O Decreto nº 10.854 trouxe uma série de mudanças nas normas trabalhistas. Mas é a flexibilização no vale-refeição que gera as principais dúvidas, tanto dos empregadores quanto dos funcionários.
O ponto de maior polêmica é o que limita a dedução do Imposto de Renda (IR) das empresas na concessão de vales refeição e alimentação. Mas as alterações vão além disso, conforme explicam os especialistas:
Bolso do trabalhador
Entre as principais novidades, advogados destacam que pode ocorrer a ampliação no número de estabelecimentos onde o trabalhador poderá usar o benefício.
Isso porque o decreto prevê que o cartão pode ser usado em qualquer restaurante que receba este tipo de pagamento e não mais apenas nos credenciados da bandeira.
O texto prevê ainda a portabilidade gratuita do serviço de pagamento de alimentação oferecido pela pessoa jurídica beneficiária do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Será facultativa, mediante a solicitação expressa do trabalhador.
Fim do desconto
Além disso, o decreto determina que as pessoas jurídicas beneficiárias não poderão exigir ou receber qualquer tipo de deságio ou imposição de descontos sobre o valor contratado. Nem prazos de repasse que descaracterizem a natureza pré-paga dos valores a serem disponibilizados aos trabalhadores. O mesmo vale para outras verbas e benefícios diretos ou indiretos, de qualquer natureza, não vinculados diretamente à promoção de saúde e segurança alimentar do trabalhador.
Caixa das empresas
Para especialistas, no entanto, as mudanças podem colocar em risco o fornecimento do benefício para os trabalhadores. “O maior incentivo das empresas era a dedução de parte do IR e o decreto acaba por limitar a dedução, o que vai impactar nas empresas”, diz o advogado Paulo Henrique Gomes de Oliveira, do escritório Ferrareze e Freitas Advogados.
Além de limitar a dedução do IR, as novas regras também preveem que o abatimento dos vales só deverá ser aplicado para os rendimentos de até cinco salários mínimos, conforme explica o advogado Sergio Pelcerman, do escritório Almeida Prado & Hoffmann.
Vale destacar que quando as empresas têm serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos as limitações não se aplicam. Além disso, o gasto pode continuar sendo todo abatido da base do IR.
A regra de cálculo do benefício previsto no PAT tem alguma complexidade. Mas o incentivo não pode superar 4% do imposto devido no ano.
Benefício fiscal x relação de trabalho
“Houve uma limitação do benefício pelo valor dado ao funcionário e faixa de salário percebida por este. Então, na prática, o pagamento do vale alimentação antes ‘incentivado’ pela correlação ao benefício fiscal, hoje com a redução da sua aplicabilidade e abrangência, acaba por limitar o incentivo fiscal”, diz o advogado André Alves de Melo, do escritório Cescon Barrieu.
Para ele, muitas empresas poderão alterar sua política de benefício já que o incentivo fiscal ficará reduzido. “Agora, a dedutibilidade ficou restrita à parcela do benefício que corresponder a no máximo um salário mínimo. Antes, não havia esse teto”, afirma André Melo.
O advogado Marcos Lemos, do escritório Benício Advogados Associados, considera que a medida poderá trazer impactos à própria relação de trabalho. “Ao reduzir o incentivo à concessão do benefício, obviamente tenderá a desestimular o fornecimento dos vales refeição e alimentação pelo empregador”, diz.
Valor Econômico – Por Gilmara Santos, 27/11/2021