O artigo 1º da Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, traz a definição de software (programa de computador) como sendo “a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados”.
Da leitura deste dispositivo legal, é possível extrair duas conclusões: (i) o software é um bem incorpóreo, já que consiste em um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada; e (ii) o software não se confunde com o suporte físico que o contém.
A Receita possui o entendimento de que as importâncias pagas a empresa no exterior não estão sujeitas ao IRRF
Por outro lado, a legislação brasileira ainda define os tipos de contrato envolvendo programas de computador. São três: (i) contrato de licença de uso no país; (ii) contrato de licença de direitos de comercialização de programas de computador oriundos do exterior; e (iii) contrato de transferência de tecnologia.
Ademais, a exploração de direitos autorais é classificada como “royalties” pela Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964, que a inclui dentre os rendimentos de qualquer espécie decorrentes do uso, fruição, exploração de direitos, salvo quando percebidos pelo autor ou criador do bem ou obra.
Por sua vez, o artigo 767 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR) – Decreto nº 9.580, de 2018 – prevê a “incidência do imposto sobre a renda na fonte, à alíquota de quinze por cento, as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas para o exterior a título de royalties, a qualquer título”.
Aliás, este é o entendimento da Receita Federal do Brasil nos contratos de licença de direitos de comercialização de programas de computador oriundos do exterior, conforme Solução de Divergência Cosit nº 18, de 2017.
Por outro lado, a Receita Federal entende que as remessas ao exterior realizadas para fins de contraprestação pelo licenciamento de software de prateleira, para uso exclusivo do próprio adquirente, que não o comercializará para terceiros, não se enquadram como remuneração de direitos autorais (royalties) e, portanto, não estão sujeitas à incidência do IRRF (Solução de Consulta Disit/SRRF06 nº 6.014, de 2018).
Isso porque a relação contratual existente entre a empresa brasileira e a estrangeira tem por objeto apenas o direito de uso de softwares de prateleira (contrato de licença de uso no País) que se destinam ao uso do próprio adquirente e que não serão comercializados para terceiros.
Dessa forma, podemos concluir que a Receita Federal possui o entendimento de que as importâncias pagas a empresa no exterior (i) no contrato de licença de uso próprio no país não estão sujeitas ao IRRF; e (ii) no contrato de licença de direitos de comercialização estão sujeitas ao IRRF à alíquota de 15%.
Nesse sentido, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 16417 75/SP, acabou mantendo a decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região que afastou da Nestlé Brasil a obrigação de recolhimento do IRRF sobre as remessas destinadas ao exterior para pagamento por software decorrente de contrato de licença de uso.
Ainda é importante mencionar que os valores remetidos ao exterior a título de royalties, em decorrência do direito de comercialização de software, não sofrem a incidência da contribuição ao PIS-Importação e da Cofins-Importação, desde que esses valores estejam discriminados no documento que fundamentar a operação, com exceção de eventuais valores referentes a serviços conexos contratados (sobre os quais incidem as contribuições), conforme Solução de Consulta Cosit nº 99.004, de 2019.
Entretanto, nos termos da Solução de Consulta Cosit nº 381, de 2017, se o documento que embasar a operação não for suficientemente claro para individualizar, em valores, o que corresponde a serviço e o que corresponde a royalties, o valor total da operação será considerado como correspondente a serviços e sofrerá a incidência das contribuições.
Assim, se no contrato de licenciamento houver a previsão de prestação de serviços de manutenção e suporte técnico, além do simples licenciamento do software, sobre os pagamentos referentes a esses serviços incidirão PIS e Cofins-Importação e, nos casos em que o contrato não for suficientemente claro para individualizar esses componentes, o valor total deverá ser considerado referente a serviços e, comisso, sofrer a incidência das contribuições (Solução de Consulta Cosit nº 448, de 2017)
Finalmente, vale a pena destacar o licenciamento do software se enquadra no conceito de bens intangíveis, devendo ser registrado no Sistema Integrado de Comércio Exterior de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no Patrimônio (Siscoserv), conforme a Solução de Consulta Cosit nº 449, de 2017, sob pena de aplicação de multas pelo fisco federal.
Dessa forma, conclui-se que a Receita Federal possui o entendimento de que as importâncias pagas a empresa no exterior no contrato de licença de uso próprio de software importado no país não estão sujeitas ao IRRF, à contribuição ao PIS-Importação e à Cofins-Importação, devendo a operação de importação de software ser registrada no Siscoserv, sob pena de multa.
Fonte: Valor Econômico – 15 de junho de 2020