PIS E COFINS. BENEFÍCIO FISCAL. LEI Nº 10.925/2004 E ART. 34 DA LEI 12.058/2009 ALTERADAS PELA LEI 12.839/2013. FORMAÇÃO DE CRÉDITO PRESUMIDO DE 40%. PRODUTOS ADQUIRIDOS PARA INDUSTRIALIZAÇÃO. CONCEITO DE INDUSTRIALIZAÇÃO. INTERPRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA. EXAME AMPLO DA LEGISLAÇÃO PERTINENTE AO TEMA. DECRETO N. 7.212/2010. PREPARO DE ALIMENTOS NÃO ACONDICIONADOS EM EMBALAGEM DE APRESENTAÇÃO EM COZINHAS INDUSTRIAIS QUANDO DESTINADOS A VENDA DIRETA PARA CONSUMO. ANÁLISE DO OBJETO SOCIAL DA SOCIEDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO IRRESTRITA DO BENEFÍCIO. RECURSO DE APELAÇÃO DA UNIÃO, NA PARTE CONHECIDA, PROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO DO AUTOR PREJUDICADO. 1 – Por certo, o julgador tem o dever legal e constitucional de decidir (inafastabilidade e indeclinabilidade do controle jurisdicional), conforme dispõem o art. 5.º, XXXV, da CF/1988, c/c o art. 4º do Decreto-Lei nº 4.657/1942 e os arts. 140 e 141 do CPC/2015, cabendo conduzir o processo, investigando e interpretando as fontes jurídicas adequadas à situação concreta. Contudo, o binômio dever-poder não é absoluto, encontrando no próprio sistema os seus limites, como, por exemplo, nas questões vedadas por lei ao conhecimento de ofício do juiz, cuja consideração depende de terem sido suscitadas pelo sujeito processual interessado, conforme preceitua o art. 141, do CPC/2015. 2 – O postulado normativo “iura novit curia” está subordinado aos ditames constitucionais expressamente previstos, dentre os quais se destacam as garantias do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e da fundamentação das decisões judiciais (art. 5.º, LIV e LV, e art. 93, IX), e deve receber interpretação que com eles seja compatível. 3 – O nosso ordenamento jurídico veda o “novorum iudicium” no recurso de apelação, porquanto o juízo recursal é de controle e não de criação (“revisio prioriae instantiae”). A devolutividade ampla do recurso de apelação, em regra, não permite a inovação com a alteração dos argumentos expostos, considerando, inclusive, que a parte não se insurgiu sequer em embargos de declaração quando da prolação da sentença. 4 – Nesse cenário, os argumentos da União que não foram expostos oportunamente e que não foram enfrentados ou debatidos pela sentença, que não tratam de matéria de ordem pública e que não tem relação com a análise ampla e detida da legislação não podem ser conhecidos diretamente por esta e. Corte por acarretar em supressão de instância, além de importar em inovação recursal indevida, em virtude da preclusão consumativa. 5 – No entanto, à luz dos princípios constitucionais correlatos e da necessidade de uma prestação jurisdicional efetiva, o julgador não pode se esquivar da análise ampla e detida da relação jurídica posta, devendo os pedidos serem examinados partir de uma interpretação lógico-sistemática do ordenamento jurídico (“mihi factum dabo tibi ius”), sendo que não configura julgamento extra petita quando o órgão julgador, respeitado os limites objetivos da pretensão inicial, concede providência dentre as interpretações possíveis. 6 – Nos termos do artigo 111 do Código Tributário Nacional: ‘Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: I – suspensão ou exclusão do crédito tributário; II – outorga de isenção; III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias’. 7 – A concessão de crédito presumido, por implicar em favor legal tendente à redução da arrecadação, deve necessariamente ser prevista em lei específica, conforme o art. 150, parágrafo 6º, da CF, que assim dispõe: “Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica (…)”. 8 – O crédito presumido é um benefício fiscal, tratando-se de uma espécie de ficção jurídica, cujo objetivo é aliviar a cumulatividade nas situações onde não foi possível eliminá-la pela concessão do crédito ordinário, concedido nas hipóteses previstas no art. 3º, §2º, das Leis nºs. 10.637/2002 e 10.833/2003, onde não é possível dedução de crédito ordinário pela sistemática não cumulativa. 9 – O art. 34 da Lei nº 12.058/2009, com redação data pela Lei nº 12.839/2013, estabelece que a pessoa jurídica tributada pelo lucro real que adquire para industrialização produtos cuja comercialização seja fomentada com as alíquotas “zero” do PIS e da Cofins previstas nas alíneas “a” e “c” do inciso XIX do art. 1º da Lei nº 10.925/2004 (quais sejam: TIPI 02.01, 02.02, 0206.10.00, 0206.2, 0210.20.00, 0506.90.00, 0510.00.10 e 1502.10.1 e 02.04 e miudezas comestíveis de ovinos e caprinos classificadas no código 0206.80.00) poderá descontar das referidas contribuições, devidas em cada período de apuração, crédito presumido determinado mediante a aplicação sobre o valor das aquisições de percentual correspondente a 40% das alíquotas previstas no caput dos art. 2º das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, sendo vedada, conforme parágrafo 1º, a apuração do crédito de que trata o caput nas aquisições realizadas por pessoa jurídica que industrializa os produtos classificados nas posições 01.02, 01.04, 02.01, 02.02 e 02.04 da NCM ou que revende os produtos referidos no caput. 10 – A busca pelo alcance da norma que autoriza o aproveitamento do crédito presumido de PIS e COFINS reclama o confronto com a legislação do IPI, especialmente tendo em vista a conceituação vaga de industrialização empreendida pelo parágrafo único do art. 46, do CTN. 11 – O artigo 8º do Decreto nº 7.212/2010 – RIPI/2010 define que estabelecimento industrial é aquele que executa qualquer das modalidades de industrialização referidas no art. 4º do RIPI, de que resulte em produto tributado pelo IPI, ainda que de alíquota zero ou isento. Já o art. 5º, I, “a”, determina que o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação, na residência do preparador ou em restaurantes, bares, sorveterias, confeitarias, padarias, quitandas e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta ao consumidor, não é considerado industrialização. 12 – Assim, a venda a pessoa jurídica que desenvolve atividades típicas de lanchonete, restaurante, bares, dentre outros, pode ser considerada como venda a pessoa jurídica que utilizará os produtos adquiridos na qualidade de seu destinatário final, tendo em vista que os produtos adquiridos não mais integrarão etapa de processo produtivo, sendo apenas preparados e fornecidos a consumidores, na forma de refeições. Esse preparo, por sua vez, apesar de transformar o alimento, não é considerado industrialização pela legislação supracitada. 13 – Nesse cenário, considerando que não ficou comprovado que a empresa é equiparada à indústria, considerando, ainda, que a atividade de preparo de produtos alimentares quando destinados à venda direta de pessoas jurídicas ou a outras entidades para consumo de empregados, uma das atividades descritas no objeto social da empresa, não é considerada atividade industrial, não é possível se conferir ao autor a condição de credor do crédito presumido ora pleiteado. 14 – Consoante entendimento pacificado pela jurisprudência, a sentença é o marco para delimitação do regime jurídico aplicável à fixação de honorários advocatícios. Nestes termos, são devidos honorários advocatícios em favor da União, que ficam fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §2º, I a IV e §3º, I, do CPC/2015. 15- Recurso de apelação da União parcialmente conhecido e, na parte conhecida, provido. 16 – Recurso de apelação do autor prejudicado. TRF 3ª Região, Apel./RN 0018285-98.2013.4.03.6100, julg. 16/04/2020.