Neste breve estudo são discutidas as consequências – no plano do direito societário e no direito tributário – da distribuição de lucros ou dividendos que não estejam demonstrados em balanço regular ou em valor maior que o disponível.
A distribuição de dividendos é regida por normas de direito societário e de direito tributário. No plano do direito societário, de acordo com art. 109, I, da Lei n. 6.404/76, todo acionista tem direito de participar dos lucros e nem a assembleia nem o estatuto social pode suprimir total ou parcialmente esse direito. O mesmo princípio é aplicável aos sócios das sociedades regidas pelo Código Civil em razão do preceito contido no art. 1.008.
O direito de participar não implica no direito automático de receber lucros; assim, os sócios ou acionistas só podem pleitear o pagamento se: (a) se a apuração for provada em Balanço regularmente levantado; e, (b) houver decisão sobre a distribuição pelos administradores. Nem mesmo nos casos em que há a figura do dividendo obrigatório é exigível o pagamento antes da distribuição tendo em vista que o § 4º do art. 202 da Lei n. 6.404/76 é claro ao dispor que o pagamento não será obrigatório no exercício social em que os órgãos da administração informarem à assembleia-geral ordinária ser ele incompatível com a situação financeira da companhia.
A falta de observância das normas legais de direito societário tem graves consequências. De acordo o § 1º do art. 202 da Lei 6.404/76, a infração implica responsabilidade solidária dos administradores e fiscais, que deverão repor à caixa social a importância distribuída, sem prejuízo da ação penal que no caso couber.
O preceito do parágrafo seguinte afirma que os acionistas não são obrigados a restituir os dividendos que em boa-fé tenham recebido; todavia, presume-se a má-fé quando os dividendos forem distribuídos sem o levantamento do balanço ou em desacordo com os resultados deste. Na mesma linha, o preceito do art. 1.009 do Código Civil é claro ao estabelecer que a distribuição de “lucros ilícitos ou fictícios acarreta responsabilidade solidária dos administradores que realizarem e dos sócios que os receberem, conhecendo ou devendo conhecer-lhes a ilegitimidade”.
Além da distribuição de lucros é possível que a mesma ocorra com lastro em reservas de lucros e, excepcionalmente, com base em reservas de capital. Em princípio, as reservas de lucros podem ser distribuídas de acordo com as regras estatutárias, exceto a reserva legal que, por força do disposto no § 2º do art. 193 da Lei n. 6.404/76, não pode ser utilizada a não ser para aumento do valor do capital social ou absorção de prejuízos.
A distribuição de dividendos com lastro em reservas de capital está prevista no item V do art. 200 da Lei n. 6.404/76; de acordo com esse preceito, essa espécie de reserva pode ser utilizada para pagamento de dividendo a ações preferenciais, quando essa vantagem lhes for assegurada na forma do disposto no § 5º do art. 17 da referida Lei. Fora dessa circunstância especial essa espécie de reserva não pode servir de fonte para distribuição de dividendos porquanto a finalidade institucional das mesmas é reforçar e manter a integridade do capital social.
Na legislação do imposto há uma norma que concede isenção tributária quando da distribuição de dividendos. O art. 10 da Lei n. 9.249/95 estabelece que: “Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior”.
Para esclarecer sobre o sentido e o alcance desse preceito foi editado o art. 238 da IN 1.700/17. De acordo dom o § 3º do art. 238, os valores pagos ou creditados a sócio ou acionista ou ao titular da pessoa jurídica submetida ao regime de tributação com base no lucro real, presumido ou arbitrado, a título de lucros ou dividendos distribuídos, corresponderá ao montante dos lucros disponíveis (do próprio período ou de período anteriores) acrescido das reservas de lucros formadas no período ou em períodos anteriores.
Havendo distribuição de valor excedente, essa parcela (o excesso) deverá ser submetida à tributação nos termos do art. 61 da Lei nº 8.981, de 1995, que exige a tributação na fonte pela alíquota de 35% (trinta e cinco por cento) calculada em “gross up”, isto é, o rendimento pago é considerado líquido, de modo que a alíquota efetiva é próxima de 53% (cinquenta e três por cento). Os pagamentos, em tais circunstâncias, são considerados “pagamentos sem causa” já que são dividendos distribuídos de má-fé, como são qualificados pelas normas de direito societário.
Ao determinar a aplicação da alíquota de 35%, a norma modifica as regras regulamentares vigentes até então, que impunham a aplicação da tabela do IRF das pessoas físicas ou as alíquotas de 25% ou 25% em relação aos valores pagos aos sócios ou acionistas residentes ou domiciliados no exterior. Trata-se, portanto, de uma nova interpretação dada pelas autoridades fiscais e que – na minha modesta opinião – só pode ser aplicada aos fatos (pagamentos) feitos após 1º de janeiro de 2018.
Fonte: Portal Contábeis – 07/01/2019
POR: EDMAR OLIVEIRA ANDRADE FILHO