A pretensão de alguns Estados de cobrar o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) – conhecido como imposto sobre herança e doação – sobre o saldo de plano de previdência privada conhecido como VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) tem sido derrubada na Justiça. Decisões recentes dos tribunais de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul têm afastado a cobrança sob o entendimento de que esses recursos possuem característica de seguro e, portanto, estão livres de tributação no momento da transferência de saldo para beneficiários em caso de morte.
Com relação ao PGBL, segundo o advogado Diego da Silva Viscardi, do escritório Marcusso e Visintin, “há margem para a cobrança do imposto, pois o plano é caracterizado pela Susep (órgão regulador dos planos) como previdência complementar e, portanto, abre brechas para ser classificado como uma aplicação financeira”.
O Rio de Janeiro é um dos Estados que modificaram a legislação para incluir o saldos dos dois planos no raio de incidência do ITCMD, embora tenha iniciado a cobrança antes mesmo da previsão em lei. Cinco dos processos movidos naquele Estado contra a cobrança foram patrocinados pelo escritório Schmidt & Villares, que neste mês obteve sucesso em duas demandas judiciais. São os primeiros acórdãos que se tem conhecimento sobre a mesma matéria.
Para o advogado Bruno Villares, os contribuintes em geral são surpreendidos com a cobrança no momento da elaboração do inventário. “Na prática, o compartilhamento de informações entre a Receita Federal e as Fazendas estaduais para fins de apuração do imposto sobre herança e doações é ainda subaproveitado. A cobrança tende a aumentar nos próximo anos”, afirma.
Num dos processos (nº 0087 260-54.2016.8.19.00014), o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) confirmou decisão de primeira instância que afastou a incidência do ITCMD sobre plano de previdência complementar, o VGBL. De acordo com o acórdão, trata-se de um plano por sobrevivência classificado como seguro de pessoas. A decisão teve como base o artigo 794 do Código Civil, segundo o qual, no “seguro de vida ou de acidentes pessoais, para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.”
A outra ação patrocinada pelo escritório (nº 0477596-02.2014. 8.19.0001) pedia a devolução do ITCMD pago ou a compensação com outro tributo estadual. “Como o autor da ação tem planos de fazer um planejamento sucessório, optou pelo crédito tributário, em vez de precatório”, explica o advogado.
No entendimento do tribunal, os planos de previdência VGBL são transmitidos diretamente aos beneficiários em caso de morte do titular, sem necessidade de inventário e, consequentemente, do pagamento do ITCMD. O acórdão é assinado pelo relator André Andrade e foi publicado em 25 de outubro.
“A tese é boa. E diante da jurisprudência que vem se formando, a Fazenda deveria aproveitar a mudança recente na legislação para excluir a cobrança”, defende Villares. No dia 16 de novembro, foi publicada a Lei nº 7.786, que aumentou a alíquota do imposto no Rio de Janeiro e ampliou a sistemática da progressividade.
De acordo com a Procuradoria-Geral do Rio de Janeiro, tramitam na Justiça dez processos sobre o tema e o órgão tem recorrido de todas as decisões.
Em Minas Gerais, a legislação foi modificada em 2011, quando passou a prever a cobrança do imposto sobre os valores de resgate dos planos VGBL e PGBL. Segundo o advogado Roger Daniel Versieux, da Roger Versieux Sociedade de Advogados, os herdeiros e beneficiários dos planos são surpreendidos com a cobrança de altos valores depois de realizado o inventário.
Como a legislação local concede um desconto de 15% para a realização do inventário em até 90 dias após a morte, há casos de herdeiros que, além de perder esse desconto, foram notificados a recolher o imposto a uma alíquota de 5% sobre o valor resgatado do plano.
Numa das ações patrocinadas pelo escritório (processo nº 1.0000.17.052552-1/001), os autores pediram a manutenção do desconto de 15% sobre o montante devido de ITCMD e, também, a não inclusão do saldo de planos de VGBL na declaração de bens, afastando, assim, a cobrança. O pedido foi acatado pela 4ª Vara de Feitos Tributários do Estado de Minas Gerais e confirmado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG).
Na opinião do advogado, por se tratarem de casos atendidos por profissionais que militam na área de sucessões, advogados tributaristas estão menos envolvidos com os processos, daí o número ainda reduzido de ações que só agora têm chegado aos tribunais. Em geral, explica, quem recorre são os herdeiros de saldos expressivos de planos – casos em que o imposto cobrado pode chegar a mais de R$ 500 mil.
Fonte: Valor-13/12/2017
Por Silvia Pimentel | De São Paulo