COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO DECORRENTE DE AÇÃO JUDICIAL. PRAZO PARA APRESENTAR DECLARAÇÃO DE COMPENSAÇÃO. NECESSIDADE DE HABILITAÇÃO PRÉVIA. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL.
O crédito tributário decorrente de ação judicial pode ser executado na própria ação judicial para pagamento via precatório ou requisição de pequeno valor ou, por opção do sujeito passivo, ser objeto de compensação com débitos tributários próprios na via administrativa.
Ao fazer a opção pela compensação na via administrativa, o sujeito passivo sujeita-se ao disciplinamento da matéria feito pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, especificamente a Instrução Normativa nº 1.300, de 2012, conforme § 14 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, e às demais limitações legais.
Para a apresentação da Declaração de Compensação, o sujeito passivo deverá ter o pedido de habilitação prévia deferido.
A habilitação prévia do crédito decorrente de ação judicial é medida que tem por objetivo analisar os requisitos preliminares acerca da existência do crédito, a par do que ocorre com a ação de execução contra a Fazenda Nacional, quais sejam, legitimidade do requerente, existência de sentença transitada em julgado e inexistência de execução judicial, em respeito ao princípio da indisponibilidade do interesse público.
O prazo para a compensação mediante apresentação de Declaração de Compensação de crédito tributário decorrente de ação judicial é de cinco anos, contados do trânsito em julgado da sentença que reconheceu o crédito ou da homologação da desistência de sua execução.
No período entre o pedido de habilitação do crédito decorrente de ação judicial e a ciência do seu deferimento definitivo no âmbito administrativo, o prazo prescricional para apresentação da Declaração de Compensação fica suspenso.
O crédito habilitado pode comportar mais de uma Declaração de Compensação, todas sujeitas ao prazo prescricional de cinco anos do trânsito em julgado da sentença ou da extinção da execução, não havendo interrupção da prescrição em relação ao saldo.
Eventual mudança de interpretação sobre a matéria será aplicável somente a partir de sua introdução na legislação tributária.
Dispositivos Legais. Constituição Federal, arts. 37 e 100; Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, arts. 100, 170 e 170-A; Decreto nº 20.910, Lei nº 9.430, de 1996, art. 74; Lei nº 9.779, art. 16; Lei nº 9.784, de 1999, art. 2º; Portaria MF nº 203, de 2012, art. 1º, III, e art. 280, III e XXVI; IN RFB nº 1.300, de 2012, arts. 81 e 82.
e-processo 10880.724252/2013-46
(Vide Despacho RFB nº sn, de 19 de dezembro de 2014)
Relatório
O presente Parecer Normativo tem por objetivo solucionar consulta interna encaminhada pela Divisão de Tributação da Superintendência Regional da Receita Federal do Brasil na 8ª Região Fiscal (Disit/SRRF08) acerca da contagem do prazo extintivo do direito de o contribuinte apresentar Declaração de Compensação (Dcomp) para compensar crédito decorrente de ação judicial transitada em julgado, tendo em vista diversos entendimentos contraditórios sobre o tema. Ele é editado com fulcro nos §14 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, inciso I do art. 100 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional (CTN), e inciso III do art 1º e incisos III e XXVI do art. 280 da Portaria MF nº 203, de 17 de maio de 2012.
Fundamentos
OPÇÃO PELA COMPENSAÇÃO ADMINISTRATIVA
2. A execução de uma sentença transitada em julgado reconhecendo um crédito contra a Fazenda Nacional deve se dar por precatório (ou requisição de pequeno valor), conforme art. 100 da Constituição Federal (CF):
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
2.1. No caso do crédito do sujeito passivo de tributo administrado pela RFB reconhecido judicialmente com trânsito em julgado, o art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, na redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002, estabeleceu que ele pode ser utilizado na compensação de débitos do sujeito passivo que os apurou;
Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.
2.2. Entretanto, todo o contexto constitucional deve ser levado em consideração. Isso porque o art. 100 da CF dispôs que o pagamento de créditos reconhecidos judicialmente em que a Fazenda Pública é devedora deve ser feito exclusivamente por precatório, em ordem cronológica, com as exceções contidas no próprio dispositivo constitucional. O art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, na redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002, deve ser interpretada conforme o art. 100 da CF, e não isoladamente, sob pena de sua inconstitucionalidade material
2.3. Para tanto, essa opção pela compensação dos créditos de tributos administrados pela RFB deve ser interpretada no sentido de ser possível, pois: (i) é opcional ao sujeito passivo detentor desses créditos, ou seja, mantém-se a forma preferencial de pagamento de tais créditos por precatório ou congênere; (ii)deve ser realizada em um procedimento em que todas as garantias existentes no processo civil – como a análise de sua existência e de sua correta quantificação pela Fazenda Nacional bem como a garantia da indisponibilidade do interesse público, conforme disciplinamento pela RFB, nos termos do § 14 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996 – sejam asseguradas; (iii) há o interesse público de a Fazenda Nacional ter os seus créditos tributários (o débito do sujeito passivo) também quitados, mormente quando ele também possui créditos com a Fazenda Nacional, em prol do princípio da eficiência administrativa. Vale dizer, a permissão que o sujeito passivo opte pela compensação desse crédito reconhecido judicialmente somente concorda com a CF no momento em que ela é interpretada como de interesse mútuo desse sujeito passivo e da Administração Pública, e não um direito unilateral do primeiro. Conforme o STJ:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. DIREITO À REPETIÇÃO DO INDÉBITO. OPÇÃO POR RESTITUIÇÃO OU COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE.
(…)
Ocorrido o trânsito em julgado da decisão que determinou a repetição do indébito, é facultado ao contribuinte manifestar a opção de receber o respectivo crédito por meio de precatório regular ou mediante compensação, uma vez que constituem, ambas as modalidades, formas de execução do julgado colocadas à disposição da parte quando procedente a ação. (EREsp 653.181/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 11/10/04).
3. Desse modo, a lei permitiu que o sujeito passivo com crédito judicial referente a tributo federal administrado pela RFB pudesse optar entre a execução contra a Fazenda Nacional de que trata o art. 730 da Lei nº5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil (CPC), com o pagamento via precatório ou requisição de pequeno valor, ou a compensação em âmbito administrativo. Mas ao fazer a opção pelo pagamento do crédito via compensação administrativa (até porque o pagamento via precatório continua sendo a regra), o sujeito passivo sujeitar-se-á às regras emitidas pela RFB, conforme §14 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996:
§ 14. A Secretaria da Receita Federal – SRF disciplinará o disposto neste artigo, inclusive quanto à fixação de critérios de prioridade para apreciação de processos de restituição, de ressarcimento e de compensação
3.1. Note-se que o art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, deu diversas diretrizes para a compensação dos créditos, mas sem a especificidade necessária. No caso de crédito decorrente de ação judicial, por exemplo, a lei não realizou todos os detalhamentos contidos no CPC para a cobrança daquele valor por ação judicial, inclusive no que concerne às condições da ação e a forma de a Fazenda Pública não concordar com os valores apresentados (embargos à execução), institutos já há muito consolidados no processo civil. Para o procedimento de compensação na via administrativa, a lei determinou que a RFB realizasse todos esses detalhamentos.
3.2. A vigente Instrução Normativa RFB nº 1300, de 2012, é que disciplina, entre outros institutos, a compensação e, portanto, deve ser obrigatoriamente seguida.
PEDIDO DE HABILITAÇÃO PRÉVIA
4. Para a correta solução da presente consulta, preliminarmente, deve-se analisar a questão do poder de polícia da RFB e seu enquadramento na atividade de liquidação de um crédito judicial do contribuinte. Isso porque o conceito mais usual de poder de polícia é o de limitação à liberdade ou à propriedade. Na sua atuação de lançamento de ofício, por exemplo, a RFB limita o direito de propriedade ao examinar e fiscalizar as atividades econômicas e cobrar tributos de forma obrigatória. E na atividade em que há o reconhecimento do crédito do sujeito passivo? Há também esse poder de polícia? Para elucidar o tema, transcrevem-se trechos de Di Pietro e Bandeira de Mello:
Quando se estuda o regime jurídico-administrativo a que se submete a Administração Pública, conclui-se que dois aspectos fundamentais que o caracterizam são resumidos nos vocábulos prerrogativas e sujeições, as primeiras concedidas à Administração, para oferecer-lhes meios para assegurar o exercício de suas atividades, e as segundas como limites opostos à atuação administrativa em benefício dos direitos dos cidadãos. Praticamente, todo o direito administrativo cuida de temas em que se colocam em tensão dois aspectos opostos: a autoridade da Administração Pública e a liberdade individual.
O tema relativo ao poder de polícia é um daqueles em que se colocam em confronto esses dois aspectos: de um lado, o cidadão que exercer plenamente os seus direitos; de outro, a Administração tem por incumbência condicionar o exercício daqueles direitos ao bem-estar coletivo, e ela o faz usando o seu poder de polícia.
(…)
Pelo conceito moderno, adotado no direito brasileiro, o poder de polícia é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. SP: Atlas, 2012)
Através da Constituição e das leis os cidadãos recebem uma série de direitos. Cumpre, todavia, que o seu exercício seja compatível com o bem-estar social. Em suma, é necessário que o uso da liberdade e da propriedade esteja entrosado com a utilidade coletiva, de tal modo que não implique uma barreira capaz de obstar à realidade dos objetivos públicos.
(…)
A polícia administrativa manifesta-se tanto através de atos normativos e de alcance geral quanto de atos concretos e específicos. (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. SP: Malheiros, 2012, p. 851)
4.1. No caso aqui tratado (crédito de tributo administrado pela RFB reconhecido por sentença transitada em julgado), há o exercício legítimo do direito de o contribuinte realizar a compensação (vale dizer, o pagamento daquele valor a ele com a quitação de seus débitos tributários), mas que deve ser limitado mediante análise percuciente da Administração Pública se aquele crédito efetivamente existe e se sua quantificação está escorreita (no caso de sentença ilíquida), conforme conceito apontado acima. O interesse público, nesse caso, evidentemente não é impedir essa compensação, mas sim que seja feita corretamente.
4.2. O servidor público que atua nessa situação está reconhecendo e quantificando uma dívida da Fazenda Nacional. Por tal motivo, a RFB possui o denominado poder de polícia (ou polícia administrativa), que se dá quando determina que o sujeito passivo realize uma declaração (o que é denominado obrigação acessória pelo § 2º do art. 113 do CTN, com a instituição pela RFB determinada pelo art. 16 da Lei nº 9.779, de 1996).
4.3. A habilitação prévia de créditos decorrentes de ação judicial, que está dentro do procedimento para reconhecimento desses créditos contido no art. 82 da IN RFB nº 1.300, de 2012, na atribuição conferida pelo § 14 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, é típico procedimento estabelecido a fim de garantir que a declaração de compensação de crédito reconhecido judicialmente não ocorra de forma que possa lesionar o interesse público. Transcreve-se o dispositivo, a fim de corroborar o aqui exposto:
Art. 82 . Na hipótese de crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, a Declaração de Compensação será recepcionada pela RFB somente depois de prévia habilitação do crédito pela DRF, Derat, Demac/RJ ou Deinf com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo.
§1º A habilitação de que trata o caput será obtida mediante pedido do sujeito passivo, formalizado em processo administrativo instruído com:
I – o formulário Pedido de Habilitação de Crédito Decorrente de Decisão Judicial Transitada em Julgado, constante do Anexo VIII a esta Instrução Normativa, devidamente preenchido;
II – certidão de inteiro teor do processo, expedida pela Justiça Federal;
III – cópia da decisão que homologou a desistência da execução do título judicial, pelo Poder Judiciário, e a assunção de todas as custas e honorários advocatícios referentes ao processo de execução, ou cópia da declaração pessoal de inexecução do título judicial protocolada na Justiça Federal e certidão judicial que a ateste, na hipótese de ação de repetição de indébito, bem como nas demais hipóteses em que o crédito esteja amparado em título judicial passível de execução;
IV – cópia do contrato social ou do estatuto da pessoa jurídica acompanhada, conforme o caso, da última alteração contratual em que houve mudança da administração ou da ata da assembleia que elegeu a diretoria;
V – cópia dos atos correspondentes aos eventos de cisão, incorporação ou fusão, se for o caso;
VI – cópia do documento comprobatório da representação legal e do documento de identidade do representante, na hipótese de pedido de habilitação do crédito formulado por representante legal do sujeito passivo; e
VII – procuração conferida por instrumento público ou particular e cópia do documento de identidade do outorgado, na hipótese de pedido de habilitação formulado por mandatário do sujeito passivo.
§ 2º Constatada irregularidade ou insuficiência de informações nos documentos a que se referem os incisos I a VII do § 1º, o requerente será intimado a regularizar as pendências no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data de ciência da intimação.
§ 3º No prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da protocolização do pedido ou da regularização de pendências de que trata o § 2º, será proferido despacho decisório sobre o pedido de habilitação do crédito.
§ 4º O pedido de habilitação do crédito será deferido pelo titular da DRF, Derat, Demac/RJ ou Deinf, mediante a confirmação de que:
I – o sujeito passivo figura no polo ativo da ação;
II – a ação refere-se a tributo administrado pela RFB;
III – a decisão judicial transitou em julgado;
IV – o pedido foi formalizado no prazo de 5 (cinco) anos da data do trânsito em julgado da decisão ou da homologação da desistência da execução do título judicial; e
V – na hipótese de ação de repetição de indébito, bem como nas demais hipóteses em que o crédito esteja amparado em título judicial passível de execução, houve a homologação pelo Poder Judiciário da desistência da execução do título judicial e a assunção de todas as custas e honorários advocatícios referentes ao processo de execução, ou a apresentação de declaração pessoal de inexecução do título judicial protocolada na Justiça Federal e de certidão judicial que a ateste.
§ 5º Será indeferido o pedido de habilitação do crédito nas hipóteses, em que:
I – as pendências a que se refere o § 2º não forem regularizadas no prazo nele previsto; ou
II – não forem atendidos os requisitos constantes do § 4º.
§ 6º É facultado ao sujeito passivo apresentar recurso hierárquico contra a decisão que indeferiu seu pedido de habilitação, no prazo de 10 (dez) dias, contados da data da ciência da decisão recorrida, nos termos dos arts. 56 a 65 da Lei nº 9.784, de 1999.
§ 7º O deferimento do pedido de habilitação do crédito não implica homologação da compensação ou alteração do prazo prescricional quinquenal do título judicial referido no inciso IV do § 4º.
5. Note-se que os documentos exigidos para o procedimento de habilitação prévia servem somente para a verificação de questões preliminares que numa execução contra a Fazenda Nacional seriam consideradas condições da ação, analisadas previamente à intimação da executada (Fazenda Nacional) pelo próprio juiz. Leonardo Carneiro da Cunha traz um roteiro dessa execução contra a Fazenda Nacional, ressaltando que ela é distinta das demais por envolver pagamentos da Fazenda Pública, do que se depreendem as semelhanças com o que é analisado no pedido de habilitação prévia:
Nesse caso, ou seja, sendo o executado a Fazenda Pública, não se aplicam as regras próprias da execução por quantia certa contra devedor solvente, não havendo a adoção de medidas expropriatórias para a satisfação do crédito. Diante da peculiaridade e da situação da Fazenda Pública, a execução por quantia certa contra ela intentada contém regras próprias. Põe-se em relevo, no particular, a instrumentalidade do processo, a impor adequação procedimental, na exata medida em que as exigências do direito material na disciplina das relações jurídicas que envolvem a Fazenda Pública influenciam e ditam regras processuais.
Isso porque os pagamentos feitos pela Fazenda Pública são despendidos pelo Erário, merecendo tratamento específico a execução intentada contra as pessoas jurídicas de direito público, a fim de adaptar as regras pertinentes à sistemática do precatório.
(…)
Desse modo, a execução por quantia certa contra a Fazenda Pública deve revestir-se de matiz especial, não percorrendo a senda da penhora, nem da apropriação ou expropriação de bens para alienação judicial, a fim de satisfazer o crédito executado.
Daí que se ajuíza a execução, com o procedimento capitulado pelo art. 730 do CPC, seguindo-se a oposição de embargos pela Fazenda Pública para, ao final, ser, então, expedido o precatório, em atendimento à regra inscrita no art. 100 da Constituição Federal de 1988. (CUNHA, Leonardo Carneiro. A Fazenda Pública em Juízo. SP: Dialética, 2012)
5.1. Nessa linha, fica fácil entender o porquê de a RFB determinar que para a apresentação da Declaração de Compensação (Dcomp) para créditos decorrentes de ação judicial exige-se a sua habilitação prévia pelo detentor. A par das condições da ação de uma execução contra a Fazenda Nacional (ou de outra ação judicial), em que o juiz deve analisar previamente à citação do executado (ou de qualquer réu), nos termos dos arts. 282 e 283 do CPC e, se não estiver de acordo, extinguir sem julgamento de mérito (art. 267 do CPC), a RFB criou a habilitação prévia a fim de verificar se os requisitos preliminares para a compensação que o sujeito passivo pretenda fazer existem. É possível fazer um paralelo entre os requisitos para a habilitação do crédito e as condições da ação: a certidão de inteiro teor do processo (possibilidade jurídica do pedido); desistência de execução da ação judicial (interesse de agir); cópia de contrato social, documentos de operação societária, referente à representação legal e procuração (legitimidade ativa e capacidade postulatória). São requisitos que o juiz também deve verificar para receber uma petição inicial, sob pena de indeferi-la. No presente caso, são requisitos preliminares que a RFB verifica a fim de permitir que o sujeito passivo apresente a Dcomp, já que com ela ele obtém o benefício econômico imediato, com análise posterior do mérito por parte da RFB, que pode nem acontecer, quando ocorre a homologação pelo decurso de tempo de que trata o § 5º do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996.
5.2 O STJ tem entendimento similar, conforme se depreende do REsp 1.309.265/RS, Rel. Min. Campbell Marques, DJe 3/5/2012:
TRIBUTÁRIO. DECLARAÇÃO DE COMPENSAÇÃO. ART. 74 DA LEI 9.430/96. LEGITIMIDADE DA EXIGÊNCIA DE PRÉVIA HABILITAÇÃO DO CRÉDITO JUDICIAL TRANSITADO EM JULGADO.
1. De acordo com os arts. 170, caput, do CTN, e 74, § 14, da Lei n. 9.430/96, e tendo em vista as condições à compensação tributária estipuladas no âmbito da Administração Tributária Federal, os créditos reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, desde 1º de março de 2005, somente podem ser objeto de compensação após prévia habilitação do crédito pela unidade da Receita Federal com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo. Ou seja, na hipótese de crédito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, a Declaração de Compensação somente será recepcionada após prévia habilitação do crédito pela Receita Federal. A habilitação será obtida mediante pedido do sujeito passivo titular do crédito, formalizado em processo administrativo. Constatada irregularidade ou insuficiência de informações nos documentos apresentados pelo sujeito passivo titular do crédito, o requerente será intimado a regularizar as pendências no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data de ciência da intimação. No prazo de 30 dias, contado da data da protocolização do pedido ou da regularização de pendências, será proferido despacho decisório sobre o pedido de habilitação do crédito. O deferimento do pedido de habilitação do crédito não implica homologação da compensação.
2. Não existe óbice à regulamentação quanto à forma e procedimentos para a efetivação da compensação tributária, bem como à imposição de limites ao seu exercício, por parte do legislador ordinário, desde que obedecidos aos parâmetros estabelecidos no Código Tributário Nacional. O pedido de habilitação de crédito reconhecido por decisão judicial visa a conferir segurança jurídica às compensações, restituições e ressarcimentos, garantindo, de forma preliminar, a viabilidade jurídica do crédito oponível à Fazenda Pública. Em outras palavras, a habilitação prévia revela-se mero juízo perfunctório quanto à existência do direito creditório. Traduz-se, então, na singela e expedita verificação quanto à plausibilidade do crédito que se pretende opor à Fazenda Pública, de forma a evitar fraudes e abusos. É, em síntese, um exame de admissibilidade, verdadeira busca do fumus boni iuris que passa ao largo de considerações quanto ao mérito da compensação (verificação de pagamentos, bases de cálculo utilizadas, índices de atualização aplicados, glosas de créditos já utilizados, etc). O pedido de habilitação também procura assegurar que os contribuintes não realizem, em duplicidade, o aproveitamento do valor econômico envolvido, quer dizer, mediante compensação e/ou restituição administrativa cumulada com a execução do julgado no âmbito do Poder Judiciário (grifou-se).
5.3. Correto o Ministro Campbell ao dizer que o pedido de habilitação busca evitar fraudes e abusos. Ele passou a ser exigido por ato da RFB para o contribuinte que pretenda compensar créditos tributários que tenham sido originados de processos judiciais em face de inúmeras fraudes e tentativas de se compensarem créditos vedados por expressa disposição legal, apostando numa provável homologação tácita da compensação. Trata-se de um exame prévio e sumário apenas para verificar questões preliminares, tais como a existência do trânsito em julgado da decisão e a titularidade da ação judicial.
5.4. Do ponto de vista da eficiência administrativa, portanto, o procedimento é relevante, na medida em que confere à Administração a possibilidade de verificar, previamente à apresentação de declaração de compensação, determinados requisitos. É medida que respeita o princípio da razoabilidade, pois se exige que o sujeito passivo entregue previamente a RFB alguns documentos básicos e de fácil acesso, e para a Administração Tributária trouxe uma notável redução dos casos de fraude.
CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL
6. Verificando-se como ocorre o procedimento de compensação de créditos decorrentes de ação judicial transitada em julgado na via administrativa, cabe analisar o prazo prescricional para assim proceder. Note-se que a Lei nº 9.430, de 1996, no seu art. 74, a despeito de dispor sobre tal forma de compensação, nada disse sobre o prazo prescricional para apresentar a Dcomp decorrente da ação judicial, apenas prevendo o prazo para a Fazenda Nacional homologá-la ou não.
6.1. Cabe separar duas situações distintas: (i) o pedido de restituição, ressarcimento e Declaração de Compensação, requerendo o reconhecimento do indébito pela própria Administração Pública; (ii) a declaração de compensação em que o reconhecimento daquele crédito do contribuinte deu-se na via judicial. Na primeira circunstância, o que se requer é que a RFB analise o mérito da lide, quer dizer, se procede ou não aquele pedido ou se existe ou não o alegado crédito. Na segunda, a RFB simplesmente vai cumprir a sentença transitada em julgado, devendo-se analisar as questões formais (o que inclui eventual ocorrência de prescrição daquele crédito) e o quantum debeatur, no caso das sentenças ilíquidas. Mas é bom ressaltar que a regra-matriz que gerou o direito ao crédito surgiu com a sentença transitada em julgado.
6.2. Na primeira circunstância, não há dúvida quanto ao prazo decadencial para interpor o pedido administrativo de restituição/ressarcimento ou apresentar a Declaração de Compensação: cinco anos contados da extinção do crédito tributário a ser restituído, ressarcido ou compensado, ou da reforma de decisão condenatória, consoante dispõe o art. 168 do CTN:
Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:
I – nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;
II – na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.
6.3. Na segunda, entretanto, não há prazo expresso na legislação. O prazo do art. 168 do CTN (ou do art. 169, a depender do caso) é o prazo para interpor a ação judicial. O que se analisa aqui é o prazo prescricional após a ação judicial que gera um crédito decorrente de tributo federal em favor de um contribuinte, vale dizer, o prazo prescricional para extinguir o débito do Fisco. Não há que se falar em extinção de crédito tributário ou anulação de ação condenatória de que trata o art. 168 do CTN. Entretanto, como a lei que disciplinou a forma de compensação de créditos decorrente de ação judicial (art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996) não dispôs sobre essa contagem (assim como fez com o prazo para homologação de cinco anos da Dcomp), cabe ao intérprete fazê-lo.
7. A tese de imprescritibilidade não pode prevalecer. Em prol da segurança jurídica, no direito tributário e processual tributário sempre há prazos extintivos para realizar um direito, pretensão ou ação, seja por parte do contribuinte, seja por parte da Administração Pública. A tese de imprescritibilidade estaria eivada de inconstitucionalidade, tendo em vista que a Constituição Federal traz expressamente os escassos casos em que ela ocorre.
8. Resta, portanto, com fulcro no inciso I do art. 108 do CTN, utilizar a analogia. Existem duas opções: aplicação do art. 168 do CTN ou do Decreto nº 20.910, de 1932.
8.1. Quanto ao art. 168 do CTN, ele é taxativo quanto às hipóteses para sua aplicabilidade, em que o dies a quo é necessariamente a extinção do crédito tributário ou a anulação de uma decisão condenatória.
8.2. A outra opção é a utilização do Decreto nº 20.910, de 1932, já que ele tem um espectro bastante amplo, principalmente quando dispõe da sua aplicabilidade para qualquer dívida passiva da União.
8.3. Tal discussão fica um pouco prejudicada, pois ambos os dispositivos trazem o prazo de cinco anos. O que resta dúvida é acerca da contagem desse prazo.
9. Na linha do item 6.1, a restituição do indébito pode se dar mediante processo administrativo em que a própria Administração reconhece o indébito em favor do contribuinte (o que inclui a homologação de Declaração de Compensação), ou somente após ação judicial transitada em julgado (interposta após negativa de ação administrativa ou diretamente). O contribuinte deverá respeitar os prazos dos arts. 168 e 169 do CTN para assim proceder, seja em que instância for.
9.1. Na via administrativa, é o despacho decisório (ou acórdão que deu provimento a recurso) que defere a restituição, que reconhece o direito do sujeito passivo, a despeito de ter efeito condenatório à própria Fazenda Nacional. Reconhecido o direito, a Fazenda Nacional, depois de eventual compensação de ofício, evidentemente tem o dever de dar cumprimento àquela sua decisão, o que é feito de ofício.
9.2. O caso aqui tratado é em relação ao indébito que foi constituído por uma sentença transitada em julgado, cujo prazo do art. 168 ou 169 do CTN foi respeitado para sua interposição. Entretanto, ao contrário do indébito reconhecido administrativamente, o judicial demanda algumas formalidades extras, como a interposição de sua execução (separação entre ação de conhecimento e de execução ainda existente nas ações contra a Fazenda Nacional), inexistente evidentemente em âmbito administrativo. Para a circunstância de ação reconhecendo crédito do contribuinte decorrente de tributo federal, a lei ordinária, como já visto, criou a possibilidade de o contribuinte realizar compensação em âmbito administrativo. A celeuma objeto do presente Parecer Normativo apenas ocorre por existência de lacuna na Lei nº 9.430, de 1996, e não no CTN. Mas tal opção não altera a natureza jurídica dessa compensação, que nada mais é do que forma de execução da sentença transitada em julgado.
10. Segundo o STJ, “a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que é de cinco anos, contados a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória, o prazo prescricional para a propositura da ação executiva contra a Fazenda Pública, em conformidade com a Súmula n. 150/STF”. (Resp 1.248.517/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 9/6/11). Logo, não há razoabilidade em conceder prazos distintos para os casos em que a mera “execução” da sentença transitada em julgado se dê via ação judicial para pagamento por precatório ou via administrativa por compensação. Desse modo, o prazo para apresentar uma Dcomp é de cinco anos, contados do trânsito em julgado da sentença ou da homologação da desistência da execução contra a Fazenda Nacional.
11. Entretanto, como já visto, para a apresentação da Dcomp, o sujeito passivo que apurou o crédito deve apresentar o pedido de habilitação prévia dos créditos, nos termos do art. 82 da IN RFB nº 1.300, de 2012. A questão é se tal pedido influi na contagem do prazo prescricional para apresentação da Dcomp.
11.1. O posicionamento da RFB é que a aplicação do prazo para execução da sentença, aí incluído para apresentar a Dcomp, é de cinco anos por uma construção sistêmica, e não entende que há aplicação do art. 168 do CTN nem que se trata de normas gerais de direito tributário, o que necessitaria de lei complementar para seu disciplinamento, por força da alínea “a” do inciso III do art. 146 da CF.
11.2 Note-se que neste Parecer Normativo analisa-se apenas a execução/liquidação da sentença que já concedeu o direito creditório ao contribuinte. O prazo para interposição da ação judicial realmente deve se dar mediante lei complementar, mas não é o caso para sua execução mediante compensação. Foi o art. 170 do CTN que deixou à lei (ordinária, portanto) dispor como realizar a compensação. Tanto que o art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, trouxe a possibilidade de existir uma Declaração de Compensação que já extingue o débito tributário com posterior homologação no prazo de cinco anos. Se essa lei ordinária dispusesse que a compensação somente se daria após pedido (como ocorre com a restituição, por exemplo), evidentemente que a Dcomp como existe hoje seria impossível. E mais: uma interpretação de que o prazo para apresentar a Dcomp após a sentença somente se daria por lei complementar é o mesmo que dizer que todo o instituto de compensação tributária deveria estar disciplinada por lei complementar. Nunca houve decisão judicial nesse sentido, muito pelo contrário. Cita-se julgado que corrobora o aqui exposto:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. DIREITO À REPETIÇÃO. CONTRIBUIÇÃO AO PIS. DECRETOS-LEI Nº 2.445/88 E 2.449/88. TRÂNSITO EM JULGADO. EXECUÇÃO DA SENTENÇA. DESISTÊNCIA. PEDIDO DE HABILITAÇÃO DE CRÉDITO. COMPENSAÇÃO. PRAZO DE CINCO ANOS. DECRETO Nº 20.910/32.
1. A prescrição, em favor da Fazenda Pública, para execução de crédito em favor do contribuinte, não se confunde com a regra de prescrição tributária nem exige lei complementar, estando disciplinada pelo Decreto nº 20.910/32, que fixa prazo de cinco anos, com uma única interrupção, e retomada pela metade do prazo inicial (artigos 8º e 9º). (…)
(AC 2008.61.00.020781-0/SP, Rel. Des. Fed. Carlos Muta, TRF3, Terceira Turma, julgado em 03/12/2009, DJ 15/12/2009)
11.3. Desta feita, a melhor interpretação é que a interposição do pedido de habilitação suspende o prazo prescricional para apresentar a Dcomp, conforme dispõe o art. 4º do Decreto nº 20.910, de 1932:
Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano.
11.4. Tal entendimento é compartilhado pelo STJ. No seguinte julgado, ele entendeu que ao prazo para interpor a execução aplica-se o disposto no art. 168 do CTN, mas que o pedido de habilitação prévia impõe a aplicação do art. 4º do Decreto nº 20.910, de 1932:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU ERRO MATERIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. PRAZO PARA O AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO REFERENTE A CRÉDITO JUDICIALMENTE RECONHECIDO. ART. 168, II, C/C ART. 165, III, DO CTN. PRÉVIO PEDIDO DE HABILITAÇÃO DE CRÉDITO PERANTE A SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 4º DO DECRETO N. 20.910/32.
1. Não havendo omissão, obscuridade, contradição ou erro material, merecem ser rejeitados os embargos declaratórios interpostos que têm o propósito infringente.
2. A jurisprudência invocada pela embargante refere-se a situação de Pedido de Restituição Administrativa ou Pedido de Compensação. O caso em apreço diz respeito a Pedido de Habilitação de Crédito, procedimento que antecede o próprio Pedido de Restituição Administrativa ou de Compensação. De fato, o Pedido de Restituição Administrativa ou Compensação não suspende ou interrompe o prazo para o Pedido Judicial, até porque são alternativas que podem ser exercidas no mesmo prazo (art. 168, II, do CTN), mas quando a Administração Tributária cria procedimento prévio ao Pedido Administrativo, chama para este caso a aplicação do Decreto n. 20.910/32. Pensar de forma diferente significa entregar à Administração Tributária o poder de, com sua própria mora na apreciação do Pedido de Habilitação de Crédito, obstar o exercício do direito do contribuinte de repetir o indébito administrativamente (Pedido de Restituição Administrativa ou Compensação) ou judicialmente (Pedido de Restituição Judicial). (grifou-se)
3. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no EDcl no REsp 1.174.017/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, j. em 4/12/2012, DJe de 10/10/2012)
11.5. A questão da segurança jurídica também não pode ser ignorada. Segundo Heleno Torres:
Cientes dessas cautelas, define-se o princípio da segurança jurídica tributária, em uma proposta funcional, como princípio-garantia constitucional que tem por finalidade proteger expectativas de confiança legítima nos atos de criação ou de aplicação de normas, mediante certeza jurídica, estabilidade do ordenamento e confiabilidade na efetividade de direitos e liberdades, assegurada como direito público fundamental. (TORRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica: metódica da segurança jurídica do Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 186-187).
11.6. A interpretação no sentido da suspensão da contagem do prazo em referência é a que melhor se coaduna, do ponto de vista da segurança jurídica tributária, com a atual exigência de habilitação do crédito decorrente de ação judicial como condição prévia à apresentação da respectiva declaração de compensação. Desse modo, o período entre o pedido de habilitação e a ciência do seu deferimento definitivo no âmbito administrativo (o que inclui a habilitação do crédito após provimento de recurso) suspende o prazo prescricional para apresentar a Dcomp.
11.7. Esclareça-se, por fim, que o pedido de habilitação prévia apenas suspende o prazo prescricional para o sujeito passivo apresentar a Dcomp se ele cumprir tempestivamente eventuais intimações ou notificações decorrentes do processo de habilitação prévia, conforme art. 5º do Decreto nº 20.910, de 1932:
Art. 5º Não tem efeito de suspender a prescrição a demora do titular do direito ou do crédito ou do seu representante em prestar os esclarecimentos que lhe forem reclamados ou o fato de não promover o andamento do feito judicial ou do processo administrativo durante os prazos respectivamente estabelecidos para extinção do seu direito à ação ou reclamação.
11.8. Nessa circunstância, caso o sujeito passivo for intimado a apresentar alguma documentação e não o fizer tempestivamente, do vencimento desse prazo o prazo prescricional volta a correr. O sujeito passivo deve sempre ter o cuidado de agir diligentemente para cumprir as intimações e notificações da autoridade fiscal e, se não puder fazer, que justifique tal fato e requeira prazo adicional, em analogia ao parágrafo único do art. 24 da Lei nº 9.784, de 1999.
12. Um último aspecto a ser analisado é em relação à situação em que o crédito do contribuinte é de um valor que demanda diversas Dcomp ao longo do tempo, quer dizer, tem um crédito, mas não o débito naquele valor para proceder à compensação em um único procedimento.
12.1. Segundo o art. 368 do Código Civil, “se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem” (grifou-se). Não obstante a compensação de crédito tributário possuir regra-matriz distinta daquela do Código Civil, o conceito teórico da compensação aplica-se ao tributário, e neste fica evidente que ela é no valor exato em que há o encontro de contas.
12.2. No caso de crédito decorrente de ação judicial, pode ocorrer a situação de um sujeito ter um débito em valor igual ou superior ao seu crédito, o que permite realizar a compensação em um único procedimento, ou o contrário, ter um crédito superior ao débito que vai demandar diversos procedimentos de compensação.
12.3. Nesse último caso, o prazo prescricional para apresentar a Dcomp apenas é interrompido com a efetiva apresentação da Dcomp que extingue aquele valor. Por exemplo, se o sujeito passivo tiver de proceder a cinco compensações para ter o seu crédito com o Fisco quitado, o prazo da primeira Dcomp apenas é interrompido no valor nela declarado. Para o restante do seu crédito, o sujeito passivo continua tendo o prazo prescricional correndo contra si. Conforme decidido pelo CARF, “nos casos em que não existe pedido de restituição e sim pedido (sic) de compensação, envolvendo parte do crédito, em relação ao saldo não há interrupção da prescrição.” (4ª Câmara, 2ª Turma, Acórdão nº 1402-001.790, 27 de agosto de 2014). Ressalte-se que não obstante o acórdão falar equivocadamente em pedido de compensação, claro está pelo seu teor que se trata da Declaração de Compensação.
12.4. Note-se que tal raciocínio decorre da sistemática da Declaração de Compensação, em que o contribuinte já procede à compensação, tem seu benefício econômico imediato e a RFB a homologa ou não. O raciocínio de que uma primeira compensação já interromperia o prazo prescricional para o saldo iria de encontro a essa sistemática, pois somente seria possível se o procedimento de compensação tributária fosse realizado mediante pedido e dependesse do deferimento da autoridade fiscal.
12.5. Desta feita, o sujeito passivo, ao realizar a opção de compensar os seus créditos tributários decorrentes de ação judicial transitada em julgado, deve realizar um adequado planejamento para verificar se vai ter débito suficiente em tempo hábil para não ter parte do seu direito creditório fulminado pela prescrição.
13. Enquanto não houver alteração na legislação ou no procedimento de controle desses créditos por parte da RFB, a interpretação contida nesse Parecer Normativo é a que prevalece no âmbito da RFB.
Conclusão
14. Com base no exposto, conclui-se que:
a) O crédito tributário decorrente de ação judicial pode ser executado na própria ação judicial para pagamento via precatório ou requisição de pequeno valor ou, por opção do sujeito passivo, ser objeto de compensação com débitos tributários próprios na via administrativa.
b) Ao fazer a opção pela compensação na via administrativa, o sujeito passivo sujeita-se ao disciplinamento da matéria feito pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, especificamente a Instrução Normativa nº1.300, de 2012, conforme § 14 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, e às demais limitações legais.
c) Para a apresentação da Declaração de Compensação, o sujeito passivo deverá ter o pedido de habilitação prévia deferido.
d) A habilitação prévia do crédito decorrente de ação judicial é medida que tem por objetivo analisar os requisitos preliminares acerca da existência do crédito, a par do que ocorre com a ação de execução contra a Fazenda Nacional, quais sejam, legitimidade do requerente, existência de sentença transitada em julgado e inexistência de execução judicial, em respeito ao princípio da indisponibilidade do interesse público.
e) O prazo para a compensação mediante apresentação de Declaração de Compensação de crédito tributário decorrente de ação judicial é de cinco anos, contados do trânsito em julgado da sentença que reconheceu o crédito ou da homologação da desistência de sua execução.
f) No período entre o pedido de habilitação do crédito decorrente de ação judicial e a ciência do seu deferimento definitivo, o prazo prescricional para apresentação da Declaração de Compensação fica suspenso no âmbito administrativo
g) O crédito habilitado pode comportar mais de uma Declaração de Compensação, todas sujeitas ao prazo prescricional de cinco anos do trânsito em julgado da sentença ou da extinção da execução, não havendo interrupção da prescrição em relação ao saldo.
h) Eventual mudança de interpretação sobre a matéria será aplicável somente a partir de sua introdução na legislação tributária.
À consideração superior.
EDUARDO GABRIEL DE GÓES VIEIRA FERREIRA FOGAÇA
Auditor-Fiscal da RFB
Chefe da Dinog
De acordo. À consideração do Coordenador-Geral de Tributação.
MIRZA MENDES REIS
Auditora-Fiscal da RFB
Coordenadora da Copen
De acordo. À consideração do Subsecretário de Tributação e Contencioso.
FERNANDO MOMBELLI
Auditor-Fiscal da RFB
Coordenador-Geral de Tributação
De acordo. Encaminhe-se ao Secretário da Receita Federal do Brasil, para aprovação.
PAULO RICARDO DE SOUZA CARDOSO
Auditor-Fiscal da RFB
Subsecretário de Tributação e Contencioso
Aprovo. Publique-se no Diário Oficial da União. Após, retorne-se à consulente.
CARLOS ALBERTO FREITAS BARRETO
Auditor-Fiscal da RFB
Secretário da Receita Federal do Brasil