Pensados para aliviar contribuintes e obter receita extra, programas dão até 100% de desconto em juro e multa.
Enquanto o “passaporte tributário” ou o novo Refis federal aguardam tramitação no Senado, Estados e capitais já lançam seus programas especiais de parcelamento de débitos tributários em até dez anos e desconto de multa e juros que chegam a 100%. Pelo menos um terço dos Estados – Alagoas, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e Sergipe – e três capitais – Curitiba, Porto Alegre e São Paulo – já ofereceram ou aprovaram um “Refis” este ano ou ao menos enviaram a suas casas legislativas projetos nesse sentido.
A ideia é dar um alívio ao contribuinte no momento difícil da pandemia e ao mesmo tempo garantir receita extra em meio à crise sanitária. No agregado, os programas devem render mais de R$ 6 bilhões em arrecadação extraordinária, considerando o que já foi arrecadado e as projeções para 2021. Os parcelamentos são essencialmente para quitar débitos passados do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Impostos sobre Serviços (ISS), mas em alguns casos se estendem a outros tributos estaduais e municipais e até a dívidas não tributárias.
O governo estadual do Rio de Janeiro foi o que já obteve maior receita até agora, entre os entes que já estão arrecadando valores dos parcelamentos especiais. De 17 de fevereiro a 29 de abril, de acordo com o último dado disponível, foram recolhidos R$ 2,5 bilhões pelo Refis do Estado. O programa foi aberto em fevereiro e inicialmente o prazo de adesão era até 29 de abril. Com o resultado da receita, o período para entrar no programa foi prorrogado para 31 de agosto de 2021.
O programa permite quitar débitos de ICMS com fato gerador até 31 de dezembro de 2020, com descontos de juros e multas que variam de 30% a 90% do valor devido, de acordo com a forma de pagamento escolhida, à vista ou em até 60 meses. O programa também permite quitação de dívida ativa. Ou seja, dos débitos que já estão sujeitos à cobrança judicial
Entre as prefeituras e Estados que resolveram abrir um Refis, destacam-se aqueles que não ofereciam esse tipo de benefício há alguns anos e resolveram fazê-lo em razão da crise sanitária, como os municípios de São Paulo e Curitiba, além do governo goiano. O município de São Paulo deve abrir adesão ao Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) em julho, quatro anos depois do último oferecido pela prefeitura. Segundo Guilherme Bueno de Camargo, secretário de Fazenda da capital paulista, dessa forma a prefeitura cumprirá restrição estabelecida pelo último programa nesse sentido, oferecido em 2017. O parcelamento daquele ano, explica ele, estabelecia um intervalo mínimo de quatro anos para outro PPI.
O Refis de 2021 deve arrecadar entre R$ 1,8 bilhão e R$ 2,2 bilhões este ano e abrange Imposto sobre Serviços (ISS) e IPTU, cobrado sobre imóveis, entre outros, inclusive inscritos em dívida ativa. O programa inclui também débitos não tributários, à exceção de obrigações relacionadas a contratos com a prefeitura e infrações à legislação ambiental. No caso dos débitos tributários os parcelamentos são de até 120 meses e a redução de multa e juros pode chegar a 75% e 85%, respectivamente.
Em Curitiba não havia parcelamento especial desde 2017, primeiro ano do mandato anterior do prefeito Rafael Grecca (Democratas), reeleito no ano passado. “Nunca fui a favor de parcelamentos especiais, mas na pandemia tornou-se mandatório fazer algo”, diz o secretário de Fazenda da capital paranaense, Vitor Puppi. Ele projeta arrecadação entre R$ 180 milhões e R$ 200 milhões este ano com o parcelamento, valor significativo perto da receita anual de R$ 1,3 bilhão de ISS.
O programa do município incluiu, além do ISS, IPTU e ITBI, imposto cobrado na compra e venda de bens imóveis. Curitiba lançou parcelamento ao fim de 2020, conta Puppi, mas o programa foi estendido até março para incluir fatos geradores até fevereiro deste ano. O abatimento de juros e multa chega a 100% no pagamento à vista.
Em Goiás, diz Cristiane Schmidt, secretária de Fazenda do Estado, a crise sanitária também influenciou na decisão de oferecer aos contribuintes um Refis. Ela ressalta que o governo atual, com mandato iniciado em 2019, não havia aberto programa nesse sentido. Havia, diz, uma cultura local na qual os contribuintes já contavam com um Refis. “Já colocavam na conta e se financiavam com isso. Mas o maior fator para esse parcelamento foi a pandemia.” A ideia foi oferecer o programa, mas deixar claro que se trata de oportunidade única e por isso, diz Cristiane, a lei estabelece intervalo mínimo de dez anos para um novo Refis.
Pelo programa goiano, chamado de Facilita, podem ser parcelados, entre outros, débitos de ICMS com fato gerador até 30 de junho de 2020. Estão incluídos também IPVA e Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCD) gerados até 31 de dezembro do ano passado. Os descontos chegam a 98% nos juros e multa do IPVA e ITCD, e abatimento de até 90% nos juros e 98% nas multas de ICMS. Até a última quarta-feira foram arrecadados R$ 802,9 milhões no programa, com R$ 2,24 bilhões em valor total negociado.
Em Porto Alegre também há a preocupação de oferecer o benefício sem criar expectativa de que parcelamentos especiais serão frequentes. A prefeitura encaminhou à Câmara municipal projeto de lei que cria parcelamento especial para ISS, IPTU e ITBI, entre outros. A expectativa com o programa é viabilizar a negociação de total de R$ 150 milhões. Segundo a secretaria de Fazenda, não serão realizados novos programas de regularização durante a atual gestão.
Em Alagoas, devem ser arrecadados cerca de R$ 40 milhões este ano em programas de parcelamento especial para o ICMS, diz George Santoro, secretário de Fazenda do Estado. Cerca de R$ 10 milhões devem vir do Refis para o ICMS do Simples. O programa oferece redução de multa e juros de 90% para débitos com fatos geradores até 31 de dezembro de 2020, mas permite também redução média de 80% no valor principal.
O secretário explica que esse programa foi oferecido com base em convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e permite dar oportunidade para reenquadramento no Simples. Atende, exemplifica Santoro, aquela empresa que não emitiu nota fiscal e acabou sendo autuada pela alíquota cheia do ICMS e não pela devida como contribuinte do Simples, o que torna o débito muito mais alto. Os outros R$ 30 milhões devem vir como receita de Refis que será aberto em julho, para débitos de ICMS fora do Simples, também com fatos geradores até 31 de dezembro do ano passado.
Valor Econômico – Por Marta Watanabe, 07/06/2021