Advogados dizem que parecer publicado ontem pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) deixa a Receita Federal de “mãos amarradas”. A partir de agora fica praticamente inviável uma reação dos auditores fiscais contra os efeitos da “tese do século” – que gerou R$ 358 bilhões aos contribuintes, segundo estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
A PGFN afirma, nesse parecer, que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a exclusão do ICMS do cálculo do PIS e da Cofins não se aplica para uma outra etapa: a de apuração dos créditos que são gerados com a aquisição de bens e insumos. O documento está assinado por Ricardo Soriano, o procurador-geral, e vincula os auditores fiscais.
A Receita Federal vinha insistindo nesse tema. Se prevalecesse, seria ruim para as empresas porque, aqui, o efeito é inverso ao da “tese do século”. Sem o ICMS, o valor do crédito diminui e a conta a pagar ao governo aumenta. Para a União, porém, seria uma forma de equilibrar as contas.
Fim de jogo
“Não há mais nenhum tipo de exercício interpretativo que a Receita Federal possa adotar para insistir nisso. A procuradoria está dizendo que só seria possível com uma mudança nas leis que dão sustentação ao crédito de PIS e Cofins. Para mim, então, o jogo acabou”, considera o tributarista Carlos Eduardo Navarro, sócio do Galvão, Villani, Navarro e Zangiácomo Advogados.
Para Douglas Campanini, sócio da Athros Auditoria e Consultoria, “a PGFN impôs uma dura derrota para a Receita Federal”. Ele afirma que se os auditores insistirem em cobrar a exclusão do ICMS na apuração dos créditos, como vinham fazendo até aqui, “os contribuintes poderão questionar os atos da Receita, por descumprirem a orientação da PGFN”.
“As expectativas e as incertezas quanto ao modo de tributação ou quanto ao nível das exações fiscais afetam as decisões de investimento e as decisões de consumo”
Impacto econômico
A comissão especial de direito tributário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) havia soltado um parecer sobre esse tema na sexta-feira. Consta no documento que, na prática – considerando os valores envolvidos – prevalecendo a posição da Receita, seria como se o Fisco tivesse vencido, no STF, a discussão sobre qual ICMS deveria ser excluído do cálculo dos pagamentos de PIS e Cofins. A Fazenda Nacional defendia, nos embargos de declaração da “tese do século”, que fosse o efetivamente pago pelos contribuintes aos Estados. Prevaleceu, porém, o ICMS que consta na nota fiscal.
“As expectativas e as incertezas quanto ao modo de tributação ou quanto ao nível das exações fiscais afetam as decisões de investimento e as decisões de consumo”, afirmou a OAB no documento.
Eduardo Maneira, presidente da comissão e sócio do Maneira Advogados, falava na necessidade de se “colocar uma pá de cal” nesse assunto. Enquanto Rafael Pandolfo, um dos tributaristas que elaborou o parecer, observa que “algumas vitórias no STF parecem gol no futebol hoje em dia: o torcedor não comemora plenamente até a confirmação do VAR”.
Valor Econômico – Por Joice Bacelo e Beatriz Olivon-29/09/2021.