EMPRESA ARRENDATÁRIA EM ÁREA PORTUÁRIA. PROPRIEDADE DA UNIÃO. IMÓVEL DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO CEDIDO A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. INCIDÊNCIA DE IPTU. MATÉRIA PACIFICADA PELO STF, EM REPERCUSSÃO GERAL – RE 594.015 E RE 601.720. 1. Não configurada a alegada ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou, de maneira amplamente fundamentada, a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado. Claramente se observa que não se trata de omissão, contradição ou obscuridade, tampouco de correção de erro material, mas sim de inconformismo direto com o resultado do acórdão, que foi contrário aos interesses da recorrente. Considere-se, ainda, que nas razões recursais apresentadas (fls. 570-572, e-STJ) a recorrente não indica especificamente qual seria a omissão, contradição ou obscuridade – objeto dos prévios aclaratórios – comprometedora da intelecção do julgado, que não teria seria apreciada pela Corte de origem. O que prejudica, sobremaneira, a tese de violação do dispositivo citado. 2. O Tribunal de origem, ao solucionar a lide, consignou: “Tal decisão, por maioria de votos, afastou a imunidade tributária recíproca (art. 150, VI, a, da Constituição Federal), possibilitando a cobrança do imposto municipal incidente sobre imóvel público cedido a empresa privada ou de economia mista, sob o fundamento de que a imunidade recíproca, que impede entes federativos de cobrarem impostos uns dos ouros, não alcança imóveis públicos ocupados por empresas que exerçam atividade econômica com fins lucrativos”. (fl. 506, e-STJ) 3. A jurisprudência do STJ está consolidada no sentido de que “é indevida a cobrança de IPTU das sociedades empresárias arrendadoras de áreas no Porto de Santos, haja vista tratar-se de posse fundada em direito pessoal, exercida, portanto, sem animus domini” (AgRg no AREsp 190.959/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 25.9.2019). Isto é, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é de que a posse tributável é somente aquela qualificada pelo animus domini, não se podendo falar na sujeição passiva do arrendatário. No mesmo sentido: AgRg no AREsp 159.691/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 2.6.2016; AgRg no AREsp 349.019/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 26.9.2013. 4. Hugo de Brito Machado, em sua obra intitulada Curso de Direito Tributário, ed. Malheiros, conceitua que “a posse tributável, apta a ensejar a exação do IPTU, é somente aquela exercida com ânimo de se assenhorar do bem, com animus domini. Logo, exclui-se desse conceito a posse a qualquer título, precária ou clandestina, direta do comodatário, do locatário, do arrendatário, do detentor, do usuário ou do usufrutuário.” 5. Na apreciação pelo STF do RE 601.720/RJ, julgado sob o Regime de Repercussão Geral, o Relator, Ministro Edson Fachin, cujo voto ficou vencido, tendo sido acompanhado somente pelo Ministro Celso de Mello, concluiu que, “em síntese, negativamente a ambos os quesitos formuladas no início do presente voto, isto é, o particular concessionário de uso de bem público não pode ser eleito, por força de lei municipal, para figurar como sujeito passivo de obrigação tributária referente ao IPTU, porquanto sua posse é precária e desdobrada; ao passo que o imóvel qualificado como bem público federal, ainda que destinado à exploração comercial, remanesce imune aos tributos fundiários municipais, por força do art. 150, VI, ‘a’, da Constituição Federal de 1988.” 6. Contudo, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sua maioria, ao julgar o citado RE 601.720/RJ, sob o regime de Repercussão Geral, firmou a tese de que “Incide o imposto Predial e Territorial Urbano considerado bem público cedido a pessoa jurídica de direito privado, sendo esta a devedora”. 7. O Ministro Marco Aurélio, que foi designado para redator do acórdão, consignou que “A hipótese de incidência do Imposto Predial Territorial Urbano – IPTU não está limitada à propriedade do imóvel, incluindo o domínio útil e a posse do bem. O mesmo entendimento vale para o contribuinte do tributo, que não se restringe ao proprietário do imóvel, alcançando tanto o titular do domínio útil quanto o possuidor a qualquer título. Não há falar em ausência de legitimidade do ora recorrido para figurar em polo passivo da relação jurídica tributária”. 8. Assim, o STF, em Repercussão Geral, fixou as seguintes teses: “A imunidade recíproca, prevista no art. 150, VI, ‘b’, da Constituição Federal não se estende a empresa privada arrendatária de imóvel público, quando seja ela exploradora de atividade econômica com fins lucrativos. Nessa hipótese é constitucional a cobrança do IPTU pelo município. RE 594.015 (Tema 385)” e “Incide o IPTU considerado imóvel de pessoa jurídica de direito público cedido a pessoa jurídica de direito privado, devedora do tributo. RE 601.720 (Tema 437)”. 9. O Ministro Alexandre de Moraes, ao julgar a ADPF 560/SP, publicada no DJe 11/3/2019, afirmou que “a proteção imunizante do art. 150, IV, da CF não se aplica quando seja inconteste que bem imóvel do patrimônio de ente federativo já não mais esteja afetado a qualquer destinação social, funcionando apenas como elemento para alavancar o desempenho de atividade particular de propósitos exclusivamente econômicos”. 10. In casu, trata-se de contrato de arrendamento firmado entre a Companhia Bandeirantes de Armazéns Gerais e a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), sociedade de economia mista, que adquiriu por concessão da União o direito de explorar economicamente a área portuária de Santos. Assim, trata-se de imóvel que, ainda que não integre o patrimônio do particular, pois pertencente à União, passa a ser empregado pela ora recorrente em sua atividade comercial com a finalidade de extrair desse bem todo um proveito econômico. A regra da imunidade da alínea “a” do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal está restrita à instituição de imposto sobre patrimônio ou renda ou serviços das pessoas jurídicas de direito público. 11. Nesses termos, a matéria referente à exigibilidade do IPTU sobre áreas arrendadas pela União aos terminais portuários está pacificada pelo Supremo Tribunal Federal, em Repercussão Geral, nos RE 594.015 e RE 601.720, razão pela qual deve ser mantido o acórdão recorrido, inexistindo distinguishing a ser feito no caso. 12. Verifica-se, portanto, que a controvérsia foi decidida na origem com base em interpretação de normas constitucionais. Não cabe ao Superior Tribunal de Justiça emitir juízo a respeito dos limites do que foi julgado no precedente em Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal, colocando novas balizas em tema de ordem constitucional (AREsp 1.539.885/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 19.8.2019). 13. Dessa forma, é vedado a esta Corte, na via especial, apreciar eventual ofensa à matéria constitucional, ainda que para fins de prequestionamento, sob pena de usurpação da competência reservada ao Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, a seguinte decisão monocrática em caso semelhante: AREsp 1.873.839/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe 21.9.2021. 14. Recurso Especial conhecido apenas em relação à alegação de violação ao art. 1.022 do CPC/15 e, nessa extensão, não provido. REsp 1849974/SP, DJ 16/12/2021.