A Receita Federal do Brasil, por meio da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), lançou a Solução de Consulta nº 13, trazendo o entendimento deste Órgão a respeito da decisão do Supremo Tribunal Federal (RE nº 574.706/PR), que determinou a exclusão do ICMS das bases de cálculo da Contribuição ao PIS e da Cofins.
A Cosit 13, em um de seus vários itens, prevê que “a parcela do ICMS pago ou a recolher do período é a que há de ser excluída da base de cálculo das contribuições”, que seria a correspondente ao ICMS calculado “ao término de cada período de apuração mensal do ICMS, considerados ainda outros valores a título de ajustes a débito e a crédito, bem como deduções específicas, decorrentes de benefícios e/ou incentivos fiscais eventualmente concedidos pelos Estados ou pelo Distrito Federal”.
Como se sabe, um dos problemas mais discutidos a respeito da Cosit 13 é que, por conta da previsão acima, o ICMS a ser excluído das bases de cálculo da Contribuição ao PIS e da Cofins, pelos contribuintes que possuam decisão judicial reconhecendo tal direito, é o que se denomina “ICMS a Recolher”. Trata-se do valor do ICMS a ser efetivamente pago pelo contribuinte, e não do imposto incidente sobre as operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, cujo valor corresponde ao quanto “destacado na nota”.
Se está determinando a tributação do incentivo fiscal de ICMS pelo PIS e Cofins e, portanto, a redução do seu valor efetivo.
O que normalmente vem se associando a tal previsão da Cosit 13 é que não pode ser excluída das bases de cálculo da Contribuição ao PIS e da Cofins a parcela do ICMS adimplida com créditos do Imposto incidente na “entrada” de mercadorias e serviços, nos termos do regime de não cumulatividade que regula este último tributo.
Em que pese não afetar todos os contribuintes do ICMS, trazemos aqui um ponto que ainda não recebeu tanto destaque após a publicação da Cosit 13 e sobre o qual precisa ser lançada luz, haja vista a sua relevante repercussão (negativa, diga-se).
Pois muito bem, a Cosit 13, na passagem que transcrevemos, dispõe que o ICMS a ser excluído é aquele gerado após as deduções dos incentivos fiscais de ICMS (vide SPED ICMS e IPI, registro E110, campo 07 ou 12, a depender da Unidade da Federação), independentemente da sua natureza. Ou seja, o ICMS a Recolher na forma da Cosit 13 corresponde ao que efetivamente o contribuinte estiver obrigado a pagar, líquido não somente dos créditos das operações de entrada, como se usualmente imagina, mas também dos benefícios que reduzam o ônus financeiro desse imposto.
Por sua vez, a redação atual do artigo 30, § 4º, da Lei n° 12.973/14, dada pelo artigo 9° da Lei Complementar nº 160/17, dispõe que “os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo”.
Em outras palavras, o que temos atualmente é que todo incentivo fiscal de ICMS deve ser considerado uma subvenção para investimento, conquanto atendidos os requisitos ou condições estabelecidos pelo artigo 30 da Lei nº 12.973/14.
Essa determinação é relevantíssima para a Contribuição ao PIS e a Cofins, uma vez que as subvenções de investimento não estão sujeitas à sua incidência, qualquer que seja o regime de apuração adotado pelo contribuinte (i.e. cumulativo, não cumulativo etc.).
Não bastasse a expressa determinação legal a que nos referimos, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EREsp n.º 1.517.492/PR, firmou jurisprudência no sentido de que é vedado a uma pessoa política impor a redução de benefício fiscal concedido por outra, por qualquer meio que seja, inclusive tributação.
Deste modo, a partir do momento em que a Receita Federal estabelece que o contribuinte exclua das bases de cálculo das Contribuições comentadas o ICMS a Recolher – o qual, além do desconto da parcela de crédito decorrente da não cumulatividade, também é minorado pela dedução do valor do incentivo fiscal de ICMS -, está determinando, ainda que indiretamente, a tributação do incentivo.
Observe-se que, quando comparada a aplicação da Cosit 13 para uma empresa que goza de incentivo fiscal de ICMS e para outra que não, a diferença no montante da Contribuição ao PIS e da Cofins apurado equivale exatamente à aplicação das suas alíquotas sobre o benefício fiscal.
Na prática, isso quer dizer que se está determinando a tributação do incentivo fiscal de ICMS pela Contribuição ao PIS e pela Cofins e, portanto, a redução do seu valor efetivo, ao arrepio, a um só tempo, do artigo 30, § 4º, da Lei 12.973/14, da legislação que regula tais Contribuições e da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmada no EREsp nº 1.517.492/PR.
Pelos motivos aqui expostos, que se somam à flagrante inconformidade da Cosit 13 à decisão do Supremo Tribunal Federal proferida no RE nº 574.706/PR – tão denunciada por especialistas e que já vem sendo acatada pelos Tribunais Regionais Federais -, é fundamental que a Receita Federal reveja o quanto antes o ato normativo em questão e trate do assunto objeto dessa decisão respeitando os seus termos e a legislação competente.
FONTE: Valor Econômico – Por Pedro C. Amarante, Paulo Navarro e Renato Nunes
Pedro Cavalcanti Amarante, Paulo Navarro e Renato Nunes são, respectivamente, advogado em Pernambuco, contabilista, sócio do Raimundo & Capela Jurídico Estratégico, pós-graduado pelo IBET, aluno do LLM em Direito Tributário pelo Insper; advogado em São Paulo, contabilista, gerente na prática de impostos da Alvarez & Marsal, aluno do LLM em Direito Tributário pelo Insper; advogado em São Paulo, sócio de Machado Nunes Advogados, especializado, mestre e doutor em Direito Tributário pela PUC-SP, professor do Insper e da FGV.