Sem vetos, Lula sanciona MP que cria crédito sobre subvenções de ICMS
29 DE DEZEMBRO DE 2023
SAI DE CENA O CONCEITO DE ABATIMENTO DOS INCENTIVOS DA BASE DO IRPJ/CSLL E DO PIS/COFINS. REGRAS VALEM A PARTIR DO DIA 1º
Crédito: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil
Sem vetos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta sexta-feira (29/12) a Lei 14.789/2023, que cria um crédito fiscal sobre incentivos de ICMS. Em vez de abater os benefícios estaduais da base de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e da Cofins, os contribuintes terão direito a um crédito fiscal sobre esses incentivos para poder usar por meio de ressarcimento ou compensação com outros débitos. O benefício, entretanto, está restrito às subvenções para investimento, nas quais há uma contrapartida à concessão do incentivo. A lei é fruto da MP 1.185/2023, que ficou conhecida com a MP das subvenções.
A medida faz parte do pacote econômico do Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad, para cumprir a meta de déficit primário zero em 2024. Com a nova lei, o governo estima arrecadar cerca de R$ 35 bilhões no próximo ano. As novas regras produzem efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024.
A nova lei revoga o artigo 30 da Lei 12.937/2014, que regulava o tratamento das subvenções, equiparando custeio e investimento e permitindo a dedução de benefícios das bases do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Agora, a nova regra separa os conceitos e estabelece que apenas as subvenções de investimento têm direito ao benefício. Além disso, na apuração do crédito fiscal, só poderão ser computadas receitas de subvenção que estejam relacionadas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico. Para a apuração do crédito fiscal do novo regime, a lei estabelece uma alíquota de IRPJ de 25%.
A nova lei também estabelece limitações na apuração da base de cálculo dos Juros sobre Capital Próprio (JCP). Entre elas, está a desconsideração do Método de Equivalência Patrimonial (MEP). Durante a tramitação da medida no Congresso, o governo tentou adicionar a extinção do mecanismo de dedução do JCP da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, mas, para que fosse possível a aprovação da medida, recuou e optou por realizar apenas restrições.
Contribuintes devem judicializar as novas regras
A mudança, de acordo com especialistas e integrantes da Fazenda, abrange todos os tipos de benefícios fiscais, inclusive o crédito presumido de ICMS. Para o tributarista Eduardo Pugliese Pinceli, sócio do Schneider Pugliese, esse é justamente o ponto que abre mais brecha para judicialização. O advogado lembra que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento pacificado, desde o julgamento do EREsp 1517492/PR, em 2017, de que o crédito presumido de ICMS não entra na base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Além disso, em 26 abril de 2023, no julgamento do Tema Repetitivo 1182, o STJ definiu que os demais incentivos fiscais de ICMS que não o crédito presumido só poderiam ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL desde que cumpridas, pelo contribuinte, as regras previstas no artigo 10 da Lei Complementar 160/2017 e no artigo 30 da Lei 12.973/14.
No que diz respeito ao PIS e à Cofins, ainda está em julgamento o RE 835818, que discute se o crédito presumido de ICMS entra na base de cálculo das contribuições. O caso está suspenso desde abril de 2021 por um pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes. Antes disso, havia maioria no plenário virtual, com placar de 6X5, para excluir os créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. A contagem de votos será reiniciada. Serão mantidos os votos dos ministros aposentados Marco Aurélio, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, favoráveis aos contribuintes.
Além disso, em julgamento finalizado em 18 de dezembro, o STF concluiu que o crédito presumido de IPI não entra na base de cálculo do PIS e da Cofins, uma vez que não representa faturamento para as empresas. “Tanto o STF quanto o STJ possuem precedentes que definem que o crédito presumido de ICMS não deve ser tributado por não ser receita para o contribuinte. Além disso, esse caso recente do crédito presumido de IPI dá fortes indícios de que o STF também deve aplicar esse entendimento ao crédito presumido de ICMS”, avalia Pugliese.
Maurício Barros, sócio da Cescon Barrieu, ressalta que o STJ já concluiu que a tributação dos créditos presumidos de ICMS fere o pacto federativo. “Não me parece que pode vir uma lei posterior para tentar alcançar essa situação, ainda que com um mecanismo diferente. Qualquer iniciativa da União Federal que direta ou indiretamente reduza esses benefícios concedidos pelo estado, na minha visão, esbarra nessa orientação jurisprudencial”, diz Barros.
Além da questão do crédito presumido, o tributarista Eduardo Campos, sócio do Moraes e Campos Advogados, acredita que o tema deve ser judicializado como um todo. “Os contribuintes persistirão na tese de que a tributação das subvenções fere o pacto federativo, pois a União reduz benefício concedido por outro ente. Mesmo com o crédito fiscal trazido pela MP, que ameniza o impacto da tributação, segue sendo uma redução desse benefício fiscal”, afirma.
Transação para débitos anteriores
A Lei 14.789/2023 também prevê o lançamento de uma transação tributária para negociar débitos apurados em desacordo com o artigo 30 da Lei 12.973/2014. Esse dispositivo, agora, revogado, condicionava a dedução das subvenções de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL à reserva de lucros, entre outros critérios. A nova transação especial dialoga diretamente com o Tema 1182 do STJ, julgado em abril de 2023, que condicionou a dedução dos incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL ao cumprimento de requisitos específicos.
Os créditos relativos à transação especial poderão ser pagos em espécie, com um desconto de 80% do valor, em até doze parcelas. Se o contribuinte optar por pagar em 60 parcelas, o desconto é reduzido para 50%. Já com 84 parcelas mensais, o desconto é de 35%.
Autorregularização
Para os débitos tributários apurados e não lançados, a nova lei permite o uso da autorregularização, antes do lançamento de ofício pela Receita Federal. Nesse caso, também é estabelecido o desconto de 80% em até 12 parcelas mensais para o pagamento em espécie.
Mariana Ribas
Repórter
Cristiane Bonfanti
Editora-assistente de Tributos