CISÃO PARCIAL DE EMPRESAS. INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA EM RELAÇÃO A DÉBITOS CUJOS FATOS GERADORES SÃO POSTERIORES À CISÃO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCLUSIVOS SOBRE FORMAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO. HONORÁRIOS RECURSAIS: NÃO CABIMENTO. RECURSO E REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDOS.
1. Embora o art. 132 do Código Tributário Nacional não cuide de cisão parcial, surge responsabilidade tributária solidária entre a empresa cindida e a nova empresa criada com a parcela do patrimônio cindido à luz da lógica desse preceito e do sistema de proteção do crédito tributário, movido pelas razões fiscais e extrafiscais da tributação. Precedentes do E.STJ.
2. Tratando-se de contribuição previdenciária (tributo pessoal) devida por pessoa jurídica parcialmente cindida para criação de nova empresa, estabelece-se vínculo de solidariedade passiva entre as sociedades envolvidas no que concerne aos débitos da sociedade cindida anteriores à cisão parcial. Débitos tributários posteriores a operações societárias somente podem ser exigidos em solidariedade em circunstâncias específicas tais como a contida no art. 132, parágrafo único do Código Tributário Nacional (o que não foi cogitado no presente recurso) e a formação de grupos de empresas.
3. No caso dos autos, as contribuições previdenciárias devidas pela empresa cindida parcialmente se referem às competências de 02/2003 a 06/2003 e 03/2001 a 09/2002, posteriores à cisão parcial registrada na JUCESP em 10/03/1999, impedindo a solidariedade passiva pretendida pelo Fisco.
4. O documento trazido pela apelante não é conclusivo acerca da configuração de grupo econômico entre as empresas ora consideradas. A devida apuração desse fato demandaria amplo exame de provas, com instauração do contraditório, o que acabaria por ampliar indevidamente o objeto da presente demanda.
5. Considerando que o recurso foi interposto sob a égide do CPC/1973 e, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a 18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015.
6. Apelação e remessa oficial não providas. TRF 3, Apel. 023326-90.2006.4.03.6100/SP, julg. 31-10-2017.
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 31 de outubro de 2017.
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por (…) contra a União (Fazenda Nacional), em que se pretende a declaração de inexistência de relação jurídico-tributária que a responsabilize por débitos de contribuições previdenciárias cujo sujeito passivo seria empresa sucedida.
Deferida a antecipação dos efeitos da tutela requerida, para determinar à ré que aprecie e conclua o pedido de desvinculação do CNPJ da autora da empresa (…), no prazo de quinze dias (fls. 130/133).
Contestação às fls. 147/153.
Sobreveio sentença, que julgou parcialmente procedente a demanda, para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária que possa atribuir à autora a responsabilidade pelo pagamento dos débitos previdenciários de (…) contraídos após a sua constituição, em 07/04/1999. Honorários advocatícios fixados em R$ 500,00, em desfavor da ré. Custas na forma da lei. Sentença sujeita ao reexame necessário (fls. 177/181).
Opostos embargos de declaração pela autora (fls. 185/187), foram rejeitados (fls. 189/189-v).
Apela a União (fls. 203/209). Em suas razões recursais, sustenta, em síntese, que a autora seria responsável solidária pelos débitos previdenciários da empresa (…)
Com contrarrazões (fls. 213/215), subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Cinge-se a questão à atribuição de responsabilidade tributária por sucessão empresarial.
A apelante imputa à autora a responsabilidade solidária pelo pagamento de contribuições previdenciárias relativas às competências de 02/2003 a 06/2003 (LDC nº 35.672.044-6) e 03/2001 a 09/2002 (LDC nº 35.672.167-1), devidas pela empresa (…) (atual denominação de …), ao argumento de que haveria vínculo entre as empresas cindidas, formando verdadeiro grupo econômico.
De acordo com a documentação acostada aos autos, a sociedade denominada (…), cuja denominação foi alterada para (…) em 11/03/1982, foi parcialmente cindida, resultando da cisão a empresa (…), em 10/03/1999 que, posteriormente, alterou sua denominação para (…)
Nos termos contidos no Código Tributário Nacional, há um conjunto de circunstâncias que impõem a sucessão da responsabilidade tributária, alcançando tanto tributos pessoais quanto tributos reais. Tratando-se de contribuição previdenciária (tributo pessoal) devida por pessoa jurídica parcialmente cindida, estabelece-se vínculo de solidariedade passiva com nova empresa criada com patrimônio vertido da cisão apenas no que concerne aos débitos tributários da sociedade cindida anteriores à cisão.
É verdade que o art. 132 do Código Tributário Nacional não cuida de cisão parcial, mas a responsabilidade tributária solidária entre empresa cindida e empresa criada com a parcela do patrimônio cindido deriva da lógica desse dispositivo combinado com o sistema de proteção do crédito tributário, movido pelas razões fiscais e extrafiscais da tributação.
Friso que essa responsabilidade solidária entre empresa cindida e empresa gerada a partir da cisão compreende apenas tributos devidos pela empresa cindida até a data do ato societário da cisão parcial (mesmo porque, após a efetivação da operação societária, empresa cindida e a nova empresa representam pessoas jurídicas distintas e contribuintes distintos). Com relação a tributos cujos fatos geradores são posteriores à cisão, a vinculação entre duas ou mais empresas para fins de responsabilidade tributária somente se dá em circunstâncias específicas tais como a contida no art. 132, parágrafo único do Código Tributário Nacional (o que não foi cogitado no presente recurso) e a formação de grupos de empresas. Nesse sentido já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça, inclusive em julgamento representativo de controvérsia, submetido ao rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. RESPONSABILIDADE POR INFRAÇÃO. SUCESSÃO DE EMPRESAS. ICMS. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA OPERAÇÃO MERCANTIL. INCLUSÃO DE MERCADORIAS DADAS EM BONIFICAÇÃO. DESCONTOS INCONDICIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. LC N.º 87/96. MATÉRIA DECIDIDA PELA 1ª SEÇÃO, NO RESP 1111156/SP, SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC.
1. A responsabilidade tributária do sucessor abrange, além dos tributos devidos pelo sucedido, as multas moratórias ou punitivas, que, por representarem dívida de valor, acompanham o passivo do patrimônio adquirido pelo sucessor, desde que seu fato gerador tenha ocorrido até a data da sucessão. (Precedentes: REsp 1085071/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/05/2009, DJe 08/06/2009; REsp 959.389/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/05/2009, DJe 21/05/2009; AgRg no REsp 1056302/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/04/2009, DJe 13/05/2009; REsp 3.097/RS, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/10/1990, DJ 19/11/1990)
2. “(…) A hipótese de sucessão empresarial (fusão, cisão, incorporação), assim como nos casos de aquisição de fundo de comércio ou estabelecimento comercial e, principalmente, nas configurações de sucessão por transformação do tipo societário (sociedade anônima transformando-se em sociedade por cotas de responsabilidade limitada, v.g.), em verdade, não encarta sucessão real, mas apenas legal. O sujeito passivo é a pessoa jurídica que continua total ou parcialmente a existir juridicamente sob outra “roupagem institucional”. Portanto, a multa fiscal não se transfere, simplesmente continua a integrar o passivo da empresa que é: a) fusionada; b) incorporada; c) dividida pela cisão; d) adquirida; e) transformada. (Sacha Calmon Navarro Coêlho, in Curso de Direito Tributário Brasileiro, Ed. Forense, 9ª ed., p. 701)
(…)
9. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(STJ, REsp 923.012/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/06/2010, DJe 24/06/2010)
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, V, C/C ART. 487, II, DO CPC. PRELIMINARES: IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA, DECADÊNCIA, PREQUESTIONAMENTO, LITISCONSÓRCIO, QUERELA NULLITATIS. CISÃO PARCIAL DE EMPRESA POSTERIORMENTE AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. SOLIDARIEDADE PASSIVA QUANTO AOS DÉBITOS DA SOCIEDADE CINDIDA. OBRIGAÇÃO DA RÉ DE COMUNICAR. IMPOSSIBILIDADE DE ALEGAR NULIDADE. AÇÃO RESCISÓRIA IMPROCEDENTE.
1. A impugnação ao valor da causa deve ser rejeitada por já haver trânsito em julgado sobre a questão.
2. O prazo decadencial para o ajuizamento da ação rescisória inicia-se quando não for mais cabível recurso do último pronunciamento judicial, nos termos da Súmula 401/STJ.
3. Admite-se ação rescisória por violação de lei, mesmo que a decisão rescindenda não tenha emitido juízo sobre o dispositivo supostamente violado. Na ação rescisória dispensa-se o prequestionamento. Precedentes.
4. Nas ações rescisórias integrais devem participar, em litisconsórcio unitário, todos os que foram parte no processo cuja sentença é objeto de rescisão.
5. Por alegada inexistência de citação, é possível debater-se a ausência de litisconsortes passivos necessários e a conseqüente anulação do feito rescindendo, tanto em ação rescisória quanto por meio de querela nullitatis, pois neste caso há concurso de ações. Precedentes.
6. Operada a cisão parcial, cria-se um vínculo de solidariedade passiva das sociedades beneficiárias quanto aos débitos anteriores da sociedade cindida, atingindo todas as sociedades interessadas (§ 3º art. 42 CPC).
7. Ocorrida a cisão parcial posteriormente ao ajuizamento da ação que pleiteava rescisão contratual e indenização, era obrigação da parte ré comunicar ao Juízo o fato, portanto há impossibilidade de alegar a nulidade que deu causa (art. 243 do CPC).
8. Ação rescisória improcedente.
(STJ, AR 3.234/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/11/2013, DJe 14/02/2014)
No caso dos autos, as contribuições devidas pela empresa (…). referem-se às competências de 02/2003 a 06/2003 e 03/2001 a 09/2002, sendo os fatos geradores posteriores à cisão parcial, registrada na JUCESP em 10/03/1999. Portanto, incabível a responsabilização da (…) por débitos de contribuições previdenciárias que têm como sujeito passivo a empresa (…) com fatos geradores posteriores à cisão.
Por fim, o documento de fls. 166/168 não é conclusivo acerca da configuração de grupo econômico entre as empresas ora consideradas. A devida apuração desse fato demandaria amplo exame de provas, com instauração do contraditório, o que acabaria por ampliar indevidamente o objeto da presente demanda.
Verbas sucumbenciais
Considerando que o recurso foi interposto sob a égide do CPC/1973, deixo de aplicar o artigo 85 do Novo Código de Processo Civil, porquanto a parte não pode ser surpreendida com a imposição de condenação não prevista no momento em que recorreu, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica.
Ressalte-se, ainda, que, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a 18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015:
Enunciado administrativo número 7
Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do novo CPC.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial.