As empresas de melhoramento genético de sementes não têm de recolher Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre os contratos de licenciamento de uso de cultivares — sementes — firmados com agricultores. Afinal, a atividade de licenciamento de cultivares não está inserida na lista da Lei Complementar 116/2003, que regula a cobrança desse tributo.
Sob tal fundamento, a 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que, no efeito prático, impediu o Município de Passo Fundo de continuar cobrando ISS de uma obtentora de cultivares de trigo. A empresa de tecnologia cede aos agricultores, por meio de contrato, o direito de utilizar suas cultivares nos processos de produção, armazenamento e comercialização, mediante o pagamento de royalties.
Queda de braço
O litígio jurídico-tributário gira em torno da seguinte questão: o fisco municipal pode, ou não, cobrar ISS sobre os royalties pagos pelos agricultores licenciados, que usam, multiplicam e vendem estas sementes melhoradas tecnologicamente?
A empresa de tecnologia vegetal — que ajuizou ação declaratória para se eximir da obrigação — diz que não. A obtentora alega que os royalties não são pagos para remunerar qualquer pesquisa, já que esta é feita por sua conta e risco. Ou seja, ela não trabalha em cima de pesquisa contratada ou encomendada por nenhuma outra empresa ou agricultor.
O Município, por sua vez, garante que sim. Sustenta que as sementes só são adquiridas pelos produtores em razão da ‘‘tecnologia embarcada’’ através da pesquisa realizada. Assim, seria prestação de serviço de pesquisa — o que autoriza a incidência e, por consequência, a cobrança do tributo.
A 1ª Vara Especializada em Fazenda Pública da Comarca de Passo Fundo julgou procedentes os pedidos da parte autora embutidos na declaratória. O juízo declarou a inexigibilidade do tributo sobre serviços e determinou a devolução dos valores indevidamente recolhidos, observada a prescrição quinquenal. Da decisão, recorreu o Município.
Sem competência
Para a relatora da apelação no colegiado, desembargadora Íris Helena Medeiros Nogueira, o contexto fático e jurídico carreado aos autos revela que a atividade da parte autora é o licenciamento de cultivares de trigo para terceiros, e não realização de pesquisa de sementes como refere a apelante. Para provar sua tese, pontuou, a autora juntou cópias de contratos para multiplicação e comercialização de sementes entabulados com terceiros, nos quais se observa a inexistência de prestação de serviço de pesquisa.
A julgadora lembrou que o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o RESp 1.111.234/PR, firmou entendimento no sentido de que a incidência do ISS se dá somente sobre os serviços descritos na lista anexa ao Decreto-Lei 406/68, posteriormente substituído pela Lei Complementar nº 116/2003.
‘‘Nesse cenário, descabe a incidência de ISSQN sobre os royalties, visto que o licenciamento de cultivares não está descrito como atividade no rol taxativo da Lei Complementar nº 116/2003. Em consequência, o ente municipal não tem competência para cobrança de ISS sobre os royalties, porque o licenciamento não está inserido na referida lista de serviços, inexistindo fato gerador do tributo’’, definiu no acórdão.
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Processo 9002026-26.2019.8.21.0021 (Comarca de Passo Fundo)
Por Jomar Martins
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2020.
https://www.conjur.com.br/2020-mai-12/licenciamento-cultivares-nao-recolher-iss-decide-tj-rs