A Receita Federal do Brasil publicou Consulta Interna nº 06, de 13 junho, que trata da habilitação e, principalmente, coabilitação do Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infra-Estrutura (Reidi). Este novo entendimento poderá alterar profundamente o modelo utilizado pelas empresas do setor, bem como poderá trazer contingências tributárias para os projetos já em curso.
O Reidi foi instituído pela Lei nº 11.488/2007 como um instrumento para fomentar a área de infraestrutura e construção por meio da suspensão e, posteriormente, aplicação de alíquota zero no caso das contribuições ao PIS e à Cofins na aquisição de equipamentos e materiais de construção e na contratação de serviços e aluguéis. Para usufruir desse benefício os contribuintes devem se habilitar na Receita Federal – somente podem se habilitar as empresas que detenham projeto aprovado para implantação de obras de infraestrutura nos setores de transportes, portos, energia, saneamento básico e irrigação.
Juntamente com a habilitação do titular do projeto, é permitido, ainda, a possibilidade de coabilitação no Reidi de outros contribuintes (normalmente empresas ligadas à construção civil, mas a legislação não limita a esse tipo de atividade). No entanto, a legislação delegou para o Poder Executivo a competência para determinar as diretrizes e demais questões inerentes à habilitação e coabilitação no regime.
A Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) surpreendeu ao trazer um terceiro entendimento sobre coabilitação no Reidi
Com efeito, foi editado o Decreto nº 6.144, de 03 de julho de 2007. No entanto, ao invés de apenas regulamentar o procedimento de adesão ao Reidi, limitou a coabilitação às pessoas jurídicas que detenham contratos cujo objetos tratem exclusivamente de execução de obra de construção civil.
Diante dessa limitação, os contribuintes apresentaram pedidos de esclarecimentos na Receita Federal do Brasil (solução de consulta), em especial sobre a abrangência e definição de “contrato de construção civil”. Inúmeras soluções foram publicadas com entendimentos divergentes, bem como um número ainda maior de contribuintes tiverem seus pedidos de coabilitação no Reidi rejeitados.
Diante desse cenário, a Consulta Interna nº 06/2018 foi apresentada pela Divisão de Tributação da Superintendência da Receita Federal do Brasil da 6ª Região Fiscal para que a Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) se manifestasse sobre o tema para acabar com o conflito de interpretações.
A grande questão referia-se aos contratos de empreitada global, os quais não apenas englobam a execução de obras de construção civil, mas o fornecimento de materiais e equipamentos. Em outras palavras, em uma interpretação literal do Decreto nº 6.144/2007 (que utiliza a expressão: exclusivamente a execução de obras de construção civil), uma empresa somente poderia ser coabilitada no Reidi no caso de prestação de serviços exclusivamente de construção civil, sem o fornecimento de qualquer outro serviço e/ou material.
No entanto, existiam decisões e soluções de consulta em sentido totalmente oposto, no qual o contrato de empreitada global era aceita para fins de coabilitação no Reidi, entendimento esse o mais difundido entre os operadores e profissionais da área. Nesse cenário, a Cosit surpreendeu ao trazer um terceiro entendimento.
Em suma, a Cosit entendeu que os chamados contratos de empreitada global estariam enquadrados dentro do conceito de construção civil para fins de coabilitação no Reidi, desde que os valores referentes aos serviços de construção sejam preponderantes sobre as demais prestações e equipamentos.
Esse é o novo entendimento, que deve vincular os órgãos de consulta da Receita Federal responsáveis pelo Reidi. Lembrando que as decisões que negam a habilitação ou mesmo a coabilitação podem ser questionadas administrativamente em instância única.
Importante destacar que a matéria também pode ser levada ao Judiciário, pois como mencionado anteriormente, a Lei nº 11.488/2007 não traz qualquer limitação à coabilitação de qualquer tipo de empresa no Reidi, desde que este esteja ligado a um projeto aprovado de titular já registrado no regime. Assim, o Decreto nº 6.144/2007, o qual deveria cuidar apenas das questões de diretrizes sobre o cadastro dos contribuintes, limitou a abrangência do programa.
Também não é clara qual será a postura da autoridade administrativa sobre os contribuintes que já se encontram habilitados ou mesmo coabilitados no Reidi, mas que não tenham a preponderância econômica conforme esse novo entendimento. O ajuizamento de ação judicial poderá ser a única alternativa.
Para os contribuintes que ainda não fizeram sua habilitação no Reidi e não estejam dispostas a enfrentar uma disputa administrativa ou mesmo judicial, a estrutura para tais projetos deve ser repensada.
Por Luis Claudio Yukio Vatari
Luis Claudio Yukio Vatari é sócio da área tributária de Toledo Marchetti Advogados, mestre em direito tributário pela FGV-SP e LLM em direito tributário pelo Insper-SP.
Fonte : Valor -09/07/2018