O ministro Luiz Fux pediu, na noite de terça-feira (19/4), destaque no julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que discute se o Poder Executivo pode alterar, sem restrições, os percentuais de restituição tributária previstos no Reintegra, programa do governo federal criado para incentivar a exportação de produtos industrializados. Dessa forma, o julgamento será reiniciado em plenário físico.
Vale lembrar que a discussão estava prevista para ser julgada no dia 17 de março presencialmente, mas a análise não ocorreu e voltou para o plenário virtual iniciado em 8 de abril. A previsão era que a análise em ambiente virtual terminasse nesta quarta-feira (20/4). Com o pedido de destaque, a contagem de votos será reiniciada. Não há nova data para o julgamento.
Antes do pedido de destaque, o placar estava em três a um para julgar improcedentes os pedidos dos contribuintes e, com isso, permitir que o Poder Executivo possa reduzir os percentuais do Reintegra dentro dos limites estabelecidos em lei.
Segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a discussão envolve impacto financeiro de R$ 7,3 bilhões anuais aos cofres públicos e devolução de R$ 42,56 bilhões às empresas exportadoras, caso a União perca.
As Ações Direta de Inconstitucionalidade (ADIs) 6040 e 6055 foram ajuizadas pela pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pelo Instituto Aço Brasil. As entidades questionam os artigos 22 da Lei 13.043/2014 e, por arrastamento, dos Decretos 8.543/15, 9.148/17 e 9.393/18, os quais reduziram o percentual de apuração de crédito do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra).
Os créditos do programa são calculados a partir de uma porcentagem sobre a receita alcançada pela empresa com a exportação de bens. O que as entidades questionam no Supremo é se os percentuais podem ser alterados pelo Executivo Federal sem motivação, uma vez que, para os contribuintes, o Reintegra não é um benefício fiscal, e, portanto, não pode ser modificado discricionariamente pelo governo federal.
Na visão dos contribuintes, a ideia do programa é diminuir resíduos tributários e deixar o produto nacional mais competitivo no mercado externo. Dessa forma, o programa é uma consequência lógica do sistema constitucional brasileiro de proteção das exportações. Por esse raciocínio, o Estado não pode alterar os percentuais indiscriminadamente e, sobretudo, para compensar a perda de arrecadação, sob pena de afronta aos princípios da não exportação de tributos, da livre concorrência, da livre iniciativa e liberdade de comércio, do não retrocesso socioeconômico e da proporcionalidade.
No entanto, em maio de 2018, durante o governo do então presidente Michel Temer, em meio à crise provocada pela greve dos caminhoneiros, o governo federal reduziu a alíquota do Reintegra de 2% para 0,1% para compensar a perda de arrecadação com a redução da tributação sobre o diesel. A alíquota máxima prevista por lei é de 3%, mas ela pode chegar a 5%, excepcionalmente, se o resíduo tributário for maior.
Já a União defende que o Reintegra é um benefício fiscal que busca fomentar as exportações. Por isso, o programa “já nasceu com a condição de ser adaptável às circunstâncias fiscais e extrafiscais eventualmente enfrentadas”.
Votos
Até o pedido de destaque de Fux, prevalecia o entendimento do relator, ministro Gilmar Mendes, pela validade das normas questionadas pelos contribuintes. Segundo o ministro, a própria Lei 13.043/2014, ao instituir o Reintegra, estabeleceu o limite de liberdade do Poder Executivo em relação aos percentuais a serem usados (entre 0,1% e 3%), além de deixar claro que o objetivo é reintegrar integral ou parcialmente o resíduo tributário.
Assim, na visão do relator, o Reintegra é um benefício fiscal e busca incentivar as exportações e o desenvolvimento nacional, mas não se insere no contexto das imunidades tributárias.
“E aqui enfatizo um ponto que entendo crucial para o deslinde da presente controvérsia: existem as imunidades à exportação e existe o Reintegra. São dois instrumentos diferentes de incentivo à exportação. Enquanto aquelas incentivam qualquer tipo de produto ou serviço e aqui enfatizo um ponto que entendo crucial para o deslinde da presente controvérsia: existem as imunidades à exportação e existe o Reintegra. São dois instrumentos diferentes de incentivo à exportação. Enquanto aquelas incentivam qualquer tipo de produto ou serviço”, escreveu o ministro.
Acompanhavam Gilmar os ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes.
A divergência era do ministro Edson Fachin, que entende que o Reintegra é um incentivo fiscal, portanto, ele retira a discricionariedade do Poder Executivo para alterar as alíquotas do Reintegra e vai além: o exportador pode recuperar todo o resíduo tributário da cadeia exportadora (portanto, ele retira aquelas porcentagens de até 3%).
“Nessa perspectiva, vislumbro que a legislação tributária federal ao reduzir percentual de ressarcimento do Reintegra vulnera a segurança jurídica na tributação das operações de exportações sendo que eventuais alterações devem ser aplicadas tão somente no exercício financeiro seguinte respeitando, assim, o direito a “não surpresa” do contribuinte-exportador”, escreveu.
Análise mais profunda sobre o tema
Para o tributarista Gustavo Vita Pedrosa, do escritório Ogawa, Lazzerotti e Baraldi Advogados, o pedido de destaque permitirá que os ministros debatam o tema com mais profundidade no Plenário, dada a sua importância para as empresas exportadoras.
O advogado lembra que, além das ADIs 6040 e 6055, o STF decidirá, em sede de repercussão geral, se o Poder Executivo precisa observar as anterioridades nonagesimal e geral (anual) para reduzir os percentuais do Reintegra. A controvérsia é objeto do ARE 1285177, elencado no Tema 1108 da Repercussão Geral.
Para Pedrosa, o ideal é que os três processos sejam julgados conjuntamente, de modo a “evitar decisões conflitantes e homenagear a segurança jurídica e a estabilidade da jurisprudência” do STF.
“Com o adiamento das discussões e a análise posterior tanto das ADIs 6040 e 6055 quanto do ARE 1285177, os contribuintes poderão contrapor os argumentos dos votos desfavoráveis até então proferidos pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, já que o julgamento recomeçará do zero”, afirma o advogado.
Fonte: JOTA/FLAVIA MAIA; CRISTIANE BONFANTI