A Justiça Federal de Barueri (SP) determinou que a Receita Federal analise novamente o pedido de restituição de tributos de uma empresa, protocolado em 2001, sem a apresentação de documentos suplementares exigidos recentemente. A juíza Marilaine Almeida Santos, da 2ª Vara Federal de Barueri, entendeu que o contribuinte não é obrigado a guardar eternamente documentos, “sobretudo quando já passados mais de 16 anos da ocorrência dos fatos neles contidos”.
Para advogados, a decisão é inovadora. O caso envolve uma indústria alemã com sede em São Paulo, que busca créditos de PIS e Cofins incidentes sobre comissões recebidas do exterior. Diante da demora, a empresa resolveu em 2016 entrar com um mandado de segurança, com pedido de liminar, para que a Receita Federal analisasse o caso.
Ao ser notificada para dar cumprimento à liminar, a Receita Federal, segundo o advogado da empresa, Allan George de Abreu Fallet, do De Goye Advogados Associados, limitou-se a intimar o contribuinte para a apresentação de documentos jamais solicitados, no período de quase 17 anos de tramitação do processo administrativo.
“Em que pese a dificuldade de se apresentar documentos fiscais antigos, a empresa cumpriu parcialmente a solicitação, atendendo a uma série de termos de intimação expedidos pelas autoridades administrativas. Contudo, a Receita Federal proferiu o despacho decisório negando o direito pleiteado pela falta de comprovação da efetiva prestação de serviços ao exterior”, diz o advogado.
De acordo com o despacho da Receita, o interessado “não logrou êxito em comprovar documentalmente que os serviços prestados, que deram origem ao pagamento das comissões, foram de fato exportados, e não prestados em território nacional”. Para o órgão, “restaram afastados os pressupostos de liquidez e certeza relativos ao crédito pleiteado pelo contribuinte”.
Após o despacho, a empresa voltou à Justiça pedindo a análise da restituição independentemente da apresentação dos documentos solicitados que comprovariam a existência do crédito. O pedido de liminar foi acatado pela 2ª Vara Federal de Barueri (processo nº 5002210-19.2017.4.03.6144).
Na decisão, a juíza destaca que “o despacho administrativo fundamentou-se na não comprovação documental de que os serviços que deram origem ao pagamento das comissões foram, de fato, exportados e não prestados em território nacional sendo que o termo de intimação fiscal para que a impetrante complementasse o pedido de restituição se deu em 8 de março de 2017, isto é, muito depois do protocolo deste, em 19 de julho de 2001”.
Segundo a juíza, a necessidade de atendimento ao princípio da eficiência, previsto no artigo 37, caput, da Constituição Federal, “não significa que este deva ser perseguido a qualquer custo, em detrimento dos outros princípios que regem a atuação da administração pública e, até mesmo, dos direitos e garantias individuais do contribuinte, assegurados pela Carta Maior”.
Assim, determinou que a Receita Federal volte a analisar o processo de restituição no prazo de 30 dias, independentemente da apresentação de documentos suplementares. Na liminar, ela lembra que, pela Lei nº 11.457, de 2007, que trata da administração tributária federal, o prazo para uma decisão administrativa é de 360 dias – e não 16 anos.
O advogado Diogo Ferraz, do Freitas Leite Advogados, ressalta que a situação beira a deslealdade institucional, porque a Receita demorou 16 anos para apreciar um pedido de restituição e, depois de todo esse tempo, condicionou o deferimento à apresentação de documentos com quase duas décadas de idade, mesmo com o Código Tributário Nacional (CTN) prevendo que o contribuinte só tem que manter a documentação fiscal pelo prazo prescricional de cinco anos (artigo 195, parágrafo único).
“Dessa forma, a decisão protege o contribuinte contra uma conduta reprovável da Receita, que procurou se beneficiar da sua própria morosidade para negar o direito à restituição”, diz o advogado.
Por nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informa que “não considera inovadora a decisão, uma vez que simplesmente determinou a análise do pedido do contribuinte à luz dos documentos juntados ao formulário de 2001”.
De acordo com o órgão, “ao analisar os documentos originais, constatou-se a inexistência de crédito a restituir, posto que a alegação genérica de créditos decorrentes de exportação não foi acompanhada dos documentos comprobatórios”. E acrescenta: “importante sublinhar que a restituição pleiteada pelo contribuinte é regulamentada pela IN 921/97, norma infralegal vigente à época, segundo a qual a comprovação dos créditos deveria acompanhar o requerimento de restituição”.
Fonte: Valor – 14/02/2018
Por Adriana Aguiar | De São Paulo