Ao menos duas das propostas de reforma tributária em debate flertam com um tributo sobre movimentações ou transações financeiras. A primeira delas parte do governo federal, especificamente de pronunciamentos do Secretário Especial da Receita Federal Marcos Cintra. Pretende um tributo com alíquota de até 5%, sendo 2,5% devidos no débito e 2,5% devidos no crédito de cada pagamento efetuado.
A outra delas está documentada em proposta do Instituto Brasil 200, com o firme propósito de substituir tributos federais e, no futuro, tributos estaduais e municipais. Pretende-se a ele atribuir o “status” de tributo único, com alíquota também na ordem de 5%.
Os argumentos que atestam a ineficiência de tributos desta natureza já são por todos conhecidos e atestados por balizados estudos técnicos (vide “Tributos sobre Movimentação Financeira – Nota Técnica n.1 – Endeavor Brasil – 2019/02”).
Não apenas haverá incentivo à utilização de moeda corrente para a realização de operações financeiras e consequente incremento da informalidade. Mas haverá efeitos perversos na economia, como o encarecimento do crédito (especialmente de curto prazo), a oneração da produção pela incidência cumulativa, regressividade, afetação de exportações, inviabilização de investimentos em ativos e mercado de ações, dentre inúmeras outras já experimentadas no Brasil e no exterior.
Alguns países mantem tributo similar com alíquotas baixíssimas apenas para efeitos fiscalizatórios, o que conceitualmente não parece ser uma má ideia. Aqui, a problemática seria a própria sanha arrecadatória que certamente sucederia um tributo concebido para este fim. No Brasil, as autoridades não gozam de credibilidade suficiente para permitir a abertura deste flanco.
Um tributo sobre movimentações financeiras faria do mercado de criptomoedas um atrativo caminho para fuga de tal obrigação. Não apenas as Bitcoins, como a recém-lançada Libra – moeda digital do Facebook – e outras em criação ou expansão, receberão significativo impulso em detrimento da arrecadação que ilusoriamente tais reformas pretendem obter. Este efeito não foi capturado, por extemporâneidade, pelos estudos mais antigos.
A ampliação do uso de tais moedas é inevitável. A Nova Zelândia, segundo noticiado pelo “Financial Times”, acaba de anunciar que legalizará o pagamento de empregados com criptomoedas, desde que em montantes fixos e regulares, além de ser atrelado a pelo menos alguma moeda oficial e passível de conversão em forma de pagamento normal para efeitos de tributação.
É o reconhecimento de uma livre opção daqueles que preferem receber em moedas alternativas. As autoridades locais definiram as criptomoedas como propriedade e não com dinheiro, mas, para efeitos de tributação, serão equiparadas ao dinheiro.
Um novo modelo de tributação deve observar a experiência pretérita, com seus erros e acertos, e também projetar o novo modelo às novas realidades que despontam no futuro.
O modelo não pode nascer velho e doente por desídia ou teimosia. Tampouco pode deixar de antever as tendências sociais e econômicas no plano internacional. Deve antecipar o futuro, modernizar o sistema e criar condições de rápido desenvolvimento ao país.
Fonte: Valor Econômico – Eduardo Salusse – 14 de agosto de 2019