A suspensão indefinida e ilimitada de processos trabalhistas tem gerado insegurança jurídica nessa seara do direito.
O sistema de precedentes judiciais vem sendo implementado no Brasil por meio de diversas alterações legislativas desde a reforma do Judiciário, que inseriu as súmulas vinculantes e a repercussão geral como requisito de admissibilidade de recursos para o Supremo Tribunal Federal (STF), até o Código de Processo Civil, que trouxe novidades como o incidente de resolução de demandas repetitivas e de julgamento de recursos repetitivos.
Trata-se de novidades que aproximam nosso ordenamento jurídico do sistema de“common law” e que têm o condão de nos proporcionar a tão desejada segurança jurídica e isonomia processual, uma vez que causas iguais devem ter idênticos julgamentos.
A suspensão indefinida e ilimitada de processos trabalhistas tem gerado insegurança jurídica nessa seara do direito.
Nessa nova sistemática processual, entretanto, preocupa-nos a suspensão indefinida e integral de processos trabalhistas pelo STF nas hipóteses de reconhecimento de repercussão geral de determinadas matérias laborais, conforme autoriza o art. 1035, parágrafo 4º, do CPC: “Reconhecida a repercussão geral, o relator do Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivas, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional”.
A preocupação reside nos efeitos e amplitude da aplicação de tal dispositivo numa seara cujo crédito é de natureza alimentar e onde o princípio da celeridade processual ocupa lugar de destaque na solução dos conflitos.
Recentemente, o ministro Gilmar Mendes da Corte Suprema determinou a suspensão nacional de todos os processos que envolvem discussão sobre validade de norma coletiva que limite ou restrinja direito trabalhista não assegurado pela Constituição Federal, pelo que milhares de processos estão indefinidamente suspensos.
Dados públicos divulgados pelo site do Conselho Nacional de Justiça no Painel de Consulta do Banco Nacional de Demandas Repetitivas e Precedentes Obrigatórios apontam que, em razão de repercussão geral, atualmente há 104.119 processos trabalhistas suspensos no Tribunal Superior do Trabalho e, ainda, 18.678 no âmbito dos Tribunais Regionais do Trabalho.
Ocorre que a suspensão não ocorre somente em relação à tese jurídica que é objeto de julgamento do Supremo sobre a repercussão geral, mas de todo o processo trabalhista que, importante destacar, tem uma realidade diferente do processo civil,pois pautado quase sempre numa infindável cumulação de pedidos.
Em outras palavras, esses 122.797 jurisdicionados que postulam inúmeros pedidos de natureza alimentar como diferenças salariais, verbas rescisórias, adicionais de insalubridade, periculosidade, entre outros, estão com a prestação jurisdicional paralisada indefinidamente, por conta de uma única matéria afetada pelo Supremo Tribunal Federal.
É razoável tal situação? É patente que não. A despeito da importância da estabilidade, integridade e uniformidade da jurisprudência, a suspensão indefinida e ilimitada de processos trabalhistas tem gerado insegurança jurídica nessa seara do direito, justamente o que o sistema de precedentes implementado pelo Código de Processo Civil buscou evitar. É importante ressaltar: não é razoável a suspensão integral, de todos os pedidos que são objeto de um processo, para definição de tese de repercussão geral que envolve apenas um deles.
Não somente os trabalhadores são prejudicados com a paralisação dos processos,mas também os empresários empregadores, tendo em vista a indefinição de temas que têm repercussão nos seus provisionamentos, além dos custos mensais com a remuneração de profissionais para cuidarem de processos que estão parados.
Pois bem. Como os Tribunais do Trabalho podem e devem solucionar esse problema? Os Tribunais que integram a Justiça do Trabalho, inclusive a sua Corte Superior, devem suspender apenas o capítulo do processo que é objeto da repercussão geral e dar seguimento aos trâmites processuais para solução dos demais pedidos.
A sugestão que se faz aqui tem fundamento legal, uma vez que o próprio Código de Processo Civil permite decisões parciais de mérito, conforme autoriza o art. 356 do diploma processual comum, que tem aplicação subsidiária ao processo do trabalho.
Assim, basta um ajuste no procedimento e regimento dos tribunais laborais para solução de questão que não pode persistir, diante dos prejuízos incomensuráveis das partes com a suspensão indefinida e integral de seus processos, além da patente negativa de prestação jurisdicional. Afinal, conforme já ressaltou Rui Barbosa, “a Justiça atrasada não é Justiça, mas injustiça qualificada e manifesta”.
FONTE: Valor Econômico – Por Bruno Freire e Silva e Carlos Alberto Reis de Paula – 18 de setembro de 2019