EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IPVA. ARRENDAMENTO MERCANTIL. ARRENDANTE. LEGITIMIDADE. RESPONSABILIDADE. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. 1. O Código Tributário Nacional estabelece como sujeito passivo da obrigação tributária a pessoa obrigada ao pagamento do tributo, atribuindo essa condição, como contribuinte ou responsável, àquele que tenha relação direta com a situação que constitua o fato gerador ou seja assim designado por lei (arts. 121 a 131). A Lei 7.431/1985 (que institui o imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) no Distrito Federal, com redação dada pela Lei Ordinária 223/1991 e antes das alterações promovidas pela Lei 6.466/2019) e o Decreto 34.024/2012 (que consolida e regulamenta a Lei 7.431/1985) estabelecem que são contribuintes do IPVA as pessoas físicas ou jurídicas residentes e/ou domiciliadas no Distrito Federal, proprietárias, sob qualquer título, de veículo automotor sujeito a licenciamento pelos órgãos competentes, assim como os titulares do domínio útil do veículo, nos casos de locação e arrendamento mercantil, além dos detentores de posse legítima do veículo, inclusive quando decorrente de alienação fiduciária em garantia gravado com cláusula de reserva de domínio. Dispõem ainda que são responsáveis, solidariamente, pelo pagamento do IPVA o adquirente, em relação ao veículo adquirido sem o pagamento do imposto do exercício ou exercícios anteriores; o titular do domínio e/ou o possuidor sob qualquer título; o proprietário de veículo de qualquer espécie, que o alienar e não comunicar a alienação ao órgão público encarregado do registro e licenciamento, inscrição ou matrícula. 2. 1. Arrendamento mercantil, segundo definição do parágrafo único do art. 1º da Lei 6.099/1974, constitui “negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta.” 3. Durante o tempo em que perdurar o contrato, a instituição financeira arrendante permanece sendo a proprietária e possuidora indireta do veículo, enquanto ao arrendatário é transferida a posse direta. A legislação tributária, por sua vez, prescreve que são contribuintes e/ou responsáveis solidários pelo pagamento de IPVA o proprietário, o adquirente, o titular do domínio ou o possuidor, nos casos de locação e arrendamento mercantil. 4. Por constituir tributo de natureza real vinculado ao bem (veículo automotor), o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacificado de que, nas operações de leasing ou arrendamento mercantil, a instituição financeira arrendante, como possuidora indireta do veículo, é responsável solidária pelo pagamento do IPVA, podendo, assim, figurar no polo passivo da execução fiscal. Desse modo, enquanto vigente o pacto de arrendamento mercantil, o arrendante é responsável pelo adimplemento da obrigação tributária concernente ao IPVA. Por outro lado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece que, em caso de alienação do veículo, a responsabilidade tributária pelo pagamento de IPVA de exercícios futuros não atinge o alienante, mesmo diante da ausência de comunicação da transferência ao órgão de trânsito, vedada a interpretação ampliativa do art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro, que somente incide em relação às infrações de trânsito, não se aplicando a débitos tributários. Trata-se, inclusive, de entendimento sumulado (Súmula 585/STJ: “a responsabilidade solidária do ex-proprietário, prevista no art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro CTB, não abrange o IPVA incidente sobre o veículo automotor, no que se refere ao período posterior à sua alienação”). 5. Essa orientação, pela sua própria acepção, tem aplicação tanto na hipótese de alienação direta de veículo, quanto no caso de alienação de veículo objeto de contrato de arrendamento mercantil, desde que seja comprovado que a alienação ocorreu em momento anterior ao fato gerador do tributo. Assim, apesar de a jurisprudência mitigar a exigência de comunicação administrativa da venda do veículo por parte do alienante, para que seja afastada dessa posição, a instituição financeira deve comprovar a transmissão da propriedade, o que pressupõe o efetivo exercício da opção de compra pelo arrendatário no encerramento do contrato. 6. Na hipótese dos autos, o apelante não apresentou cópia dos alegados contratos de leasing concluídos com a opção de aquisição pelos arrendatários. A única prova apresentada consiste em recortes de telas de sistema informatizado produzidas unilateralmente e inseridas pelo embargante dentro do teor da petição inicial e do recurso de apelação, das quais se extrai apenas que o prazo de vigência dos contratos encerrou e que houve a retirada do gravame eletrônico da base de dados do SNG (sistema privado), mas não demonstram a concretização da faculdade de compra com o pagamento do valor residual pelo arrendatário (integral ou diluído nas prestações do aluguel), não se prestando, portanto, à comprovação da efetiva alienação da propriedade. O contrato de arrendamento mercantil pode se encerrar tanto pela falta de renovação quanto pela aquisição do bem, sendo que em ambas as hipóteses, em tese, poderia ocorrer a baixa do gravame eletrônico, porém apenas nessa última se daria a efetiva transferência da propriedade, afastando, assim, a responsabilidade tributária solidária do ex-proprietário (instituição financeira) sobre o veículo automotor no que se refere ao período posterior à sua alienação, nos termos da Súmula 585 do STJ. 7. Após a quitação do contrato, ainda surgiria para a arrendante uma dupla obrigação caso fosse concretizada a alienação do veículo. Em primeiro lugar, a instituição financeira deveria providenciar a baixa automática do gravame administrativo “que não se confunde com o gravame eletrônico inserido na base privada do SNG” junto ao órgão de trânsito, conforme previsto nos arts. 5° e 9° da Resolução 320/2009 do CONTRAN, vigente à época, do que não se tem qualquer comprovação nos autos. Em segundo lugar, deveria providenciar a documentação necessária para transferência da propriedade do veículo nos termos do art. 1º, I da Lei 11.649/2008, do que também não se tem nenhuma comprovação. 8. Cabia à parte embargante o ônus de comprovar o fato necessário para afastar a obrigação tributária. Trata-se de providência cujo cumprimento deveria ter sido realizado pela arrendante, a quem competia demonstrar a efetiva alienação dos veículos objeto do arrendamento. A instituição financeira tinha plenas condições de comprovar essa situação, inclusive mediante prova documental, não se tratando de exigência de “prova negativa” (mas confirmativa da alegada alienação dos veículos em razão do exercício da opção de compra pelos arrendatários no término dos contratos de arrendamento), nem de “prova unilateralmente diabólica” (expressão utilizada para fazer referência àqueles casos em que a comprovação da veracidade da alegação a respeito de um fato é extremamente difícil, quando não impossível de ser realizada por uma das partes). Afasta-se, assim, a alegação genérica de ausência de relação contratual ou obrigacional com os veículos objeto da tributação. 9. Sem demonstração de que houve efetiva alienação dos veículos, a responsabilidade tributária da instituição financeira, que formalmente permanece designada como proprietária e devedora do tributo (IPVA), deve ser mantida, conforme reconhecido em sentença, não havendo, ainda, equívoco na indicação do sujeito passivo suficiente a macular os requisitos da liquidez e certeza que revestem os títulos. 10. Sendo cada litigante em parte vencedor e vencido, os ônus sucumbenciais devem ser, recíproca e proporcionalmente, distribuídos (art. 86 do CPC/2015). Honorários advocatícios fixados sobre o proveito econômico, conforme ordem de vocação prevista no § 2º do art. 85 do CPC/2015. 11. Recurso conhecido e parcialmente provido. TJDFT, Apel. 0748464-67.2018.8.07.0016, julg. 29/04/2021.