PGFN contabiliza 22 ações contra lei que limita deduções de benefícios fiscais de ICMS
24 DE JANEIRO DE 2024
CONTRIBUINTES QUESTIONAM PONTOS COMO CRITÉRIOS PARA HABILITAÇÃO DAS EMPRESAS PARA TER DIREITO AO CRÉDITO FISCAL E APLICAÇÃO DA NOVA LEGISLAÇÃO AOS CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) contabilizou até o momento 22 ações ajuizadas com questionamentos à Medida Provisória 1.185/2023, que se tornou a Lei 14.789/2023 e cria um crédito fiscal sobre incentivos de ICMS. A maior parte delas está no TRF-6, em Belo Horizonte, onde tramitam 11 processos. No TRF3, estão seis ações e, no TRF-4, cinco ações.
Sancionada sem vetos em 29 de dezembro, a Lei 14.789/2023 define que, em vez de abater os benefícios estaduais da base de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e da Cofins, os contribuintes terão direito a um crédito fiscal sobre esses incentivos para poder usar por meio de ressarcimento ou compensação com outros débitos. O benefício, entretanto, está restrito às subvenções para investimento, nas quais há uma contrapartida à concessão do incentivo.
A procuradora-geral adjunta responsável pela representação judicial da PGFN, Lana Borges, disse ao JOTA que o tema está com “uma carga de atenção mais alta” por parte do órgão, dado o fato de ser uma nova legislação e que gera uma mudança relevante no cenário jurídico. Segundo ela, “houve pouca judicialização até o momento”, mas a procuradoria tem trabalhado para que seu corpo técnico esteja pronto para lidar com os casos que surgirem nas instâncias iniciais.
Borges diz que a procuradoria tem atuado de forma integrada com outras áreas do governo, como a Receita Federal, para garantir uma defesa sólida para a União nas disputas. A procuradora evitou detalhar os assuntos levantados nas ações envolvendo a nova legislação. Mas temas como os critérios de habilitação dos contribuintes (cuja homologação é feita pela Receita) para ter direito ao crédito fiscal e a aplicação das novas regras aos créditos presumidos de ICMS estão entre os tópicos contestados por contribuintes nos processos em tramitação.
Não há direito adquirido em regime fiscal, afirma PGFN
Como era de se esperar, a PGFN se mostra convicta não só da constitucionalidade da lei como de seu mérito. O procurador Disraeli Dias, que coordena os trabalhos em torno da judicialização do tema, destaca que não há direito adquirido em se tratando de regime fiscal e que benefícios tributários precisam de lei que estabeleçam sua permissão. Dessa forma, a seu ver, não cabe utilizar a legislação anterior, agora revogada, como argumento para afastar a tributação.
Lana Borges reforça que não há direito adquirido em relação ao tema. Também critica o uso indiscriminado de créditos presumidos de ICMS como instrumento de incentivo tributário pelos estados sem exigência de contrapartidas às empresas. Para a procuradora, a concessão indiscriminada desses incentivos vilipendia a arrecadação federal e gera situações nas quais alguns contribuintes conseguem zerar o estoque de Imposto de Renda a pagar a partir da dedução dos incentivos fiscais de ICMS. “Tem havido uma violação do pacto federativo em prejuízo da União”, disse.
Com a afirmação, a procuradora contrapõe o argumento dos contribuintes e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) segundo o qual a incidência de IRPJ e CSLL sobre os créditos presumidos de ICMS viola o pacto federativo, uma vez que a União esvaziaria o benefício fiscal concedido pelos estados. Para Borges, a violação ao pacto federativo ocorre em sentido contrário: há um esvaziamento da arrecadação da União, em um primeiro momento, e depois dos próprios estados e municípios, uma vez que o produto da arrecadação do Imposto de Renda é repartido com esses entes.
A procuradora-geral adjunta afirma que não está no radar do órgão uma Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) sobre o assunto, até porque não há decisões sobre o tema nas instâncias inferiores nem divergência sobre o assunto que justificasse isso.
Além das ações mapeadas pela PGFN, há uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal. Trata-se da ADI 7551, do Partido Liberal (PL) . A legenda defende que a medida fere o pacto federativo, já que, na prática, permite a tributação, pela União, de benefícios concedidos pelos estados. Para o PL, ao tributar as subvenções, a União está reduzindo os incentivos oferecidos pelas unidades federativas.
Argumentos contrários à nova legislação
Desde a publicação da MP 1.185/2023, ainda antes da sua conversão na Lei 14.789/2023, os contribuintes afirmaram que judicializariam o tema. Mas como a nova lei revoga completamente a anterior sobre o assunto, a discussão é mais complexa do que parece. O tema é crucial para a estratégia fiscal do governo, pois fecha uma brecha importante de erosão de base tributária. A equipe econômica estima arrecadar ao menos R$ 35 bilhões ao ano com a medida, já considerando alguma perda de receita por conta da judicialização.
O principal ponto de polêmica para os contribuintes é o fato de a nova lei abranger os créditos presumidos de ICMS. As empresas argumentam que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento pacificado, desde o julgamento do EREsp 1517492/PR, em 2017, de que o crédito presumido de ICMS não entra na base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Além disso, em 26 abril de 2023, no julgamento do Tema Repetitivo 1182, o STJ definiu que os demais incentivos fiscais de ICMS que não o crédito presumido só poderiam ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL desde que cumpridas, pelo contribuinte, as regras previstas no artigo 10 da Lei Complementar 160/2017 e no artigo 30 da Lei 12.973/14.
O tema envolvendo a inclusão dos créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL poderá ser julgado pelo STJ em sede de recursos repetitivos, o que obriga os tribunais a seguirem o mesmo entendimento. Com a nova composição do STJ e as recentes vitórias da União nos tribunais superiores, não está garantido que a posição de 2017, favorável ao contribuinte, será mantida.
No que diz respeito ao PIS e à Cofins, ainda está em julgamento no STF o RE 835818, que discute se o crédito presumido de ICMS entra na base de cálculo das contribuições. Os contribuintes argumentam que o benefício fiscal não caracteriza faturamento e, portanto, não deve ser tributado pelo PIS e pela Cofins. O caso está suspenso desde abril de 2021 por um pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes. Antes disso, havia maioria no plenário virtual, com placar de 6X5, para excluir os créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. A contagem de votos será reiniciada. Serão mantidos os votos dos ministros aposentados Marco Aurélio, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, favoráveis aos contribuintes.
Além disso, em julgamento finalizado em 18 de dezembro, o STF concluiu que o crédito presumido de IPI não entra na base de cálculo do PIS e da Cofins, uma vez que não representa faturamento para as empresas. Para os contribuintes, este é um precedente que pode ser utilizado para contestar a inclusão dos créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins com base na Lei 14.789/2023.
Fabio Graner
Analista de Economia
Mariana Branco
Editora-assistente de Tributos’