A comissão do Congresso Nacional que analisa a Medida Provisória da “Liberdade Econômica” aprovou nesta quinta-feira a criação de um comitê que editará súmulas a serem seguidas por toda administração tributária federal – o que inclui Receita Federal e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional -, com base em julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
Na prática, os enunciados poderão orientar a atuação de um auditor fiscal no momento de autuar uma empresa, por exemplo. Contudo, o comitê será composto apenas por integrantes do próprio Carf, Receita e PGFN. Sem a participação de representante de uma das confederações empresariais, como a da Indústria (CNI).
A composição do comitê foi modificada no parecer divulgado na manhã desta quinta-feira após pressão da Receita e da PGFN e preocupa entidades patronais. A participação dessas entidades, afirmam fontes que atuaram na medida, garantiria paridade entre o governo e os contribuintes no novo comitê, como acontece atualmente no Carf.
Segundo uma fonte ligada ao setor empresarial, o que antes era um jogo que começava 0 a 0, agora já estará 3 a 0 a favor da Receita.
Essa preocupação é infundada, de acordo com Rogério Campos, assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Economia. Isso porque os enunciados tomarão como base súmulas, jurisprudência e casos repetitivos julgados pelo Carf.
Além disso, ele afirma que não se poderá criar essas normativas sem esse amparo legal.
“O comitê não cria tese”, segundo Campos, destacando que o texto da MP afirma que o comitê vai editar as súmulas seguindo parâmetros definidos pelo ministro da Economia e observando “os atos administrativos, normativos e decisórios praticados pelos referidos órgãos”.
Campos afirma também que o Carf não perderá poder. “É uma nova forma de vinculação. A súmula do Carf continua existindo”, diz. Hoje, os enunciados do Carf só se tornam vinculantes para toda a administração se aprovados pelo ministro da Economia. Passarão a poder ser aprovados também pelo comitê. “A tendência é que se dê efeito vinculante para mais súmulas feitas pelo Carf”.
Ainda falta a aprovação pelo Plenário da Câmara e do Senado, mas segundo o texto da MP, as súmulas poderão ser usadas para a PGFN desistir de contestar ou interpor recursos a decisões, inclusive abrindo mão de recursos já protocolados, para que auditores-fiscais da Receita e outros órgãos da administração pública que atuem com créditos tributários e não tributários não realizem autuações.
Análise
Entre advogados que atuam no Carf, a redação do artigo da MP da “Liberdade Econômica” deixou dúvidas. Para João Marcos Colussi, sócio do escritório Mattos Filho, considerando que o dispositivo está em uma MP que tem como objetivo a liberdade econômica, não se pode pensar que, por deixar de fora as confederações, o comitê foi criado para prejudicar os contribuintes. “A ideia é dar segurança jurídica para os temas elencados”, afirma.
Já Leandro Bettini, do mesmo escritório, vê com receio a inclusão do dispositivo na medida provisória. Caso o comitê baseie-se em julgamentos reiterados do Carf, poderá editar súmulas que barrem o acesso dos contribuintes à Câmara Superior em teses que costumam ser decididas contra eles. “É uma forma de ter um órgão sem a participação da sociedade civil”, diz.
FONTE: Valor Econômico – Por Raphael Di Cunto e Beatriz Olivon – 12 de julho de 2019