PREJUÍZOS FISCAIS E BASES NEGATIVAS DE CSLL. COMPENSAÇÃO. LIMITE DE TRINTA POR CENTO. COMPENSAÇÃO DIFERIDA. SOCIEDADE EXTINTA POR INCORPORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO FUTURA DO EXCEDENTE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO ALÉM DO LIMITE. PRÁTICA ADMINISTRATIVA REITERADA. ART. 100 CAPUT E §ÚNICO DO CTN. APELAÇÃO PROVIDA.
– A controvérsia dos autos cinge-se à questão da limitação ao aproveitamento dos prejuízos fiscais (IRPJ) e de bases de cálculo negativas da contribuição social (CSLL) no caso de extinção de sociedade e sucessão empresarial
– Discute-se a aplicação do limite de 30% para compensação de prejuízos fiscais e de bases de cálculos negativas da contribuição social sobre o lucro liquido, estabelecido pelos artigos 15 e 16 da Lei nº 9.065, no encerramento das atividades da sucedida.
– Como é de conhecimento, os artigos 42 e 58 da Lei 8.981/1995 e 15 e 16 da Lei 9.065/95 determinam que os prejuízos fiscais (IRPJ) e as bases negativas (CSL) de anos anteriores podem reduzir o lucro real, apurado no ano corrente, em 30%, podendo o contribuinte compensar as sobras na apuração dos anos subsequentes.
– A limitação é comumente chamada de “trava dos 30”. A jurisprudência do STF reconheceu a constitucionalidade de tal limitação. A matéria foi inclusive contemplada por decisão proferida na sistemática da repercussão geral.
– Entretanto, o caso dos autos comporta solução diversa, eis que, tratando-se de caso de extinção da empresa, que suportou os prejuízos fiscais, a aplicação da trava geraria a impossibilidade de compensação das sobras, uma vez que há expressa vedação para que a sucessora utilize os prejuízos da sucedida para a realização das compensações. Nesse sentido a redação do artigo 33 do Decreto- Lei 2.341/1987.
– No tocante ao Imposto de Renda, a dedução dos prejuízos fiscais era autorizada pelo art. 12, da Lei n.º 8.541/92, que dispunha que os prejuízos apurados a partir de 1.º de janeiro de 1993 poderiam ser compensados com o lucro real apurado em até quatro anos-calendário subsequentes ao ano de apuração. Tratava-se de uma limitação temporal. Com o advento da Lei n.º 8.981/95, alterou-se a forma de apuração do imposto de renda, limitando-se a dedução dos prejuízos fiscais em, no máximo, 30% (trinta por cento), conforme o art. 42.
– O objetivo das normas que criaram a “trava dos 30” não foi em nenhum momento impedir a compensação dos prejuízos apurados pelos contribuintes, mas sim diferir os momentos de compensação, atenuando assim, os efeitos desses encontros de contas para os cofres públicos. Uma vez interrompida a continuidade da empresa por incorporação, fusão ou cisão, a regra não mais se justifica pela total impossibilidade de compensação em momentos posteriores.
– Levando-se em conta a impossibilidade de uso dos prejuízos fiscais das pessoas jurídicas incorporadas pelas pessoas jurídicas incorporadoras, a jurisprudência administrativa admitiu por muito tempo que nos casos de extinção por incorporação, a compensação ocorresse além do limite estabelecido pelo art. 15 da Lei n. 9.065/95.
– Destarte, para que a compensação dos prejuízos (e das bases de cálculo negativas) pudesse ser realizada na sua integralidade, tratando-se de caso de iminente extinção, seria imperioso que esta se realizasse em uma única vez, sem a trava dos trinta.
– Havendo vedação legal para que a sucessora se utilize dos prejuízos fiscais, e das bases de cálculo negativas, da empresa que incorporou, a sucedida ficaria impossibilidade de se utilizar de tais saldos, diante de sua extinção. Assim, se a limitação fosse aplicada no presente caso, a regra que em momento algum vedou a compensação, mas apenas teve por escopo diferi-la ao longo do tempo, acabaria por inviabilizá-la por completo.
– In casu, não há respaldo legal para a observação do limite de trinta por cento nos casos de extinção da pessoa jurídica detentora de prejuízos fiscais e bases de cálculo negativas de CSLL, razão pela qual a sentença proferida merece reforma.
– Recurso provido. TRF3, 0002725-21.2016.4.03.6130/SP, DJ 18/04/2018.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 07 de março de 2018.
MÔNICA NOBRE
Desembargadora Federal
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação interposta contra v. sentença de fls. 141/143, que julgou improcedente o pedido e denegou a segurança, cujo objeto é afastar a aplicação do artigo 15 da Lei nº 9.065/1995, assegurar o direito liquido e certo ao não recolhimento dos débitos de IRPJ e CSLL, relativos ao processo administrativo nº 10882.002239/2010-70, bem como impedir o prosseguimento de qualquer medida de cobrança.
Em suas razões recursais, sustenta a Apelante, em síntese, que o que se discute no presente é o alcance da norma legal concessiva da “benesse”, ou seja, determinar que deva ser aproveitado in totum, nas hipóteses de encerramento da pessoa jurídica, pois com o referido evento a pessoa jurídica fica impossibilitada de aproveitar, no futuro, os saldos de prejuízos. Assevera que a limitação de compensação de prejuízo não é impedir o aproveitamento do beneficio concedido por lei, mas apenas diferir no tempo. Afirma, em relação à sucessora, existir vedação legal para aproveitamento dos prejuízos na sucedida (art. 33 do Decreto-Lei nº 2341/87), não havendo vedação quanto à sucedida, apenas o que estabelece o art. 15 da Lei nº 9065, que não se refere às situações de extinção. Aduz que a chamada “trava dos 30” é distinta nas hipóteses de extinção e continuidade da pessoa jurídica, pois no primeiro caso gera um ônus maior. Salienta que não se discute a constitucionalidade da Lei nº 9065, mas apenas a sua não aplicação no caso de extinção por incorporação. Sustenta, ainda, que a jurisprudência administrativa, ao longo de dez anos, tem sido favorável à tese. Pede a reforma da decisão (fls. 146/197).
Com contrarrazões às fls. 200/203, subiram os autos, tendo o Representante do Ministério Público Federal se manifestado pelo regular seguimento do feito (fls. 211).
É o relatório.
VOTO
A controvérsia dos autos cinge-se à questão da limitação ao aproveitamento dos prejuízos fiscais (IRPJ) e de bases de cálculo negativas da contribuição social (CSLL) no caso de extinção de sociedade e sucessão empresarial.
No presente caso, como noticiado, tem-se que a Apelante Antares Holdings Ltda. é sucessora da empresa VBC Participações S.A., por ter incorporado um terço do patrimônio líquido da mesma, que foi extinta por cisão total.
Discute-se a aplicação do limite de 30% para compensação de prejuízos fiscais e de bases de cálculos negativas da contribuição social sobre o lucro liquido, no encerramento das atividades da sucedida, estabelecido pelos artigos 15 e 16 da Lei nº 9.065/95.
Como é de conhecimento, os artigos 42 e 58 da Lei 8.981/1995 e 15 e 16 da Lei 9.065/95 determinam que os prejuízos fiscais (IRPJ) e as bases negativas (CSL) de anos anteriores podem reduzir o lucro real, apurado no ano corrente, em 30%, podendo o contribuinte compensar as sobras na apuração dos anos subsequentes. Veja-se a redação dos mencionados dispositivos legais:
Lei 8.981/1995
Art. 42. A partir de 1º de janeiro de 1995, para efeito de determinar o lucro real, o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas ou autorizadas pela legislação do Imposto de Renda, poderá ser reduzido em, no máximo, trinta por cento.
Parágrafo único. A parcela dos prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994, não compensada em razão do disposto no caput deste artigo poderá ser utilizada nos anos-calendário subseqüentes.
Art. 58. Para efeito de determinação da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, o lucro líquido ajustado poderá ser reduzido por compensação da base de cálculo negativa, apurada em períodos-base anteriores em, no máximo, trinta por cento.
Lei 9.065/95
Art. 15. O prejuízo fiscal apurado a partir do encerramento do ano-calendário de 1995, poderá ser compensado, cumulativamente com os prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994, com o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação do imposto de renda, observado o limite máximo, para a compensação, de trinta por cento do referido lucro líquido ajustado.
Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que mantiverem os livros e documentos, exigidos pela legislação fiscal, comprobatórios do montante do prejuízo fiscal utilizado para a compensação.
Art. 16. A base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, quando negativa, apurada a partir do encerramento do ano-calendário de 1995, poderá ser compensada, cumulativamente com a base de cálculo negativa apurada até 31 de dezembro de 1994, com o resultado do período de apuração ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação da referida contribuição social, determinado em anos-calendário subseqüentes, observado o limite máximo de redução de trinta por cento, previsto no art. 58 da Lei nº 8.981, de 1995.
Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que mantiverem os livros e documentos, exigidos pela legislação fiscal, comprobatórios da base de cálculo negativa utilizada para a compensação.
A limitação é comumente chamada de “trava dos 30”. A jurisprudência do STF reconheceu a constitucionalidade de tal limitação. A matéria foi inclusive contemplada por decisão proferida na sistemática da repercussão geral. Nesse sentido, cabe transcrever as ementas dos acórdãos abaixo:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS. LIMITAÇÕES. ARTIGOS 42 E 58 DA LEI N. 8.981/95. CONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 150, INCISO III, ALÍNEAS “A” E “B”, E 5º, XXXVI, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. O direito ao abatimento dos prejuízos fiscais acumulados em exercícios anteriores é expressivo de benefício fiscal em favor do contribuinte. Instrumento de política tributária que pode ser revista pelo Estado. Ausência de direito adquirido
2. A Lei n. 8.981/95 não incide sobre fatos geradores ocorridos antes do início de sua vigência. Prejuízos ocorridos em exercícios anteriores não afetam fato gerador nenhum. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 344994, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 25/03/2009, DJe-162 DIVULG 27-08-2009 PUBLIC 28-08-2009 EMENT VOL-02371-04 PP-00683 RDDT n. 170, 2009, p. 186-194)
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURÍDICA. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. PERÍODOS-BASE ANTERIORES A 1995. PREJUÍZOS FISCAIS. COMPENSAÇÃO. LEI Nº 8.981/95, ARTS. 42 E 58.
1. No RE nº 344.944/PR, que envolvia discussão acerca do direito ao abatimento dos prejuízos fiscais do IRPJ acumulados em exercícios anteriores, na forma do art. 42 da Lei nº 8.981/95, o Tribunal assentou que a lei em discussão não incidia sobre fatos geradores ocorridos antes do início de sua vigência e que os prejuízos ocorridos em exercícios anteriores não caracterizavam fato gerador do tributo, constituindo benefício fiscal, consistente em deduções autorizadas por lei, a qual pode ampliar ou reduzir a proporção de seu aproveitamento.
2. No julgamento do RE nº 545.308/SP, o Tribunal, apreciando o art. 58 da Lei nº 8.981/95, que limita a compensação das bases negativas da Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL) ao percentual de trinta por cento, reafirmou o entendimento do RE nº 344.944/SP e concluiu pela constitucionalidade da limitação.
3. Não conhecimento do recurso extraordinário na parte relativa à anterioridade nonagesimal.
4. Recurso extraordinário a que se nega provimento quanto à parte restante.
(RE 244293, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 19/11/2013, DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014 EMENT VOL-02754-03 PP-00438)
O STJ, por sua vez, também tem entendimento pacificado no sentido de ser legal tal limite. Veja-se:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 458, II, E 535, II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. IMPOSTO DE RENDA – IRPJ. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO – CSLL. ARTS. 42 E 58 DA LEI Nº 8.981/95. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS E BASE DE CÁLCULO NEGATIVA. LIMITAÇÃO DE 30%. POSSIBILIDADE. 1. Inexiste ofensa aos arts. 458, inciso II, e 535, inciso II, ambos do CPC, quando o Tribunal de origem se pronuncia de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, tendo o decisum se revelado devidamente fundamentado. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 2. Consoante consolidado na jurisprudência desta Corte, é legal o limite da compensação em 30% do lucro líquido tributável em um dado período de apuração em relação aos prejuízos fiscais acumulados em exercícios anteriores, nos termos dos arts. 42 e 58, da Lei nº 8.981/95, para fins de determinação da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. Precedentes: AgRg no REsp 1027320/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 21/08/2008, DJe 23/09/2008; AgRg no Ag 935.250/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 09/09/2008, DJe 14/10/2008; EREsp Nº 429.730 – RJ, Primeira Seção, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 9.3.2005. 3. Recurso especial não provido. ..EMEN:(RESP 201200494221, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ – SEGUNDA TURMA, DJE DATA:12/08/2015 ..DTPB:.)
No mesmo sentido, destaco precedentes deste C. Tribunal:
AGRAVO LEGAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PESSOA JURÍDICA. COMPENSAÇÃO. HONORÁRIOS.
1. O abatimento de prejuízos fiscais ostenta a natureza de benefício fiscal instituído em favor do contribuinte, e não de crédito tributário.
2. Por se tratar de favor fiscal, a lei pode restringir a compensação dos prejuízos fiscais apurados anteriormente em períodos-base posteriores, sem que isso implique qualquer alteração ao conceito de lucro, uma vez que o mesmo continua amparado como fato gerador de tributo que se consuma, dentro de um período-base específico.
3. O fato gerador do IRPJ continua sendo a aquisição de lucro, porém, para a apuração do mesmo, devem ser consideradas as regras de dedução vigentes durante o período-base em que aquele é apurado.
(…) 6. Agravo legal improvido.
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AC – APELAÇÃO CÍVEL – 1169478 – 0004529-10.2004.4.03.6109, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 13/08/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2015)
TRIBUTÁRIO. IRPJ. ADESÃO AO PARCELAMENTO PREVISTO NO ART. 11 DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 38/02. RECOLHIMENTO DO IRPJ DE FORMA INTEGRAL SEM TER EFETUADO A DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS. IMPOSSIBILIDADE DE POSTERGAÇÃO DE PAGAMENTO QUANTO À REPETIÇÃO/COMPENSAÇÃO DOS VALORES QUE NÃO FORAM ANTERIORMENTE DEDUZIDOS. APELO IMPROVIDO.
1. Historiando a legislação de regência mais recente, tem-se que a Lei nº 8.383/91 permitiu a compensação de prejuízos fiscais sem limitação temporal ou quantitativa; após, a Lei nº 8.541/92, para o ano-base/93, permitiu a compensação plena do prejuízo fiscal, respeitado o prazo de quatro anos. Em 30.12.1994, foi editada a Medida Provisória nº 812, publicada no D.O.U em 31.12.1994, e convertida na Lei nº 8.981/95, instituindo limitação quantitativa da compensação dos prejuízos fiscais e da base de cálculo negativa apurados em exercícios anteriores. A Lei nº 9.065 (arts. 15 e 16) manteve a limitação de trinta por cento para o prejuízo fiscal e a base de cálculo negativa apurados a partir do encerramento do ano-calendário de 1995.
2. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 344.994-0, reconheceu a constitucionalidade do art. 42 da Lei nº 8.981/95. O mesmo se deu com relação ao art. 58 da Lei nº 8.981/95, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 545.308/SP. Em ambas as ocasiões, o Tribunal Pleno assentou que o direito ao abatimento de prejuízos fiscais do IRPJ e das bases negativas de CSLL tem natureza de benefício fiscal instituído em favor do contribuinte. Ou seja, é “instrumento de política tributária que pode ser revista pelo Estado” (RE 545.308), não havendo que se cogitar, por isso, em existência de direito adquirido de realizar compensações à luz da legislação tributária pretérita.
3. Sendo favor fiscal, as regras insculpidas nos arts. 42 e 58 da Lei nº 8.880/94 não configuram instituição ou majoração de tributo. Aliás, como bem ponderou a Ministra Ellen Gracie (RE 344.994/PR), “a Lei 8.981/95 não incide sobre fatos geradores ocorridos antes de sua vigência”, pois “os prejuízos ocorridos em exercícios anteriores não são fato gerador algum”, mas “meras deduções cuja projeção para exercícios futuros foi autorizada”, motivo pelo qual o Pretório Excelso também afastou as alegações de violação aos princípios da irretroatividade (CF, art. 150, III, a) e da anterioridade (CF, art. 150, II, b). (…)
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AC – APELAÇÃO CÍVEL – 1890658 – 0022302-90.2007.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 11/05/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/05/2017)
Entretanto, o caso dos autos comporta solução diversa, eis que, tratando-se de caso de extinção da empresa, que suportou os prejuízos fiscais, a aplicação da trava geraria a impossibilidade de compensação das sobras, uma vez que há expressa vedação para que a sucessora utilize os prejuízos da sucedida para a realização das compensações. Nesse sentido a redação do artigo 33 do Decreto- Lei 2.341/1987:
Art. 33. A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá compensar prejuízos fiscais da sucedida.
O artigo visa evitar a ocorrência de elisão tributária, conforme explica a jurisprudência do E. STJ, no seguinte acórdão:
TRIBUTÁRIO – COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS – SUCESSÃO DE PESSOAS JURÍDICAS – INCORPORAÇÃO E FUSÃO – VEDAÇÃO – ART. 33 DO DECRETO-LEI 2.341/87 – VALIDADE – ACÓRDÃO – OMISSÃO: NÃO-OCORRÊNCIA.
1. Inexiste violação ao art. 535, II, do CPC se o acórdão embargado expressamente se pronuncia sobre as teses aduzidas no recurso especial.
2. Esta Corte firmou jurisprudência no sentido da legalidade das limitações à compensação de prejuízos fiscais, pois a referida faculdade configura benefício fiscal, livremente suprimível pelo titular da competência tributária.
3. A limitação à compensação na sucessão de pessoas jurídicas visa evitar a elisão tributária e configura regular exercício da competência tributária quando realizado por norma jurídica pertinente.
4. Inexiste violação ao art. 43 do CTN se a norma tributária não pretende alcançar algo diverso do acréscimo patrimonial, mas apenas limita os valores dedutíveis da base de cálculo do tributo.
5. O art. 109 do CTN não impede a atribuição de efeitos tributários próprios aos institutos de Direito privados utilizados pela legislação tributária.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1107518/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/08/2009, DJe 25/08/2009)
Consoante o auto de infração 0811300/00224/10 (doc. 14A em mídia digital à fl. 72), objeto do mandado de procedimento fiscal nº 08.1.13.00-2010-00224-3, a sucedida VBC Participações S/A, por meio da DIPJ (ND 1374906) apresentada em 27/12/2006, procedeu à apuração do lucro real, do período 01/01/2006 a 28/11/2006, e compensou todo o lucro real apurado, sem respeitar o limite de 30% estabelecido pelo art. 250, inciso III do RIR/99 e Lei nº 9065, de 1995, art. 15 e paragrafo único, tendo agido da mesma forma na apuração da base de cálculo da CSLL.
Diante disso, foi efetuada a glosa dos prejuízos fiscais e das bases de cálculo negativas, compensados indevidamente, resultando num lucro real sujeito a tributação no valor de R$ 673.709.726,84, e em uma base de cálculo da CSLL no valor de R$ 669.154.862,80, e num IRPJ devido, no valor original de R$ 56.120.477,23, que acrescido de juros e mora e multa proporcional resultou em um valor total de R$ 119.340.194,82, e de CSLL devida, no valor original de R$ 20.074.645,80, que acrescida de juros e mora e multa proporcional resultou num valor total de R$ 42.688.734,29, atualizados até 30/07/2010.
Observa-se que a Autora se insurgiu com relação ao auto de infração, por meio de impugnação, conforme cópias do processo administrativo nº 10882.002239/2010-70. Após o trâmite do processo administrativo, ficaram mantidas as exações.
Importa salientar que no tocante ao Imposto de Renda, a dedução dos prejuízos fiscais era autorizada pelo art. 12, da Lei n.º 8.541/92, que dispunha que os prejuízos apurados a partir de 1.º de janeiro de 1993 poderiam ser compensados com o lucro real apurado em até quatro anos-calendário subsequentes ao ano de apuração. Tratava-se de uma limitação temporal.
Com o advento da Lei n.º 8.981/95, alterou-se a forma de apuração do imposto de renda, limitando-se a dedução dos prejuízos fiscais em, no máximo, 30% (trinta por cento), conforme o art. 42 supracitado.
Resta evidente, portanto, como alegado pela Apelante, que objetivo das normas que criaram a “trava dos 30” não foi em nenhum momento impedir a compensação dos prejuízos apurados pelos contribuintes, mas sim diferir os momentos de compensação, atenuando assim, os efeitos desses encontros de contas para os cofres públicos. Uma vez interrompida a continuidade da empresa por incorporação, fusão ou cisão, a regra não mais se justifica pela total impossibilidade de compensação em momentos posteriores.
Partindo dessa premissa, e levando-se em conta a impossibilidade de uso dos prejuízos fiscais das pessoas jurídicas incorporadas pelas pessoas jurídicas incorporadoras, a jurisprudência administrativa admitiu por muito tempo que nos casos de extinção por incorporação, a compensação ocorresse além do limite estabelecido pelo art. 15 da Lei n. 9.065/95.
A exemplo disso os julgados: 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara, Acórdão nº 101-95.872; 1º Conselho de Contribuintes, 3ª Câmara, Acórdão nº 103-23.594; 1º Conselho de Contribuintes, 7ª Câmara, Acórdão nº 107-09.243; 1º Conselho de Contribuintes, 8ª Câmara, Acórdão nº 108-07.456; 1º Conselho de Contribuintes, 8ª Câmara, Acórdão nº 108-06.682; Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, 1ª Seção, 2ª Câmara, 1ª Turma Ordinária, Acórdão nº 1021-00.108; Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, 1ª Seção, 2ª Câmara, 1ª Turma Ordinária, Acórdão nº 1201-00.165; Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, 1ª Seção, 3ª Câmara, 2ª Turma Ordinária, Acórdão nº 1302-00.098; Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, 1ª Seção, 4ª Câmara, 2ª Turma Ordinária, Acórdão nº 1402-00.063.
Os referidos julgados convergem na mesma tese, cuja ementa segue transcrita, abaixo, nos seguintes termos:
IRPJ – COMPENSAÇÃO DE PREJUIZO – LIMITE DE 30% – EMPRESA INCORPORADA – A empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro liquido na compensação do prejuízo fiscal.
(Câmara Superior de Recursos Fiscais – Primeira Turma – Relator Cons. José Henrique Longo – Recurso nº RD 101-122596 – Acordão nº CSRF/01-05.100 – Processo nº 10980.011045/99-90 – Sessão de 19 de outubro de 2004).
Nesse sentido, o art. 100 do CTN dispõe:
Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos:
I – os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas;
II – as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa;
III – as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas;
IV – os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.
Sobre o tema destaca-se o entendimento de Hugo de Brito Machado na obra Comentários ao Código Tributário Nacional, Vol. II, São Paulo: Atlas, 2004, p. 93:
“As práticas reiteradas das autoridades administrativas. Elas representam uma posição sedimentada do Fisco na aplicação da legislação tributária e devem ser acatadas como boa interpretação da lei. Se as autoridades fiscais interpretam a lei em determinado sentido, e assim a aplicam reiteradamente, essa prática constitui norma complementar da lei. De certo modo, isto representa a aceitação do costume como fonte do Direito. O Código Tributário Nacional não estabelece qualquer critério para se determinar quando uma prática deve ser considerada como adotada reiteradamente pela autoridade administrativa, devendo-se, todavia, entender como tal uma prática repetida, renovada. Basta que tenha sido adotada duas vezes, pelo menos, para que se considere reiterada.”
De fato, a alteração de práticas reiteradas no âmbito administrativo não deve atingir aqueles que antes dessa alteração possuíam pedidos administrativos pendentes e na hipótese de atingi-los, não deve resultar, nos termos do § único, em penalidades.
Cumpre assinalar também que a vedação imposta pelo art. 33 do Decreto- Lei 2.341/1987 transfere à empresa sucessora o resultado negativo da operação societária e não transfere a possibilidade de compensação dos prejuízos fiscais, ou que resulta na tributação do “não acréscimo patrimonial”, violando assim a hipótese de incidência do IRPJ e da CSLL.
Destarte, para que a compensação dos prejuízos (e das bases de cálculo negativas) pudesse ser realizada na sua integralidade, tratando-se de caso de iminente extinção, seria imperioso que esta se realizasse em uma única vez, sem a trava dos trinta.
Por óbvio, havendo vedação legal para que a sucessora se utilize dos prejuízos fiscais, e das bases de cálculo negativas, da empresa que incorporou, a sucedida ficaria impossibilidade de se utilizar de tais saldos, diante de sua extinção.
Assim, se a limitação fosse aplicada no presente caso, a regra que em momento algum vedou a compensação, mas apenas teve por escopo diferi-la ao longo do tempo, acabaria por inviabilizá-la por completo.
Cabe frisar, ainda, que não obstante se trate de um benefício fiscal, a compensação de prejuízos é uma garantida legal.
Sob essa ótica, não há respaldo legal para a observação do limite de trinta por cento nos casos de extinção da pessoa jurídica detentora de prejuízos fiscais e bases de cálculo negativas de CSLL, razão pela qual a sentença proferida merece reforma.
Não desconheço a existência do seguinte precedente, emanado do C. STJ:
TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. LUCRO DE EMPRESA INCORPORADA A SER COMPENSADO COM PREJUÍZO DA EMPRESA INCORPORADORA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.
1. A empresa incorporadora não pode compensar prejuízos apurados em determinado exercício com lucros obtidos por empresa incorporada, para fins de imposto de renda, por ausência de previsão legal.
2. O silêncio da lei sobre determinada situação não gera direitos para as partes que compõem a relação jurídico-tributária.
3. A homenagem ao princípio da legalidade tributária exige expressa disposição na lei da conduta a ser praticada pelo ente tributante e pelo contribuinte.
4. Compensação não permitida. Precedente: REsp 54348/RJ, Rel. Min.
Milton Luiz Pereira, 1ª Turma.
5. Recurso improvido.
(REsp 307.389/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/08/2002, DJ 17/03/2003, p. 179)
Entretanto, cumpre ressaltar que trata-se de posicionamento isolado na Corte Superior, além de ter sido proferido em data anterior as decisões administrativas que reconheceram o direito do contribuinte.
Destaco ainda, que o princípio da legalidade tributária estabelece quais as regras matrizes capazes de gerar tributo. Em outras palavras, somente o que a lei estabelece como fato gerador é capaz de ensejar a exigência de tributo. Se a lei é lacunosa acerca de determinada situação, tal fato por si só limita a administração em cobrar qualquer obrigação que seja.
Além disso, o precedente supracitado analisou a possibilidade da empresa incorporadora compensar prejuízos dela com lucros da incorporada e o caso em tela trata de situação inversa, já que se pretende aqui que a incorporadora utilize os prejuízos da incorporada. Nesse sentido é de se observar que a incorporada sustentou tais prejuízos até o momento de sua extinção, arcando também com os ônus fiscais deles decorrentes.
Noutro passo, ainda que o conselho administrativo novamente altere o entendimento acerca do tema, deverá ser observada a irretroatividade da alteração aos casos em que o contribuinte obedeceu ao entendimento firmado à época em que realizou a compensação.
Ante o exposto, dou provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
É o meu voto.
MÔNICA NOBRE
Desembargadora Federal
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