Em 05 de abril, a Receita Federal editou a IN RFB 1.881/2019 para atualizar as regras sobre a apuração do IRPJ/CSLL e das contribuições sociais (PIS/Cofins). Foram alterados diversos dispositivos da IN 1.700/2017, que consolida as diretrizes da RFB sobre a apuração e o recolhimento desses tributos.
Embora as alterações promovidas pela IN 1.881 sejam abrangentes, abarcando temas variados, um dos principais objetivos foi atualizar a IN 1.700 em face de recentes novidades na esfera contábil, em particular o CPC 47 (Receita) e o CPC 06 (Arrendamento Mercantil).
A IN 1.881 também consolidou regras sobre o conceito de “receita bruta” para obrigar as empresas a reconhecerem, por meio de subcontas, as diferenças entre a receita registrada para fins contábeis e aquela válida para fins tributários. Essa divergência de tratamento já existia desde a introdução do revogado CPC 30 e já era abordada em algumas orientações anteriores da RFB.
Alteração relevante é sobre as hipóteses de dedução fiscal envolvendo doações realizadas em favor de associações sem fins lucrativos
Em razão das novas regras contábeis aplicáveis às operações de arrendamento mercantil, vigentes a partir de 2019, a IN 1.881 procurou esclarecer qual o tratamento a ser adotado pelas empresas em relação às receitas financeiras, atualizações monetárias e aos juros a apropriar relacionados a tais operações, alinhando-se às disposições da Lei nº 12.973/2014. O objetivo principal das novas regras é neutralizar, sob o ponto de vista tributário, os efeitos gerados com o novo tratamento contábil (CPC 06).
Foram introduzidos, ainda, dispositivos acerca das atividades submetidas ao percentual de 32% para fins de apuração da base estimada do IRPJ/CSLL e do lucro presumido. O percentual aplica-se à exploração de rodovia, inclusive os serviços correlatos e, ainda, no caso de prestação de serviços de suprimento de água tratada e de coleta e tratamento de esgotos, quando desempenhados por concessionárias de serviços públicos.
Outra alteração relevante, que vinha gerando dúvidas, é sobre as hipóteses de dedução fiscal envolvendo doações realizadas em favor de associações sem fins lucrativos. Alinhando-se à legislação vigente, a nova redação da IN 1.700 esclarece que (i) é possível deduzir fiscalmente as doações a entidades civis sem fins lucrativos e (ii) a dedutibilidade independe tanto de certificação quanto de reconhecimento da condição de utilidade pública das beneficiárias, desde que respeitas as diretrizes das Leis 13.019/14 e 9.790/99.
A IN 1.881 introduziu, ainda, novas regras sobre o tratamento tributário das mais-valia, menos-valias e “goodwil”, em especial quanto ao controle na contabilidade e à forma de preenchimento das obrigações fiscais acessórias nas hipóteses de reorganização societária (fusão, cisão e incorporação). Além disso, foi introduzido um novo anexo à IN 1.700 contendo exemplos sobre o tratamento fiscal aplicável às participações em coligadas e controladas, particularmente no tocante às variações de patrimônio líquido de empresas controladas em razão do registro de AVJ, goodwill etc.
Em linha com as diretrizes da Lei Complementar 160/17, a IN 1.700 agora prevê expressamente que os incentivos e benefícios fiscais relativos ao ICMS são considerados “subvenções para investimento”, vedada a exigência de outros requisitos para assegurar a sua neutralidade para fins de IRPJ/CSLL (exceto pela exigência de registro contábil desses valores como reserva e de não distribuição aos sócios).
Cabe mencionar, ainda, as atualizações relativas à não incidência de IRRF na distribuição de JCP a entidades imunes, esclarecimentos quanto à forma de remuneração de dirigentes de instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, para fins do gozo de imunidade, e regras sobre o Programa Empresa Cidadã (dedução, do IRPJ devido, da remuneração paga a funcionário no período de prorrogação da licença-maternidade/ paternidade).
Por fim, os Anexos I e II da IN 1.700, que listam as hipóteses de adição e exclusão do lucro líquido, para fins de apuração do IRPJ/CSLL, foram integralmente atualizados, incluindo uma quantidade significativa de acréscimos em comparação com a versão anterior.
É importante ressaltar que, embora a IN 1.881 não possa alterar regras sobre a determinação da base de cálculo dos tributos nela tratados, por representar mera interpretação da RFB, as novas regras devem ser examinadas de forma cautelosa, diante dos efeitos imediatos quanto à escrituração fiscal e ao preenchimento de obrigações acessórias.
Além disso, é interessante notar que a constante atualização da IN 1.700 promovida pela RFB acaba por atribuir cada vez menos importância ao recém-publicado Regulamento do Imposto de Renda (Decreto 9.580/18), cuja função era consolidar as normas sobre a apuração do IRPJ/CSLL. Infelizmente, o “novo” RIR, que substituiu uma versão publicada em 1999, já nasceu defasado.
Por Ricardo Maitto
Ricardo Maitto é mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da USP e sócio do escritório Rayes & Fagundes Advogados.
Fonte: Valor-24/04/2019