JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
2ª Vara Federal de Sorocaba/SP
MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) N. 5004659-08.2024.4.03.6110
IMPETRANTE: TORINO INFORMATICA LTDA..
Advogados do(a) IMPETRANTE: FELIPE MOREIRA DA CONCEICAO – SP396235, PEDRO AUGUSTO SPINETTI –
SP345862, RODRIGO DALLA PRIA – SP158735, SAMUEL DE OLIVEIRA GARCIA – SP365559
IMPETRADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SOROCABA//SP
DECISÃO
TORINO INFORMATICA LTDA. impetrou o presente mandado de segurança contra ato do DELEGADO
DA RECEITA FEDERAL EM SOROCABA//SP, no qual se pede, em sede de liminar, determinação
judicial para a exclusão do crédito presumido de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e
COFINS afastando-se as disposições da Lei n. 14.789/2023.
Narra a impetrante, em breve síntese, que os valores decorrentes do referido benefício fiscal não se
enquadram nos conceitos de lucro, renda ou acréscimo patrimonial, ou, ainda, de receita ou faturamento, não
podendo compor a base de apuração do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.
É o breve relatório. Passo a decidir.
De acordo com o art. 7º, III, da Lei n. 12.016, de 2009, o juiz, ao despachar a inicial em mandado de
segurança, ordenará “que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento
relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida […]”.
Como se vê, trata-se de técnica processual elaborada com o intuito de garantir efetividade à tutela final dos
direitos envolvidos (periculum in mora), quando presentes elementos que evidenciem, de plano, a
probabilidade do direito (fumus boni iuris). Sem embargo, tem-se por aplicáveis à espécie as demais técnicas
de antecipação de tutela de cunho satisfativo previstas, a posteriori, no Código de Processo Civil de 2015,
fundadas na urgência (art. 300) ou evidência (art. 311) das alegações.
É que, preservado o rito especial e sumário do mandado de segurança, não se afigura razoável obstar a parte
impetrante de valer-se das aludidas técnicas processuais, visando à distribuição isonômica do ônus do tempo
no processo, no bojo de ação constitucional concebida justamente para que se obtenha o bem da vida
almejado em tempo e modo expeditos. Caso contrário, estar-se-ia desprestigiando o writ em detrimento das
ações movidas sob o rito comum, previsto no CPC, para as quais não há vedação genérica e apriorística à
veiculação de pedido liminar, de cunho satisfativo, em face da Fazenda Pública.
Ressalto, no ponto, que as hipóteses legais de vedação da concessão de medida liminar em mandados de
segurança, previstas no art. 7º, § 2º, da Lei n. 12.016, de 2009, foram declaradas inconstitucionais pelo
Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado (ADI 4.296/DF, Plenário, Min. Marco Aurélio,
julg. 09/06/2021).
No caso concreto, entendo presentes os requisitos autorizadores da medida antecipatória liminarmente
requerida.
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o EREsp 1.517.492, pacificou o entendimento no
sentido da impossibilidade de inclusão do crédito presumido de ICMS nas bases de cálculos do IRPJ e da
CSLL, sob o fundamento de que tal tributação ofenderia o princípio federativo por indevida intromissão da
União em política fiscal dos Estados-membros.
Em relação à exclusão dos créditos presumidos de ICMS nas bases de cálculo da contribuição ao
PIS/PASEP e da COFINS, a matéria está sob julgamento no Supremo Tribunal Federal, no RE 835.818/PR
(tema 843), com repercussão geral reconhecida desde 28 de agosto de 2015. Embora pendente de
julgamento, já se formou entendimento, pela maioria dos votos, no sentido do acolhimento da pretensão aqui
defendida pela parte impetrante.
Por outro lado, a Lei n. 14.789, de 2023, revogou o art. 30 da Lei n. 12.973, de 2014 (IRPJ e CSLL) e os
incisos X do § 3º do art. 1º da Lei n.10.637/2002 e IX do § 3º do art. 1º da Lei n.10.833/2003 (PIS e
COFINS) e, como consequência, considera que todos os benefícios fiscais de ICMS estariam, em tese,
alcançados pela tributação do PIS, COFINS, IRPJ e CSLL e submetidos a esse novo regime.
Independentemente do quanto disposto pela Lei n. 14.789/2023, deve prevalecer, ao menos por ora, o
entendimento sedimentado no sentido de que o crédito presumido de ICMS não integra a base de cálculo
do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins.
Sobre o tema, confiram-se os seguintes julgados:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS. BASE DE
CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. NÃO INCIDÊNCIA. VIOLAÇÃO DO PACTO FEDERATIVO E
DO CONCEITO DE RENDA. CLASSIFICAÇÃO DOS INCENTIVOS COMO SUBVENÇÃO
PARA INVESTIMENTOS. DESNECESSIDADE. ENTENDIMENTO FIXADO PELA PRIMEIRA
SEÇÃO DO STJ (ERESP 1.517.492-PR). LEI 14.789/23. INALTERAÇÃO DA NATUREZA
JURÍDICA DO BENEFÍCIO. RECURSO PROVIDO.
– Cinge-se a controvérsia em definir se os benefícios fiscais de créditos presumidos de ICMS da
impetrante podem ser excluídos das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL após a vigência da Lei
14.789/2023.
– De acordo com o entendimento fixado pela Primeira Seção do STJ, o benefício de crédito presumido
de ICMS representa renúncia à arrecadação do Estado, de modo que a tributação pela União desses
valores significaria “a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da
atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais
inerentes à organicidade do princípio federativo”, conforme ementa do ERESP 1.517.492/PR.
(1ª Seção do STJ, Relatora Ministra Regina Helena Costa, julgado em 01/02/2018).
– Ao fixar esse entendimento, o STJ não estabeleceu requisito algum para a não incidência do IRPJ e
da CSLL sobre os benefícios de crédito presumido de ICMS.
– Assim, para a exclusão dos incentivos de crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e
da CSLL não é necessário a classificação de tais benefícios como subvenção para investimento. Tal
requisito é necessário apenas para a exclusão dos benefícios fiscais de ICMS distintos do crédito
presumido, como, por exemplo, a redução da base de cálculo ou alíquotas, o diferimento, a isenção
etc., nos termos do art. 30 da Lei 12.973/14.
– No mesmo sentido, a Lei 14.789/23, ao revogar o art. 30 da Lei 12.973/14 e estabelecer outra
sistemática de incentivo fiscal de IRPJ e CSLL para os benefícios fiscais de ICMS não trouxe
alteração na natureza jurídica do crédito presumido de ICMS, tal qual definido pelo STJ no
ERESP 1.517.492, pois se trata de entendimento firmado com base em fundamento
constitucional (violação ao pacto federativo e conceito de renda), que não se modifica em razão
de reforma legal de benefício fiscal.
– Uma vez que a renúncia fiscal dos Estados está imune à tributação de outro ente federativo, não cabe
ao legislador infraconstitucional instituí-la.
– A impossibilidade de tributação, pela União Federal, dos benefícios de crédito presumido de ICMS
decorria não do incentivo fiscal previsto no art. 30 da Lei 12.973/14 agora revogado, mas da própria
sistemática de repartição de competências estabelecida na Constituição Federal, além do conceito de
renda.
– Agravo de Instrumento provido.
(AI 5003594-72.2024.4.03.0000, TRF3 – 3ª Turma, Desembargador Federal RUBENS ALEXANDRE
ELIAS CALIXTO, Intimação via sistema DATA: 08/07/2024)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE
SEGURANÇA. BENEFÍCIOS FISCAIS DE ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO. EXCLUSÃO DA
BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. TEMA 843/STF. SUSPENSÃO NACIONAL.
POSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. LEI 14.789/2023.
PRINCÍPIO FEDERATIVO. NÃO INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA.
- A questão de fundo é objeto do Tema 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e
da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos
fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818) e há determinação de
suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem
acerca da questão delimitada e tramitem no território nacional.
- A suspensão prevista pelo art. 1.037, II, do CPC não constitui óbice à concessão da tutela de
urgência, quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o
risco ao resultado útil do processo, como no caso em tela.
- Por ocasião do julgamento do EREsp 1.517.492, o Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão
no sentido de que os benefícios fiscais concedidos pelos Estados membros (ou pelo Distrito Federal),
consistentes em créditos presumidos de ICMS, constituem instrumentos legítimos de política fiscal
que materializam sua autonomia. Nesse contexto, a tributação de tais valores pela União caracteriza
interferência que viola o pacto federativo, por restringir a eficácia de incentivo fiscal concedido por
outro ente federado, além de ofender também a segurança jurídica.
- Restou salientado no referido precedente que a descaracterização desses créditos presumidos como
renda ou lucro tornou-se mais evidente a partir da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal
no RE 574.706, ante a compreensão de que o valor do ICMS não se incorpora ao patrimônio do
contribuinte
- O Superior Tribunal de Justiça tem reiterado esse entendimento em ulteriores julgamentos.
Precedentes.
- Em síntese, o crédito presumido do ICMS não consubstancia um acréscimo no faturamento das
empresas e, por conseguinte, deve ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS.
- Apenas a título ilustrativo, visto que se trata de julgamento ainda não concluído, vale observar que
06 (seis) Ministros do Supremo Tribunal Federal já se pronunciaram nos autos do RE 835.818 (Tema
843) no sentido de ser incompatível com a Constituição Federal a inclusão dos créditos presumidos de
ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.
- As disposições previstas na Lei 14.789/2023, com produção de efeitos a partir de 01.01.2024,
inclusive quanto à revogação do citado artigo 30 da Lei 12.973/2014, nada alteram o
entendimento relativo à violação ao pacto federativo.
- O requisito da urgência encontra-se presente, na medida em que a imposição de pagamentos
indevidos implica em evidente restrição do patrimônio dos contribuintes.
- Dessa forma, em análise sumária, própria às tutelas de natureza precária, cabe reconhecer a
inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a parte impetrante ao recolhimento das
contribuições ao PIS e à COFINS apenas no que tange à subvenção de investimento consubstanciada
em crédito presumido de ICMS.
- Agravo de instrumento provido. Embargos de declaração prejudicados.
(AI 5006685-73.2024.4.03.0000, TRF3 – 3ª Turma, Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, DJEN DATA: 25/09/2024)
Por fim, o periculum in mora decorre da manutenção da exigibilidade periódica de créditos tributários
indevidos, além dos efeitos nefastos imediatamente provocados por eventual inadimplemento de tais
tributos, à vista dos meios de coerção colocados à disposição da Fazenda Pública na condição de credora.
Ante o exposto, concedo a medida liminar para suspender a exigibilidade dos créditos tributários
decorrentes da inclusão dos valores dos créditos presumidos de ICMS, titularizados por TORINO
INFORMATICA LTDA., nas base de cálculo do IRPF, da CSLL, do PIS e da COFINS.
- Notifique-se a autoridade dita coatora, comunicando-lhe o teor da presente decisão para fins de
cumprimento da medida liminar e comprovação nos autos no prazo de 10 dias, juntamente com as
informações pertinentes ao caso.
- Cientifique-se a pessoa jurídica impetrada, ficando, desde logo, autorizado seu ingresso no feito (art. 7º,
II, da Lei n. 12.016, de 2009).
- Dê-se andamento ao feito em Secretaria, nos termos da Portaria n. 57, de 2021, da 2ª Vara Federal de
Sorocaba/SP.
Intime(m)-se. Cumpra-se.
Sorocaba/SP, datado e assinado eletronicamente
TRF 3ª REGIÃO