Questão de grandes controvérsias entre os contribuintes, Judiciário e Fisco, e que se encontra parcialmente definido após o julgamento do Recuso Especial n° 1.221.170/PR pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), é o conceito de insumos para o devido creditamento e apuração das Contribuições PIS/Cofins, seja qual for a atividade da pessoa jurídica.
E o motivo decorre, de um lado, pelo fato de a nossa legislação sobre o conceito de insumos ser muito conflitante e, de outro, pelo surgimento de novas tecnologias que impactam diretamente na forma como os negócios acabam sendo estabelecidos. Uma das recentes discussões gira em torno da possibilidade de creditamento pelas empresas que atuam digitalmente sobre os valores despendidos à título de publicidade/propaganda e sobre as taxas cobradas pelas administradoras de cartões.
Os insumos ficaram reduzidos aos gastos diretamente utilizados na prestação de serviços.
Interessa-nos, nessa exposição jurídica, versar acerca do adequado tratamento tributário dos insumos pelas atividades desenvolvidas nos negócios digitais. Sabe-se que a economia digital é o resultado de um processo transformador trazido pela tecnologia da comunicação e mudança nos padrões de informação, modificando assim, os processos de negócios e promovendo a inovação em todos os setores da economia.
Como a economia digital – por meio de e-commerce, aplicativos e outras plataformas digitais – está se tornando cada vez mais a própria economia, seria incoerente que as normas tributárias fossem interpretadas sem levar em consideração as especificidades de tais atividades, como a essencialidade e relevância de suas despesas para efeitos de creditamento das contribuições PIS/Cofins.
Para uma melhor análise do tema, principiemos rememorando que legislador pátrio, ao tratar das contribuições PIS/Cofins, possibilitou que em algumas hipóteses os respectivos tributos sejam apurados pelo regime não cumulativo. Daí que, para a concretização da não cumulatividade das contribuições aqui discutidas, adotou-se o método subtrativo indireto ou também conhecido como “base contra base”, em que o crédito apurado deve ser descontado sobre uma base de débito (faturamento ou receita bruta).
Desrespeitando toda a lógica da não cumulatividade, por meio das Instruções normativas nº 247/02 e 404/04, a Receita Federal do Brasil introduziu em nosso ordenamento jurídico uma interpretação restritiva. Vê-se, daí, que os insumos ficaram reduzidos apenas aos gastos diretamente utilizados/aplicados na prestação de serviços. Ou seja, apenas os bens e serviços aplicados ou consumidos diretamente na atividade.
Todavia, após diversos questionamentos dos contribuintes, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.°1.221.170 sob o rito dos repetitivos, definiu que, para efeitos de creditamento das contribuições PIS/Cofins, o conceito de insumo deve ser construído com base em critérios de essencialidade ou relevância. Ou seja, deve ser levado em consideração a imprescindibilidade ou a importância das despesas incorridas para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada. Em consequência, e corretamente diga-se de passagem, foi declarada a ilegalidade das Instruções Normativas nº 247/2002 e nº 404/2004 da Receita Federal.
Dentro deste contexto, não restam dúvidas que as despesas decorrentes das taxas cobradas pelas administradoras de cartões de débito e crédito, bem como os valores despendidos com marketing e publicidade, são extremamente essenciais e relevantes para o desenvolvimento das atividades das empresas digitais, as quais não possuem presença física junto aos seus clientes.
No primeiro caso, a essencialidade resta caracterizada pelo fato de que a inexistência de estrutura física para contratação dos serviços ou aquisição de mercadorias das empresas digitais basicamente as obriga que os pagamentos sejam realizados à distância e processados de forma instantânea, ocorrendo, majoritariamente por cartões de débito e crédito. Nessas operações, ocorrem despesas decorrentes das taxas cobradas pelas administradoras de cartões de débito e crédito.
No segundo caso, as despesas incorridas com os serviços de publicidade e marketing também se amoldam ao conceito de essencialidade e relevância, visto que a inexistência de presença física dos negócios digitais traz a necessidade de divulgação de sua empresa através da contratação de serviços especializadas. Até porque, uma loja virtual, diferentemente de uma física, só teria suas atividades conhecidas pela ampla publicidade. Aqui, cumpre salientar que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) já possui decisões que reforçam os argumentos defendidos neste parágrafo.
Percebe-se, portanto, que em ambos os casos os posicionamentos aplicados aos negócios “tradicionais” não devem ser replicados aos negócios digitais, ante as especificidades de suas operações. Deste modo, é primordial, neste momento, aguardar os posicionamentos jurisprudenciais e administrativos acerca do adequado tratamento tributário das despesas aqui debatidas.
Fonte: Valor Econômico – Por Cassius Lobo – 04/05/2020.