A Receita Federal permite o uso da melhor margem de lucro para o cálculo do preço de transferência na importação de produtos que serão revendidos no mercado interno. O entendimento, que consta na Solução de Consulta nº 95, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), impacta os valores de Imposto de Renda (IR) e de CSLL que serão recolhidos pela companhia sediada no Brasil.
As regras de preço de transferência se aplicam quando a importadora e a exportadora são de um mesmo grupo econômico. Trata-se de um meio de controle previsto na Lei nº 9.430, de 1996, para evitar que essas companhias paguem menos impostos aqui no Brasil.
Como a norma sobre o assunto é da Cosit, serve como orientação aos fiscais de todo o país. No texto publicado no Diário Oficial da União da última quinta-feira, a Receita se manifesta sobre o PLR (Preço de Revenda menos Lucro), um dos métodos mais utilizados pelos contribuintes. É aplicado quando o produto importado para a revenda não passa por nenhum processo de transformação no Brasil.
Para calcular o preço de transferência com base nesse método, o contribuinte tem que diminuir do preço da revenda uma margem de lucro presumida em lei. Essa margem pode variar entre 20% e 40%, a depender do setor econômico envolvido.
Na solução de consulta, a Receita estabelece que a margem de lucro a ser aplicada deve corresponder ao setor econômico do contribuinte e não ao da indústria de onde vem o produto. E esse entendimento, segundo advogados, pode ser favorável ao importador.
É o caso do contribuinte que fez a consulta. Ele informa no texto que importa aço, metais e ligas, mas afirma que não exerce a metalurgia. Apenas compra e revende. E, por esse motivo, não tinha certeza se deveria aplicar a margem de lucro de 30%, que é a definida para o setor metalúrgico, ou a de 20%, fixada para o setor comercial.
A porcentagem que será aplicada define, na prática, o limite do preço de compra do produto. Quanto menor a porcentagem, então, mais alta poderá ser a quantia paga no processo de importação.
“Essa solução de consulta traz um alento ao contribuinte”, diz Georgios Anastassiadis, sócio do Gaia Silva Gaede Advogados. Foi o escritório que, a pedido de um cliente, fez o questionamento à Receita. A empresa, uma companhia de capital alemão, terá benefícios consideráveis, segundo o advogado. “Tanto para o passado [últimos cinco anos] como para o futuro.”
No caso analisado, no entanto, a Receita Federal fez uma ressalva. Se o produto importado for considerado commodity, o método a ser aplicado seria outro. Seria, nessa hipótese, o PCI (Preço de Cotação na Importação). Trata-se de uma regra mais simples. Se o preço da importação for mais alto do que o praticado no mercado deve-se tributar a diferença. Se for menor, não há nada a ser feito.
Mas o Fisco não entrou a fundo nessa questão. Não tratou, por exemplo, do grau de industrialização para que determinado produto – aço, no caso da consulta – seja considerado commodity.
Para o advogado Carlos Eduardo Orsolon, do escritório Demarest, o entendimento da Receita na solução de consulta sobre o método PRL “poderia ser aplicado a qualquer outro produto de qualquer outro setor”.
Com esse método, diz Orsolon, é feita a decomposição do preço de venda (valor de revenda menos a margem de lucro presumida pela lei). Em um exemplo básico: se o contribuinte revendeu o produto por R$ 15, o preço máximo para a importação, aplicando os 20%, seria R$ 12.
Se em vez de 20% fossem aplicados 30%, o preço da importação não poderia passar de R$ 10,50 e se fossem 40% diminuiria para R$ 9. “Se o preço de importação for maior do que a margem definida nesse cálculo, o contribuinte terá que incluir a diferença no seu lucro”, afirma Orsolon. E isso vai impactar o IR e CSLL que ele terá que recolher.
A lógica do chamado preço de transferência é evitar que as empresas com coligadas ou controladas no exterior burlem o sistema tributário brasileiro. “Porque as companhias poderiam, por exemplo, importar o produto a um valor muito alto para, na revenda, ter margem de lucro pequena”, diz o tributarista Rafael Serrano, do Chamon Santana Advogados.
Por isso há um controle. Todo o excedente do preço do produto importado – comparado ao que se pratica no mercado – tem que ser adicionado ao lucro da empresa que está sediada no Brasil.
Por Joice Bacelo | De São Paulo
Fonte : Valor-03/09/2018.