As diferenças no cálculo da depreciação de bens do ativo imobilizado decorrentes do disposto no § 3º do art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976, com as alterações introduzidas pela Lei nº11.638, de 2007, e pela Lei nº 11.941, de 2009, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007. DOU 09/08/2011.
Dúvidas têm sido suscitadas no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) acerca da dedutibilidade da depreciação de bens do ativo após a entrada em vigor do Regime Tributário de Transição (RTT), de que trata o art. 15 da Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009.
2. A dúvida decorre, principalmente, das alterações nos critérios adotados para fins de cálculo da depreciação dos bens do ativo imobilizado, provocadas principalmente pela inclusão do § 3ºdo art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das S.A.), pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pela Lei nº 11.941, de 2009.
3. Há quem sustente a ideia de que as alterações introduzidas na Lei nº 6.404, de 1976, supracitadas, não poderiam ter efeitos fiscais, tendo em vista o disposto no art. 15 da Lei nº 11.941, de 2009, uma vez que o RTT buscaria a neutralidade tributária:
“Art. 15. Fica instituído o Regime Tributário de Transição – RTT de apuração do lucro real, que trata dos ajustes tributários decorrentes dos novos métodos e critérios contábeis introduzidos pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei.
§ 1º O RTT vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária.” (grifos não são do original)
4. Por outro lado, há os que defendem que a revisão dos critérios para determinação da vida útil estimada e para cálculo da depreciação, exaustão e amortização não seria hipótese de adoção de novos métodos e critérios contábeis e, portanto, não caberia a supracitada neutralidade.
5. Esclareça-se, inicialmente, que para fins de apuração do imposto sobre a renda pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, a legislação tributária determina que o lucro líquido do exercício deve ser apurado com observância das disposições da Lei nº 6.404, de 1976, conforme expressamente previsto no inciso XI do art. 67 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977.
6. O lucro líquido, por sua vez, é definido pelo art. 248 do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 – Regulamento do Imposto de Renda (RIR/1999), que assim dispõe:
“Art. 248. O lucro líquido do período de apuração é a soma algébrica do lucro operacional (Capítulo V), dos resultados não operacionais (Capítulo VII), e das participações, e deverá ser determinado com observância dos preceitos da lei comercial (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art.6º, § 1º, Lei nº 7.450, de 1985, art.18, e Lei nº 9.249, de 1995, art.4º).”
7. Uma vez determinado o lucro líquido, partindo-se da lei comercial, obtém-se o lucro real após os ajustes de adições, exclusões ou compensações, de acordo com o previsto no art. 247 do RIR/1999:
“Art. 247. Lucro real é o lucro líquido do período de apuração ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas por este Decreto (Decreto-lei nº 1.598, de 1977, art. 6º). (grifos não são do original)
§ 1º A determinação do lucro real será precedida da apuração do lucro líquido de cada período de apuração com observância das disposições das leis comerciais (Lei nº 8.981, de 1995, art.37, §1º).”
8. Com relação à dedutibilidade da depreciação de bens do ativo, o art. 305 do RIR/1999 esclarece que:
“Art. 305. Poderá ser computada, como custo ou encargo, em cada período de apuração, a importância correspondente à diminuição do valor dos bens do ativo resultante do desgaste pelo uso, ação da natureza e obsolescência normal (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57).”
9. O art. 307 do RIR/1999 trata dos bens passíveis de serem objeto de depreciação, enquanto que o art. 309 trata da quota de depreciação:
“Art. 309. A quota de depreciação registrável na escrituração como custo ou despesa operacional será determinada mediante a aplicação da taxa anual de depreciação sobre o custo de aquisição dos bens depreciáveis (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 1º).”
(grifos não são do original)
10. Ressalte-se que o RIR/1999 determina que a quota de depreciação a ser considerada como custo ou despesa deve ser aquela registrada na escrituração.
11. A taxa anual de depreciação deve ser fixada em função do prazo durante o qual se possa esperar utilização econômica do bem pelo contribuinte, na produção de seus rendimentos, conforme preceitua o art. 310 do RIR/1999:
“Art. 310. A taxa anual de depreciação será fixada em função do prazo durante o qual se possa esperar utilização econômica do bem pelo contribuinte, na produção de seus rendimentos (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 2º).
§ 1º A Secretaria da Receita Federal publicará periodicamente o prazo de vida útil admissível, em condições normais ou médias, para cada espécie de bem, ficando assegurado ao contribuinte o direito de computar a quota efetivamente adequada às condições de depreciação de seus bens, desde que faça a prova dessa adequação, quando adotar taxa diferente (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 3º).”
12. A Instrução Normativa SRF nº 162, de 31 de dezembro de 1998, definiu a quota de depreciação a ser registrada na escrituração da pessoa jurídica, como custo ou despesa operacional, a partir da aplicação de taxas de depreciação para diferentes tipos de bens constantes em seu Anexo I.
13. Conforme o § 1º do art. 310 do RIR/1999, caso o contribuinte utilize taxa de depreciação diferente daquela prevista na Instrução Normativa SRF nº 162, de 1998, deverá fazer prova de sua adequação. Por esse motivo, via de regra, o contribuinte utilizava para o cálculo dos encargos de depreciação as taxas especificadas pela RFB.
14. Porém, a contabilidade brasileira sofreu inúmeras modificações a partir do início de 2008. A Lei nº 6.404, de 1976, parâmetro básico para a contabilidade no Brasil, no processo de aproximar os registros contábeis brasileiros às regras definidas na contabilidade internacional, foi profundamente modificada pela Lei nº 11.638, de 2007, e pela Lei nº 11.941, de 2009.
15. Entre as alterações acima citadas, houve a inclusão do § 3º ao art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976, nos seguintes termos:
“Art. 183. No balanço, os elementos do ativo serão avaliados segundo os seguintes critérios:
(…)
§ 3º A companhia deverá efetuar, periodicamente, análise sobre a recuperação dos valores registrados no imobilizado e no intangível, a fim de que sejam:
(…)
II – revisados e ajustados os critérios utilizados para determinação da vida útil econômica estimada e para cálculo da depreciação, exaustão e amortização.”
16. Até dezembro de 2007, a regra de registro da depreciação limitava-se ao disposto no § 2º do art. 183, que estabelecia que a diminuição do valor dos elementos do ativo imobilizado seria registrada periodicamente nas contas de depreciação, quando correspondesse à perda do valor dos direitos que têm por objeto bens físicos sujeitos a desgaste ou perda de utilidade por uso, ação da natureza ou obsolescência.
17. Com a introdução do § 3º no art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976, a contabilidade estabeleceu um novo tratamento para a depreciação com base em sua “vida útil econômica estimada”. O Pronunciamento Técnico nº 27, emitido pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), que trata do ativo imobilizado, define a vida útil para fins contábeis como “o período de tempo durante o qual a entidade espera utilizar o ativo; ou o número de unidades de produção ou de unidades semelhantes que a entidade espera obter pela utilização do ativo”.
18. Conforme a nova regra contábil, a empresa deve avaliar o período de tempo em que pretende manter o bem e estimar o seu valor residual para obter a taxa de depreciação.
19. Em que pese a norma tributária definir que a taxa de depreciação deve ser avaliada em função do prazo durante o qual se possa esperar a “utilização econômica do bem”, essa avaliação está relacionada essencialmente com o desgaste físico do bem. Já o novo critério adotado pela contabilidade tem como base o tempo em que o bem gerará benefícios econômicos para a empresa.
20. Outra diferença verificada refere-se ao valor do bem que estará sujeito à aplicação da taxa de depreciação. Na regra tributária, conforme art. 309 do RIR/1999, a despesa deve ser calculada mediante a aplicação da taxa de depreciação sobre o custo de aquisição dos bens depreciáveis, portanto, o valor depreciável é igual ao valor do ativo. A regra contábil exige a atribuição de valor residual para o bem, consequentemente, seu valor depreciável é determinado após a dedução de seu valor residual.
21. Observe-se que o RTT, opcional para os anos de 2008 e 2009, passou a ser obrigatório a partir de 2010 (pelo menos enquanto não for publicada norma que discipline os efeitos tributários decorrentes das alterações dos novos métodos e critérios contábeis introduzidos na Lei nº 6.404, de 1976, pela Lei nº 11.638, de 2007, e pela Lei nº 11.941, de 2009).
22. A sujeição ao RTT representa uma espécie de “âncora” na legislação fiscal vigente em 31 de dezembro de 2007, em função do disposto no art. 16 da Lei nº 11.941, de 2009, transcrito abaixo:
“Art. 16. As alterações introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.” (grifos não são do original)
23. Ressalte-se que o disposto no art. 16 da Lei nº 11.941, de 2009, corrobora o entendimento de que se deve buscar a neutralidade tributária durante o período de sujeição ao RTT, seja ele facultativo ou obrigatório. Dessa forma, os ajustes no cálculo da depreciação de bens do ativo imobilizado determinados pelo § 3º do art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976, não devem gerar efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT.
24. E qual a maneira de neutralizar esses efeitos?
25. A primeira ideia que surge é a de fazer um ajuste de exclusão no Livro de Apuração do Lucro Real (Lalur). Entretanto, conforme o art. 247 do RIR/1999 anteriormente citado, as exclusões precisam estar prescritas ou autorizadas na legislação tributária, o que não é o caso da situação ora em análise.
26. Encontra-se a resposta por meio da Instrução Normativa RFB nº 949, de 16 de junho de 2009, que regulamenta o RTT e instituiu o Controle Fiscal Contábil de Transição (Fcont). Importante destacar o disposto em seu art. 3º:
“Art. 3º A pessoa jurídica sujeita ao RTT, para reverter o efeito da utilização de métodos e critérios contábeis diferentes daqueles previstos na legislação tributária, baseada nos critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, nos termos do art. 2º, deverá:
I – utilizar os métodos e critérios da legislação societária para apurar, em sua escrituração contábil, o resultado do período antes do Imposto sobre a Renda, deduzido das participações;
II – utilizar os métodos e critérios contábeis aplicáveis à legislação tributária, a que se refere o art. 2º, para apurar o resultado do período, para fins fiscais;
III – determinar a diferença entre os valores apurados nos incisos I e II; e
IV – ajustar, exclusivamente no Livro de Apuração do Lucro Real (LALUR), o resultado do período, apurado nos termos do inciso I, pela diferença apurada no inciso III.
§ 1º Para a realização do ajuste específico, de que trata o inciso IV do caput, deverá ser mantido o controle definido nos arts. 7º a 9º.
§ 2º O ajuste específico no LALUR, referido no inciso IV, não dispensa a realização dos demais ajustes de adição e exclusão, prescritos ou autorizados pela legislação tributária em vigor, para apuração da base de cálculo do imposto.
§ 3º Os demais ajustes a que se refere o § 2º devem ser realizados com base nos valores mantidos nos registros do controle previsto nos arts. 7º a 9º.” (grifos não são do original)
27. O contribuinte sujeito ao RTT, portanto, primeiramente deve utilizar a Lei nº 6.404, de 1976, já considerando os métodos e critérios introduzidos pela Lei nº 11.638, de 2007, para chegar ao resultado societário.
28. Em um segundo momento, deve realizar ajustes específicos ao lucro líquido do período obtido conforme descrito no item 26, de modo a reverter o efeito da utilização dos novos métodos e critérios contábeis, encontrando-se o “resultado fiscal”, ou seja, resultado considerando a Lei nº 6.404, de 1976, vigente em 31 de dezembro de 2007.
29. Nesses ajustes específicos, de modo que seja obtida a neutralidade tributária, o contribuinte poderá considerar a dedutibilidade prevista na Instrução Normativa SRF nº 162, de 1998, durante sua sujeição ao RTT.
30. É importante notar que a diferença do encargo de depreciação a ser ajustado via Fcont terá como base o valor do ativo calculado com base nos critérios contábeis vigentes em 2007. Por exemplo, analise-se o caso de uma máquina adquirida pela empresa cujo valor registrado na contabilidade comercial é de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais), e seu valor constante no Fcont é de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais). A empresa considerou em sua escrituração comercial uma taxa de depreciação no período de 6% (seis por cento) e valor residual de R$ 2.000,00 (dois mil reais), e segundo a Instrução Normativa SRF nº 162, de 1998, a taxa de depreciação estabelecida é de 10% (dez por cento). A despesa de depreciação registrada na contabilidade comercial no período é de R$ 1.200,00 (20.000,00 x 6%), enquanto que para fins fiscais a despesa de depreciação seria de R$ 2.500,00 (25.000,00 x 10%). Portanto, o ajuste a ser efetuado é de R$ 1.300,00 (um mil e trezentos reais).
31. Por força do art. 21 da Lei nº 11.941, de 2009, o mesmo raciocínio deve ser aplicado na apuração da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e para efeito do cálculo dos créditos no regime de apuração não cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
32. De todo o exposto, conclui-se que:
32.1. As diferenças no cálculo da depreciação de bens do ativo imobilizado decorrentes do disposto no § 3º do art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976, com as alterações introduzidas pela Lei nº11.638, de 2007, e pela Lei nº 11.941, de 2009, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
32.2. O contribuinte deverá efetuar o ajuste dessas diferenças no Fcont e, consequentemente, proceder ao ajuste específico no Lalur, para considerar o valor do encargo de depreciação correspondente à diferença entre o encargo de depreciação apurado considerando a legislação tributária e o valor do encargo de depreciação registrado em sua contabilidade comercial.
À consideração superior.
PAULO ALEXANDRE CORREIA RIBEIRO ]
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil
De acordo. À consideração da Coordenadora da Coordenação de Tributos sobre a Renda, Patrimônio e Operações Financeiras (Cotir) e do Coordenador da Coordenação de Tributos sobre a Produção e o Comércio Exterior (Cotex).
RICARDO SILVA DA CRUZ
Chefe da DIRPJ
De acordo. Encaminhe-se ao Coordenador-Geral de Tributação.
CLÁUDIA LÚCIA PIMENTEL M. SILVA
Coordenadora da Cotir
JOÃO HAMILTON RECH
Coordenador da Cotex
Aprovo. Encaminhe-se ao Secretário da Receita Federal do Brasil, para aprovação.
FERNANDO MOMBELLI
Coordenador-Geral de Tributação
Subsecretário de Tributação e Contencioso
Substituto
Aprovo.
CARLOS ALBERTO FREITAS BARRETO
Secretário da Receita Federal do Brasil