Ação direta de inconstitucionalidade. Incidência de ISS ou ICMS sobre o licenciamento ou cessão do direito de uso de programa de computador. 1. Ação direta em que se discute a validade da incidência do ICMS sobre o licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador. 2. A Primeira Turma deste Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 176.626, de relatoria do Min. Sepúlveda Pertence (j. em 10.11.1998), declarou a impossibilidade de incidência do ICMS sobre o licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador. Isso porque essa operação tem como objeto o direito de uso de bem incorpóreo insuscetível de ser incluído no conceito de mercadoria. Na mesma ocasião, porém, a Turma reconheceu a constitucionalidade da incidência do ICMS sobre a circulação de cópias ou exemplares de programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo, os chamados softwares “de prateleira” (off the shelf). 3. Posteriormente, analisando de forma específica a legislação do Estado de São Paulo, a Primeira Turma reafirmou essa tese e concluiu que a comercialização e revenda de exemplares do corpus mechanicum da obra intelectual produzida em massa não caracterizam o licenciamento ou cessão do direito de uso da obra. Trata-se de genuínas operações de circulação de mercadorias sujeitas ao ICMS (RE 199.464, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. em 02.03.1999). Este entendimento também foi seguido pela Segunda Turma no RE 285.870-AgR, Rel. Min. Eros Grau, j. em 17.06.2008. 4. A jurisprudência desta Corte, no entanto, recentemente foi modificada, afastando a distinção em função do caráter customizado ou não do programa de computador. 5. O Plenário deste Supremo Tribunal Federal, ao apreciar as ADIs 1.945 e 5.659 (j. em 24.02.2021), entendeu que as operações relativas ao licenciamento ou cessão do direito de uso de software, seja ele padronizado ou elaborado por encomenda, devem sofrer a incidência do ISS, e não do ICMS. Tais operações são mistas ou complexas, já que envolvem um dar e um fazer humano na concepção, desenvolvimento e manutenção dos programas, além “[d]o help desk, disponibilização de manuais, atualizações tecnológicas e outras funcionalidades previstas no contrato”. Nesse contexto, o legislador complementar buscou dirimir o conflito de competência tributária (art. 146, I, da CF), no subitem 1.05 da lista de serviços tributáveis pelo ISS anexa à Lei Complementar nº 116/2003, prevendo o “licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação”. Com isso, nos termos do entendimento atual desta Corte, essas operações não são passíveis de tributação pelo ICMS, independentemente do meio de disponibilização do programa. 6. Pedido conhecido em parte e, nessa parte, julgado procedente, para dar interpretação conforme a Constituição ao art. 2º da Lei Complementar nº 87/1996 e ao art. 1º da Lei do Estado de São Paulo nº 6.374/1989, de modo a impedir a incidência do ICMS sobre o licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador. 7. Modulação dos efeitos desta decisão, para atribuir eficácia ex nunc, a contar de 03.03.2021, data em que publicada a ata de julgamento das ADIs 1.945 e 5.659, ressalvadas as seguintes situações: a) as ações judiciais já ajuizadas e ainda em curso em 02.03.2021; b) as hipóteses de bitributação relativas a fatos geradores ocorridos até 02.03.2021, nas quais será devida a restituição do ICMS recolhido, respeitado o prazo prescricional, independentemente da propositura de ação judicial até aquela data; c) as hipóteses relativas a fatos geradores ocorridos até 02.03.2021 em que não houve o recolhimento do ISS ou do ICMS, nas quais será devido o pagamento do imposto municipal, respeitados os prazos decadencial e prescricional. 8. Fixação da seguinte tese de julgamento: “É inconstitucional a incidência do ICMS sobre o licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador.”. ADI 5576, DJ 10-09-2021.