Cansado com a demora do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), um contribuinte foi à Justiça Federal do Distrito Federal e obteve liminar para que três recursos sejam imediatamente analisados. Ele busca a aplicação pelos conselheiros de decisão judicial definitiva que lhe garante crédito presumido de IPI sobre todas as aquisições de insumos produzidos por pessoas físicas, cooperativas e outros fornecedores não contribuintes de PIS e Cofins.
A liminar, que beneficia a indústria de couros Cortume Krumenauer, é a primeira que se tem notícia nesse sentido. O Carf já foi notificado da decisão, mas ainda não incluiu os três processos – parados há mais de cinco anos – na pauta da próxima sessão, como determinado. Além deles, há outros dois recursos sobre o assunto, tramitando no órgão há quase três anos.
Na decisão, a juíza da 6ª Vara Federal do Distrito Federal que está respondendo pela 9ª Vara, Ivani Silva da Luz, deferiu parcialmente a liminar, exigindo o julgamento imediato apenas dos três processos em que nem foram sorteados relatores. Nos outros dois, com relatorias designadas, devem ser respeitados os prazos do regimento interno do Carf. Os casos devem ser incluídos em pauta em, no máximo, seis meses.
O Carf tem demorado, em média, de cinco a dez anos para julgar processos, segundo levantamento realizado, em 2015, pelo Ministério da Transparência. Em abril, de acordo com o último relatório gerencial do Carf, o estoque do órgão era de aproximadamente 119 mil casos, que envolvem R$ 614 bilhões.
A advogada da empresa, Aline Nack Hainzenreder, do Diehl & Cella Advogados Associados, alegou, no processo, que a Constituição, no artigo 5º, inciso LXXVIII, estabelece o princípio da razoável duração do processo. E que o artigo 24 da Lei nº 11.457/2007 traz prazo de 360 dias para decisão administrativa, a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos do contribuinte. Aline também citou precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em repetitivo (REsp nº 1138206), pela aplicação do prazo.
Ao elaborar o mandado de segurança, Aline fez uma pesquisa sobre o tema e não encontrou nenhum caso ajuizado para exigir o cumprimento do prazo pelo Carf. “Esse precedente do STJ geralmente é utilizado em mandados de segurança contra a Receita Federal, para agilizar a análise de pedidos de créditos. Nunca vimos para o Carf”, diz a advogada. Ela destaca que a decisão judicial favorável à indústria transitou em julgado em 2009 – ou seja, há quase uma década.
A presidência do Carf prestou informações nos autos. Alegou que seria impossível julgar os processos administrativos no prazo porque há a necessidade de observar as regras do regimento interno “para distribuição, indicação do processo para a pauta, pedidos de vistas e para a formalização do acórdão”. Ainda acrescentou que a distribuição de processos, sorteio de relatores e inclusão na pauta obedecem a uma ordem de prioridade.
Ao analisar o caso (mandado de segurança nº 1014280-46. 2018.4.01.3400), a juíza Ivani Silva da Luz entendeu que estariam presentes os requisitos para deferir a liminar em mandado de segurança. Na decisão, ela cita o precedente do STJ, em repetitivo, e afirma que a razoável duração do processo judicial e administrativo está prevista no rol dos direitos e garantias fundamentais da Constituição.
Para a magistrada, não é razoável que o Carf estabeleça um prazo de seis meses para a inclusão do processo na pauta pelo relator, “mas não exista qualquer prazo para a efetiva distribuição do processo, o que tornaria inócuo a previsão deste ou de qualquer outro prazo no regimento interno”.
Segundo o advogado Pedro Moreira, do CM Advogados, como o crédito tributário fica com sua exigibilidade suspensa durante o trâmite no Carf, muitas vezes não há interesse do contribuinte em buscar o Judiciário para forçar a inclusão em sessão de julgamento. “Até porque se tem a sensibilidade de que isso pode gerar uma situação de desconforto perante os conselheiros”, diz. Para Moreira, a decisão “é boa por prestigiar a eficiência e razoável duração do processo, porém deve-se analisar com cautela a possibilidade de levar a questão ao Judiciário”.
O advogado Diego Aubin Miguita, do Vaz, Buranello, Shingaki & Oioli Advogados, afirma que a tese é interessante para as empresas que têm créditos tributários escriturais a receber (gerados pelo IPI, PIS e Cofins acumulados em alguma etapa de cadeia produtiva em que o produto é imune ou isento), que não sofrem atualização pela Selic. Nesses casos, acrescenta, além da inclusão na pauta do Carf, pode-se pedir a atualização desses valores, por meio de precedente do STJ (REsp 1.344.735).
Procurado pelo Valor, o Ministério da Fazenda informou, por meio de nota enviada por sua assessoria de imprensa, que “o Carf não irá se manifestar”.
Por Adriana Aguiar | De São Paulo
Fonte : Valor- 03/09/2018