS.
Na decisão, o relator, desembargador João Alberto Pezarini, destacou que a Sociedade Brasileira de Cardiologia é uma instituição sem fins lucrativos, segundo seu estatuto, e que caberia ao município apresentar provas contrárias, que modificassem essa circunstância.
Além disso, o desembargador citou precedente do próprio TJ-SP que reconheceu a imunidade de IPTU e ITBI para a mesma entidade ao considerar a índole educacional em sentido amplo. Com a derrota, o município de São Paulo levou a questão do ISS ao STF.
O ministro Luís Roberto Barroso, porém, não chegou a enfrentar o mérito, por envolver reexame de provas, o que é vedado pela Súmula nº 279 do Supremo (RE no AgRg 1.150.987).
De acordo com o advogado Paulo Roberto Andrade, prevaleceu no Judiciário uma concepção mais generosa do termo “educação” para fins de imunidade. “Não é necessário ter registro no Ministério da Educação para usufruí-la. Basta ter como finalidade a difusão de conhecimentos socialmente úteis de uma forma geral, não necessariamente curriculares”, afirma.
A Sociedade Brasileira de Cardiologia também obteve entendimento favorável à imunidade de ISS no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), em processos contra da capital fluminense. “Todas essas ações foram julgadas procedentes nos respectivos tribunais. E as do Rio estão próximas do mesmo desfecho no STF”, afirma Andrade.
O Supremo, segundo o advogado, nunca reconheceu repercussão geral sobre o assunto. Nas poucas vezes em que enfrentou o tema, acrescenta, entendeu ora favoravelmente aos contribuintes (RMS nº 24.283), ora favoravelmente ao Fisco (AgRg no RExt nº 378.666).
A discussão sobre a imunidade para entidades sem fins lucrativos está concentrada nos impostos municipais (ISS, IPTU e ITBI). Em relação ao Imposto de Renda (IRPJ), o artigo 15 da Lei nº 9.532/97 já prevê isenção para entidades sem fins lucrativos, independentemente da sua finalidade.
Procurada pelo Valor, a Prefeitura de São Paulo não deu retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico-10/10/2018